Professor Jorge Stolfi posa para foto
Jorge Stolfi se formou doutor em Ciência da Computação em Stanford (Foto: Wikipédia)

Talvez o mais ilustre crítico das criptomoedas no Brasil, o professor da Unicamp Jorge Stolfi agora vê suas palavras atingirem um nível mais elevado de influência. Uma entrevista que o acadêmico deu para o jornal alemão Deutsche Welle foi usada como base para uma decisão judicial que condenou um esquema de pirâmide financeira.

O caso envolve a Bemoney e seu criador, João Felipe Augusto Tavares. Segundo é descrito no processo que tramitou na 2ª Vara Cível de Ji-Paraná (RO), a empresa oferecia ganhos de 2% ao dia com o suposto investimento em criptomoedas. 

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Na ação judicial que um cliente lesado abriu contra a empresa e Tavares, o juiz Leonardo Leite Mattos e Souza entendeu ser um caso de pirâmide e até explicou os conceitos desse crime na decisão:

“Esse ‘negócio’ fraudulento é conhecido como ‘Esquema Ponzi’. Os primeiros a investirem na ‘pirâmide’ (ou no ‘negócio’) obtêm grandes lucros e estimulam outros a investirem no tal arranjo. Mas chega um dia em que a alimentação das futuras operações fraudulentas – embora lucrativas para alguns – fica comprometida.”

Mas o fato ainda mais relevante é que o juiz inseriu em sua decisão uma entrevista que o PhD Jorge Stolfi deu para a Deutsche Welle e que deixa implícito que o magistrado concorda com a visão do professor de que todo o setor de criptomoedas é uma grande pirâmide financeira. 

“Segundo Jorge Stolfi, professor da UNICAMP e Ph.D por Stanford, até onde se sabe, as criptomoedas não possuem lastro, não geram valor e o comércio delas beneficia apenas quem está no topo do sistema, tal como outros ‘Esquemas Ponzi’. Assim, a única maneira do ‘investidor’ receber seu dinheiro de volta é mediante o ingresso de outro ‘investidor’ que aloque dinheiro na ‘operação’, pois inexiste fonte capaz de viabilizar o retorno do valor investido”, aponta o juiz na decisão.

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O magistrado condenou a empresa e seu dono a ressarcir em R$ 209 mil o cliente que entrou com a ação judicial.

“Rede Bitcoin não tem absolutamente nada”

O trecho da entrevista de Stolfi colocado na decisão judicial é grande. O professor defendeu nessa conversa com o jornal alemão que não existe atividade produtiva real no ecossistema do Bitcoin e que o topo da pirâmide seriam os mineradores.

Veja abaixo o trecho da fala de Stofli incluído na decisão:

“É bem diferente de uma ação. Nesse caso, a empresa cria riquezas, presta serviços, gera dinheiro – e o lucro que vem disso pertence aos acionistas e investidores. Essa é a ideia básica do investimento produtivo. Na pirâmide financeira, você tem uma estrutura em que o seu nome vai subindo e, quando chega lá em cima, você ganha um monte de dinheiro, mas porque ele vem de outros que investiram na pirâmide.

Suponha que você compre um bitcoin por 20 mil dólares e venda por 50 mil dólares. Você ganhou 30 mil dólares. Mas por quê? Porque alguém comprou o seu bitcoin por 50 mil dólares. Esses 30 mil dólares não vieram de uma atividade produtiva; no caso de um sistema, é puramente transferência. A rede de bitcoin não tem absolutamente nada“.

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Jorge Stolfi foi procurado para comentar o caso, mas não respondeu até a publicação. A reportagem será atualizada caso ele se pronuncie sobre o assunto.

Uma voz crítica, mas muito ouvida

Em novembro de 2022, o Portal do Bitcoin publicou um perfil de Jorge Stolfi. O professor é uma voz altamente reconhecida no campo da ciência da computação e isso se alastrou para a comunidade cripto: o acadêmico é seguido no Twitter por Vitalik Buterin, criador do Ethereum; Michael Saylor, fundador da Microsatrategy; Kris Marszalek, CEO da Crypto.com; e Justin Sun, fundador da Tron.

Stolfi tem mestrado em matemática aplicada na USP e doutorado em Ciência da Computação pela Universidade de Stanford. É professor titular do Instituto de Computação da Unicamp e em 1996 obteve a livre-docência, que é o mais alto grau de titulação que um acadêmico pode chegar.

Em maio de 2022, mostrou a dimensão de sua importância na ciência da computação ao fazer um chamado em seu Twitter: “Todo cientista da computação deve ser capaz de ver que criptomoedas são sistemas de pagamento totalmente disfuncionais e que a ‘tecnologia blockchain’ (incluindo ‘smart contracts’) é uma fraude tecnológica. Vocês poderiam por favor dizer isso em voz alta?”.

No mês seguinte um grupo de 26 cientistas da computação, incluindo Kelsey Hightower, engenheiro chefe do Google Cloud, enviou uma carta aberta ao Congresso dos Estados Unidos afirmando que as criptomoedas têm potencial de danos enormes à população e pouca ou nenhuma utilidade prática.

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A carta foi endossada por 1,5 mil acadêmicos e o jornal El Pais afirmou que Stolfi, um dos principais 26 signatários, foi a força motriz por trás do movimento.

A revolta que culminou na carta ao Congresso não foi o único efeito prático da militância de Jorge Stolfi. O jornalista australiano David Gerard, que cobre o mercado de criptomoedas de um ponto de vista crítico, afirma que foi uma manifestação do cientista brasileiro que fez o órgão regulador do mercado de capitais dos EUA rejeitar um produto.

“Ele enviou avisos escritos sobre as fraudes financeiras em cripto para entidades regulatórias como a SEC e em pelo menos um caso, pediram para que ele falasse mais. Eu estou convicto que os documentos de Jorge foram uma das razões pelas quais o ETF de Bitcoin dos irmãos Winklevoss foi recusado”, diz Gerard.

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