Ismael Lira, ex-funcionário da Braiscompany,posa para foto.
Ismael Lira, ex-segurança da Braiscompany (Foto: Divulgação)

A Braiscompany era faminta por clientes e não se importava se “era uma pessoa morrendo de câncer, o maior criminoso ou o maior juiz do Brasil”. A afirmação é do campinense Ismael Lira, ex-segurança da Braiscompany, que revelou em entrevista exclusiva ao Portal do Bitcoin vários acontecimentos que presenciou enquanto trabalhava na empresa.

Controlada pelo casal Antônio Neto Ais e Fabrícia Campos, a Braiscompany tem sido alvo constante de ações da Polícia Federal, que investiga tanto o paradeiro do casal foragido quanto o sumiço do dinheiro dos clientes. Dados atualizados da PF estimam que o prejuízo deixado pelo esquema da Braiscompany está em torno de R$ 2 bilhões.

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“Eles conseguiram enganar praticamente todo mundo. Não escolhiam classe social, nem poupava quem estava em estado terminal, morrendo de fome… tomaram casa, tomaram tudo. Campina Grande vive hoje num colapso financeiro”, avalia Lira.

O casal fugiu porque já “está acostumado em dar golpe e participar de pirâmide financeira”, disse Lira na entrevista. Ele se absteve de responder algumas perguntas dado a um processo que corre em segredo de Justiça. Lira é uma das testemunhas que já foram ouvidas pelas autoridades.

Fuga do casal Braiscompany

Lira disse que previu a fuga do casal quando percebeu que tudo estava sendo vendido e se deu conta que também seria uma das vítimas do negócio fraudulento que prometia altos retornos mensais, chamado internamente de ‘locação de ativos’.

Esse tipo de oferta se tornou comum em esquemas de pirâmide, onde golpistas alegam que os rendimentos vêm de operações no mercado cripto.

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Quando as operações da Brais se tornaram insustentáveis, seus líderes fugiram, assim como aqueles que estavam por trás da Atlas Quantum, MidasTrend, Unick Forex, DD Corporation, Indeal, dentre tantos outros golpes cripto famosos no Brasil.

“Eles fugiram porque já tinha tudo premeditado”, disse Lira. “Quando eles mudaram aqueles contratos de locação de criptomoedas de R$ 1 mil, que antes eram de R$ 6 mil, na hora eu disse lá em casa: ‘me ferrei, perdi meu dinheiro’”.

Lira acompanhou praticamente toda a movimentação de Ais e Fabrícia, já que ele também era motorista do casal, mesmo sendo contratado como segurança patrimonial. Ele presenciou, por exemplo, tudo ser vendido às pressas antes do golpe final, que culminou no sumiço do casal e numa dívida bilionária com os clientes.

Em dezembro do ano passado, na mesma época em que a Braiscompany parou de pagar os clientes, Antônio Ais vendeu às pressas uma mansão por R$ 12,5 milhões, um valor menor ao estimado para o imóvel de R$ 15 milhões.

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Funcionário multitarefas

Em suas publicações no Instagram, Lira faz vídeos ironizando o ex-patrão. Por meio do perfil, ele também demonstra orgulho da profissão de segurança. Na Braiscompany, no entanto, ele era muito mais do que isso:

“Eu era motorista, segurança, porteiro, lavava carro, cuidava de cachorro, levava menino para a escola, mandava emplacar carro, comprava passagens aéreas…”.

O café da manhã, disse Lira, era de sua responsabilidade comprar os produtos, que davam em torno de R$ 200 por dia. O valor era repassado em sua conta bancária via Pix.

Ele disse que começou a prestar seus serviços de segurança como freelancer para a Braiscompany quando Ais viajava para São Paulo, na época das desavenças entre o empresário com o criador da casa de análises Suno Research, Tiago Reis.

No final de 2020, Reis foi um dos primeiros a classificar a Braiscompany como pirâmide financeira, cujo discurso foi reforçado pelo polêmico influencer Raiam Santos.

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Depois de um tempo como freelancer, Lira foi contratado como segurança patrimonial para trabalhar na matriz da Braiscompany, em Campina Grande, na Paraíba. O salário acordado foi de R$ 2.500 por mês. No entanto, não demorou muito para ele ter uma surpresa.

“Quando eles me entregaram a carteira [de trabalho] estava assinada com salário mínimo”, disse ele. Quando reclamou, disseram a ele que era daquela forma que eles trabalhavam e que a diferença seria paga em criptomoedas. Daquela forma, ele diz que recebia parte do pagamento em real em conta bancária e o complemento em Bitcoin e XRP via departamento financeiro.

Lira disse que teve que mentir sobre a modalidade da sua conta bancária para fugir de possíveis interesses por parte da empresa para movimentar dinheiro. Quando lhe perguntaram, ele disse que era “conta-salário”, ou seja, um tipo de conta simples e bastante limitada.

“Nunca me envolvi nessa parte não [de movimentar fundos da Braiscompany]. Graças a Deus que eu sabia que não era certo”.

Lira relata que conversava com Ais e Fabrícia somente o necessário, como parte do seu trabalho, porém, como motorista, ficou sabendo de muitas coisas que se passavam na Braiscompany ao ouvir as conversas do casal durante as viagens.

Festa dos R$ 3 milhões

De acordo com o ex-funcionário, no final de 2021, Ais fez uma festa em um salão que fica na saída de Campina Grande, onde participaram cerca de 30 funcionários que estavam no negócio desde o começo. No evento, Ais teria presenteado cada um deles com R$ 100 mil. “Deu em torno de R$ 3 milhões”, afirmou.

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Mas nem tudo era ‘festa’. Segundo Lira, mensalmente eram descontados 30% do salário de “consultores” para serem aportados na empresa.

Outro ponto, ressaltou ele, é que havia uma grande pressão sobre os traders, “que não podiam falar sobre operação”, pois se o fizessem, seriam multados em R$ 1 milhão. Além disso, caso saíssem da empresa, “não podiam operar para ninguém durante um período de cinco anos porque responderíam processo”.

Portanto, segundo os relatos, a Brais “mordia e assoprava”, já que precisava da constante entrada de ativos para que o esquema continuasse funcionando. Então aceitava pagamentos de todas as formas, de carro a lancha; Lira viu boa parte dessas entradas, afirmando, porém, que nunca presenciou alguém levando dinheiro vivo.

“Clientes levando dinheiro em espécie eu nunca vi, mas lanchas, jet ski, casas de praia, casa daqui de Campina Grande, carros luxuosos — Jaguar, Porsche, Land Rover, Hilux, SW4, todo tipo de carro eu já vi. Já fui buscar, deixar na mansão dele cegonha [carreta de dois andares]’ cheia. Geralmente era eu que fazia”, descreveu.

Ele diz que dinheiro vivo mesmo servia para esconder da Receita Federal os gastos do casal no exterior. Lira disse que depois de uma ida de carro ao Paraguai, o casal gastou “de um a dois milhões” em compras — “óculos do metaverso, celulares, computadores, iPads”— e deixou a ‘parte ruim’ para ele e outro funcionário cuidar.

“Ele fez a gente trazer uma Land Rover lotada de tecnologia sem nota fiscal”, disse ele, afirmando que o casal retornou de avião. Ele garante que só descobriram no meio do caminho que os produtos estavam no carro.

Desempregado, sem dinheiro e ameaçado

Lira conta que na ocasião da primeira ação da Polícia Federal contra a Braiscompany, ele foi comunicado através de uma pessoa próxima de Ais sobre o seu distrato e que ele receberia todos os seus direitos mediante assinatura de contrato que previa uma multa de R$ 1 milhão.

“Nunca mais eu poderia falar o nome da Braiscompany nem fazer essas denúncias”, disse Lira, que atualmente passa por “um grande aperto financeiro” por causa da situação.

O ex-funcionário afirma que, enquanto trabalhava na Braiscompany, passou por várias mudanças de horário de trabalho, inclusive fazendo plantões de 24 e 48 horas, mas que nunca recebeu adicional noturno previsto em lei.

Ele trabalhou para a empresa pouco mais de um ano, sendo quatro meses em São Paulo, quando morou com os patrões e, portanto, os acompanhou 24 horas por dia. Ele deixou a empresa em junho do ano passado.

Além dos prejuízos relatados, Lira disse que também recebeu ameaças e que já relatou às autoridades — tanto a PF quanto a Polícia Civil da Paraíba.

“Estou recebendo várias ameaças de morte, dizendo que vão me matar — que sabem onde eu moro”, disse ele à reportagem.

Os donos da Braiscompany também são alvos de ameaças de clientes envolvidos em atividades criminosas, contou Lira. “O envolvimento do PCC e outras facções… Quem tinha dinheiro queria botar…uma empresa pagando de 7% a 8% todo mês. Fiquei sabendo que várias pessoas em Campina Grande — do crime, agiotas e várias pessoas perigosas — já mandaram recado para Ais, de que se encontrarem ele, não será bom se ele não pagar”, disse Lira.

Entenda o caso Braiscompany

Em fevereiro deste ano, a PF deflagrou a operação Halving, a primeira contra a Braiscompany, empresa acusada de funcionar como uma pirâmide financeira através de um serviço de “aluguel de criptomoedas” e que havia parado de pagar os clientes em dezembro do ano passado. 

Depois vieram outras duas operações da PF, como a ‘Select’ em abril, e ‘Select II’ em maio, ambas desdobramento da Operação Halving.

Antônio Neto Ais e Fabrícia Campos, estão foragidos desde então, embora haja boatos que tenham passado por Buenos Aires, na Argentina. Eles são acusados de cinco crimes e a justiça já decretou prisão preventiva.

Em março, Ais reapareceu no Instagram e disse que a responsabilidade pelo colapso da Braiscompany era toda sua, mas justificou a quebra da Brais ocorreu por conta da queda do mercado cripto.

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