NFTs e memecoins estão matando o Bitcoin? Entenda o que está acontecendo

Ordinals, Bitcoin Stamps, tokens BRC-20 e SRC-20. Será que a chegada da Web3 no Bitcoin pode ser considerada um ataque?
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Usuários têm tido dificuldade em usar a rede do Bitcoin nas últimas semanas, com um acúmulo de transações em espera na mempool e altas taxas de mineração. Em maio de 2023, transações “comuns” de Bitcoin passaram a competir por espaço em blocos com uma enxurrada de NFTs e memecoins BRC-20 que agora fazem parte da rede.

Com algumas pessoas sendo prejudicadas pela situação atual, uma pergunta circula nas comunidades, grupos de discussão e redes sociais: “O Bitcoin está sob ataque?”

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Esses são os sete pontos principais para você entender o que está acontecendo.

1. O Bitcoin está sob ataque?

O primeiro ponto é que ainda não existe consenso na comunidade do Bitcoin de que um ataque realmente esteja acontecendo. Existem teorias, suposições, discussões abertas e fechadas que analisam dados e eventos recentes.

O desenvolvedor de soluções relacionadas com a Lightning Network, Calle, publicou um tweet na madrugada de segunda-feira (8) brincando com a situação: “Fale ataque mais uma vez”, com o personagem de Quentin Tarantino apontando uma pistola.

Apesar disso, o engenheiro de software e minerador Con Kolivas publicou uma thread onde afirma: “Não se engane. Isso parece, para todas as intenções e propósitos, um ataque coordenado”. Ele cita a enxurrada de NFTs na blockchain do Bitcoin como parte deste “ataque coordenado”.

Enquanto isso, o criador do Bitcoin Stamps, “Mike in Space”, afirma que o verdadeiro ataque seria uma tentativa de proibirem o uso de NFTs na rede com futuras atualizações no software Bitcoin Core, ideia que circulou no Cripto Twitter.

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Um “ataque de spam”, ou “ataque de negação de serviço”, são ações visando interromper ou prejudicar o serviço de um determinado sistema eletrônico com uma série de envio de dados não solicitados — sobrecarregando o sistema e impedindo, ou dificultando, seu uso por usuários legítimos.

A polêmica ocorre, pois, em uma rede descentralizada e não-permissionada (que não requer permissão ou autorização de uma entidade central), como o Bitcoin, a definição de “usuário legítimo” é nebulosa e um tanto quanto arbitrária.

Há quem defenda que “o código é lei”. Então, se o protocolo do BTC permite certas aplicações, elas seriam, por definição, legítimas. Por outro lado, há quem acredite que o Bitcoin deveria ser apenas utilizado para transações monetárias e, qualquer outra aplicação, seria ilegítima.

2. Como tudo começou?

Não é de hoje que entusiastas e desenvolvedores tentam criar soluções para o uso de diferentes aplicações na blockchain do Bitcoin para além das transações monetárias.

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Em 2017, por exemplo, surgiu o projeto Stacks (STX), que se trata de uma segunda camada que permite a criação de contratos inteligentes na blockchain do Bitcoin, como acontece no Ethereum e em outros protocolos semelhantes.

A Blockstream, empresa que cria softwares focados no Bitcoin, desenvolveu sua própria solução para emissão de tokens, stablecoins e uma versão sintética do Bitcoin (L-BTC) com a Liquid Network — uma rede federada de segunda camada.

Em 2021, a atualização “Taproot” foi ativada oficialmente na primeira camada do Bitcoin. E, antes dela, a atualização “Segwit“, em 2017. Ambas foram mudanças essenciais para permitir a utilização da blockchain para o que hoje está sendo considerado um ataque por alguns observadores, como o Ordinals, BRC-20, Bitcoin Stamps e SRC-20.

3. O que são os Ordinals e um token BRC-20?

Com a atualização Segwit, que mudou a forma como as informações são armazenadas no bloco do Bitcoin, abriu-se caminho para experimentações e outras aplicações na blockchain como a Lightning Network, maior capacidade de transações por bloco e também a utilização de um campo extra para adicionar novas informações, além das informações padrões de um “gasto” de BTC.

Este campo está sendo explorado para armazenar imagens e contratos inteligentes nos blocos de Bitcoin.

Em conjunto com a atualização Taproot, que cria uma nova dinâmica para transações assinadas por mais de duas partes, as portas foram abertas para que múltiplas entidades interagissem entre si de forma mais eficiente e privada — necessário para os usos que discutiremos a seguir.

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No caso dos Ordinals ou do novo padrão de tokens chamado BRC-20, essas informações são atreladas à sats (a menor unidade do BTC, abreviação de “satoshis”) que passam a ter um novo significado ao carregar dados extras no “OP_RETURN” (o campo que permite adicionar informações de texto num bloco de bitcoin).

Elas passam a não apenas significar 1 sat, mas também uma imagem NFT ou um contrato inteligente de um novo token. Este satoshi especial é chamado “ordinal”.

4. O que são os Bitcoin Stamps e token SRC-20?

Bitcoin Stamps, ou Carimbos no Bitcoin em português, é o nome do novo protocolo que permite qualquer usuário do BTC registrar imagens definitivas na blockchain – como se fossem imagens “tatuadas” para sempre no banco de dados descentralizado.

Eles usam uma tecnologia diferente dos Ordinals, que registram os dados das imagens em um campo separado das transações normais de BTC. Os Stamps registram os dados em transações normais, conhecidas como UTXO.

Leia mais sobre os Bitcoin Stamps: Conheça o projeto que está invadindo a rede da maior criptomoeda do mundo

Da mesma forma como o padrão de tokens BRC-20 utiliza a tecnologia dos Ordinals, o padrão para criação de tokens no Bitcoin SRC-20 utiliza a tecnologia dos Stamps, e da mesma forma, utiliza o OP_RETURN para carimbar as imagens NFTs e criar contratos inteligentes.

5. Web3 no Bitcoin e uma nova demanda

A “febre” da Web3 e muito de seus possíveis usos chega na blockchain da criptomoeda líder do mercado e, não por acaso, atrai muito interesse de desenvolvedores e especuladores.

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O que antes só era possível apenas em blockchains especializadas em contratos inteligentes, como Ethereum (ETH) e seus concorrentes, ganha uma nova interpretação no software Bitcoin Core, validado pelos mineradores de Bitcoin.

A aplicação no Bitcoin é ainda diferente da de seus “concorrentes de web3” para o caso dos NFTs, já que todas as informações, inclusive as relacionadas com imagens, estão “on-chain” e descentralizadas. Isso representa a criação de uma nova demanda para rede do Bitcoin que traz consigo alguns efeitos colaterais.

6. Competição por espaço de bloco e aumento das taxas

Agora os limites de capacidade da rede do Bitcoin estão sendo testados, com um aumento de demanda por espaço nos blocos — resultando em valores não vistos há mais de dois anos, incluindo: tempo de confirmação de uma transação na rede; fila recorde de transações na mempool e taxas de rede que voltam a disparar.

O aumento de taxas é um reflexo direto do aumento de demanda por espaço nos blocos da rede — algo que geralmente ocorre em momentos de alta volatilidade.

O boom da demanda preocupa porque a rede do Bitcoin tem limites quanto a quantidade de informações que pode armazenar.

Cada bloco do Bitcoin consegue comportar um máximo de 4MB (megabytes) em transações e, cada transação, tem um peso diferente que pode variar de cerca de 200 bytes até mais de 1MB, dependendo do tipo e conteúdo enviado.

Para conseguir “comprar” este espaço e fazer com que algum minerador acrescente a transação no próximo bloco, os usuários configuram uma taxa que será coletada pelo minerador da rodada. Quando maior a taxa, maior a probabilidade da transação ser acrescentada no próximo bloco.

Nesse cenário de demanda maior do que o espaço disponível, os usuários passam a fazer “lances” mais altos de taxas, aumentando o custo da rede como um todo.

7. O halving se aproxima e as taxas ganham mais importância

Todo esse contexto ocorre faltando um ano para o evento conhecido como halving do Bitcoin.

Quando Satoshi Nakamoto decidiu criar o “Bitcoin, um sistema de dinheiro eletrônico ponto a ponto”, ele precisou decidir como faria a distribuição das moedas deste sistema, e resolveu o quebra-cabeça através da mineração.

Desta forma, ficou estabelecido que: a cada bloco descoberto e acrescentado à blockchain, o minerador libera para si uma quantidade em BTC recém-criado, a chamada coinbase.

Satoshi Nakamoto programou o código do Bitcoin para que a quantidade de moedas liberadas em cada bloco fosse reduzida pela metade sempre que 210 mil blocos tivessem sido minerados, um número atingido a cada quatro anos. A “redução pela metade” é o que chamamos de halving.

Apesar de, historicamente, o halving ter efeitos positivos no preço, por influenciar as dinâmicas de oferta e demanda, ele também tem outro efeito no ecossistema do Bitcoin.

De um ponto de vista da “mineração como negócio”, a redução de recompensas pela metade pode oferecer um grande desafio administrativo, em alguns casos levando até mesmo ao fechamento de mineradores com maiores custos ou mais dificuldade de acesso ao capital.

Com menos mineradores capazes de manter o negócio funcionando, a rede poderia centralizar sua produção de blocos em um número menor de participantes, o que, efetivamente, diminuiria a descentralização.

É por isso que muito já se discute na comunidade do BTC sobre a necessidade de um aumento de taxas de rede, para compensar a queda das receitas obtidas na forma de recompensa por bloco minerado.

No último domingo (8), a pool de mineração Foundry USA lucrou mais com taxas do que por recompensa de bloco. Isso foi uma demonstração prática do que é, na maioria das vezes, apenas uma discussão teórica.

Há na comunidade do Bitcoin, portanto, pessoas que acreditam que o aumento da demanda por espaço na rede é positiva, pois gera mais dinheiro para mineradores e os incentiva a continuar minerando a criptomoeda, mesmo com a recompensa por blocos caindo pela metade a cada quatro anos.

Por outro lado, o aumento das taxas pode inviabilizar o uso da rede por usuários “comuns” que não conseguem arcar com o custo das transações. Neste cenário, a página Litecoin Underground levantou o questionamento sobre a possibilidade de um “ataque” orquestrado pelos próprios mineradores, para fazer as taxas subirem, aumentando sua recompensa.

Na semana passada, as taxas médias da rede superaram US$ 30 por transação, segundo o mempool.space. Isso fez com que a recompensa média de taxas por bloco minerado ficasse em torno de 4,7789 BTC, cerca de 43% da recompensa total de mineração por bloco em 24 horas.

Mempool do Bitcoin durante suposto "ataque", com taxas em US$ 30,38 na média.
Fonte: mempool.space