O deputado federal Expedito Ferreira Netto (PSD-RO), enviou na segunda-feira (13) um novo parecer à Câmara dos Deputados sobre o projeto de lei nº 2303/2015 do deputado federal Aureo Ribeiro (Solidariedade/RJ) que visa regular as criptomoedas no Brasil.
A nova versão do projeto de lei proposta pelo relator Netto espantou o mercado ao trazer três novas nomenclaturas desconhecidas para diferenciar as criptomoedas: criptoficha referenciada a ativos, criptoficha de moeda eletrônica, e criptoficha de consumo.
“A tentativa de criar uma taxonomia própria não foi bem-sucedida. Se o projeto for aprovado na forma atual, a lei nascerá com problemas importantes”, avalia Bruno Ramos de Sousa, sócio e responsável diretor-jurídico da Hashdex.
O deputado define criptofichas referenciadas em ativos como tipo de criptoativo que usa como lastro ou referência moedas fiduciárias com curso legal, mercadorias, criptoativos, valores mobiliários, títulos de crédito, cotas de sociedades ou uma combinação desses tipos de ativos.
Já a criptoficha de consumo é um tipo de criptoativo destinado a fornecer acesso digital a um bem ou serviço e que pode ser aceito apenas pelo emitente da criptoficha de consumo. Enquanto a criptoficha de moeda eletrônica é um tipo de criptoativo utilizado como meio de troca e que pode ou não fazer referência ao valor de uma moeda fiduciária com curso legal.
Erro de tradução
“Diversos ativos podem ser enquadrados em mais de uma categoria — isso gerará dúvidas sobre qual é o regulador responsável e abre espaço para enormes discussões em torno da característica técnica de cada ativo”, explicou Sousa.
Pablo Cerdeira, sócio do Galdino e Coelho Advogados que já participou de discussões sobre criptomoedas na Câmara em 2017, ressalta que a inclusão dos termos no parecer do deputado foi uma tentativa falha de seguir um padrão utilizado no Parlamento Europeu.
“A legislação europeia quando fala de token, no português de Portugal ele foi traduzido como criptoficha, só que isso no Brasil não funciona e deve gerar um problema porque ninguém utiliza esse termo no país, com certeza vai mais atrapalhar do que ajudar”, disse.
A falta de clareza, acredita Cerdeira, de que criptomoeda se encaixa em cada categoria pode gerar interpretações equivocadas dos fiscalizadores do mercado, incluindo a proibição do uso desses tokens no território.
O parecer determina, por exemplo, que todas as moedas que estão sob a classificação de criptofichas referenciadas em ativos são valores mobiliários. Seria uma responsabilidade do Conselho Monetário Nacional deliberar qual criptomoeda está sujeita a autorização do Banco Central do Brasil para ser negociada no país.
“A definição de que todo cripto referenciada em ativos é precipitada e atécnica — não está em linha com a postura dos principais reguladores do mundo. O correto seria deixar essa definição a critério da CVM, que poderá fazê-lo de maneira mais consistente e detalhada”, explicou Ramos, da Hashdex.
Mais problemas do projeto de lei
Para Cerdeira, os problemas não se limitam apenas às nomenclaturas adotadas pelo deputado relator:
“Quando você olha artigos 5º e 7º, eles falam de emissão, custódia, mineração de tokens sujeitam às regras da CVM, quando na verdade isso é impossível fazer com criptoativo. Quer dizer que eu não vou poder comprar um token do Paris Saint-German porque não está autorizado pela CVM? Mineração é um assunto ainda mais complicado. Como o órgão vai fiscalizar?”.
O advogado ressalta ainda que o projeto de lei mistura uma série de temas que não deveriam estar no mesmo projeto de lei desde que passou a englobar outras três projetos relacionados às criptomoedas: PL nº 2.060 de 2019, PL nº 2.140 e 2.234 de 2021.
“Por exemplo, o texto vai falar de lavagem de dinheiro e pirâmide financeira, misturando aspectos criminais com aspectos civis que eu não vejo com bons olhos. Por isso que existe separação entre direito civil e direito penal: são áreas distintas e não é positivo esse tipo de mistura”.
No entanto, Cerdeira não deixa de ressaltar como positiva a exclusão de discussões relacionadas a programas de pontos de milhagem que estava presente no projeto de lei original.
O futuro da PL
Agora que o deputado Expedito Netto concluiu o seu parecer, o texto será debatido com outros deputados e votado em reunião deliberativa da Comissão Especial. Caso seja aprovado, o texto vai direto para o Senado e lá é discutido mais uma vez. Se a comissão do Senado fizer mudanças, o projeto de lei volta para a Câmara. Se aprovado, o texto segue para sanção do presidente da República.
É importante lembrar que atualmente existem outros projetos sendo discutidos no Senado. No mês passado, avançou para a Comissão de Assuntos Econômicos dois projetos de lei que visam regular as criptomoedas no Brasil, o PL 4207/2020 e o PL 3825/2019.