Imagem da matéria: “Argentinos já usam bitcoin como fuga da própria moeda”, diz professor de economia internacional
(Foto: Shutterstock)

“O governo da Argentina não tem como controlar o Bitcoin, a não ser que incentive seu gasto”. A frase é do professor e pesquisador em Economia internacional e Macroeconomia da UFF (Universidade Federal Fluminense), Adriano Vilela Sampaio.  

Em conversa com o Portal do Bitcoin, Sampaio analisou a situação do país assolado pela inflação e explicou que a tentativa da Argentina em conter a saída de dólares de suas reservas, caso seja algo mal-feito, pode acabar acelerando a evasão de capitais. Leia abaixo a entrevista completa:

Publicidade

Portal do Bitcoin — A Argentina fechou 2019 com inflação de 53,8%, a maior desde 1991. O que está acontecendo?
Adriano Sampaio — No começo da década de 90, uma série de países emergentes como o Brasil e própria Argentina atrelou a sua moeda ao câmbio como uma forma de controlar a inflação, a chamada âncora cambial. Na Argentina, estava na lei que um peso valia um dólar. Podia até mesmo ter depósito em banco em dólar. Na Argentina, a cultura da dolarização continuou mesmo depois do fim desse regime de câmbio fixo. 

O problema é que o governo da Argentina voltou a se endividar em dólar. Quando começou a se ter pressão para ter a desvalorização, começou a ter problema de sustentabilidade da dívida. Desvalorizações cambiais, que muitas vezes estão ligadas à queda de preço de commodities, são muito inflacionárias.

O professor e pesquisador em Economia internacional e Macroeconomia da UFF (Universidade Federal Fluminense), Adriano Vilela Sampaio
O professor e pesquisador em Economia internacional e Macroeconomia da UFF (Universidade Federal Fluminense), Adriano Vilela Sampaio. Foto: Arquivo pessoal

O Banco Central Argentino decidiu recentemente controlar a saída de dólares de sua reserva. Por que tomar essa medida?
Quando o governo tem dívida em dólar e tem uma pressão de saída de capital, ocorre desvalorização da moeda local, o que alimenta a inflação. Quando piora a situação do setor externo, pode gerar a chamada expectativa auto-realizável com a corrida para compra de dólar ou pagamento de dívida em dólares o que faz com que o dólar suba ainda mais. Isso traz mais dificuldade para a Argentina a pagar sua dívida.

Uma das saídas é tentar impor o controle de saída de capital para conter o contágio. O país conseguiu brecar um pouco essa saída de capitais. A questão é que o preço do dólar oficialmente é um e no mercado paralelo é outro muito mais alto.

Publicidade

O Bitcoin vem sendo usado na Argentina como alternativa?
O Bitcoin começou a ser usado por parte da população como instrumento de fuga para manter alguma reserva de valor. O governo, porém, se não emite e não tem controle, não tem como controlar o gasto. O que ele pode fazer é incentivar o gasto permitindo com que pessoas paguem as coisas com Bitcoin. Lá na Argentina tem mais pessoas usando Bitcoin que no Brasil.  

Isso não pode ter efeito reverso e acabar criando uma maior evasão de capitais?
Essa é uma questão difícil de avaliar. Quando o governo põe esse tipo de controle e os agentes encontram alguma brecha, eles aceleram ao máximo para evadir o capital. Em situação de grande instabilidade, isso pode acelerar mais a fuga de capital e deixar o país numa situação pior que antes. Se o controle não é tão pesado e bem feito, no qual os agentes não veem a necessidade de mandarem recursos para fora, ele pode não provocar essa fuga.

A crise fez com os argentinos corressem mais atrás de Bitcoins. Isso seria falta de confiança do povo na sua própria moeda?
A depender do contexto, a tendência dos agentes é, ao notar o risco da moeda se desvalorizar muito rapidamente, buscar ativos que consideram mais seguros. Pode ser inclusive o Bitcoin ou outras criptomoedas também.

A crise de hoje na Argentina é a segunda maior na América Latina, perdendo apenas para a Venezuela. Há o risco de a Argentina, sem pagar a dívida externa, passar pelo mesmo que o país governado por Nicolás Maduro?
Eu acho difícil. A situação da Venezuela é muito mais complexa. Lá se tem uma instabilidade política que duraria pelo menos uma década e nos últimos anos tem sido muito mais grave. Lá a economia doméstica está disfuncional já. A situação venezuelana é de deterioração política, econômica, social e geopolítica, pois nem com os governos da região há mais diálogo.

Publicidade

Na Argentina, a situação política é incomparavelmente melhor. As eleições recentes correram bem e a transição entre Maurício Macri e Alberto Fernández foi normal. A única situação grave é o pagamento da dívida. O governo abriu novos canais de negociação, precisa pagar a dívida e não vai conseguir. Teve empréstimo do FMI (Fundo Monetário Internacional) e auxílio da China, mas ainda haverá turbulências. 

O Brasil corre o risco de passar pelo mesmo problema que a Argentina?
Eu sinceramente não vejo esse risco. A Argentina, no governo Macri, aumentou o endividamento em dólar, porque as condições geralmente são melhores com os juros mais baixos. Mas corre o risco quando o dólar desvaloriza, a dívida na moeda doméstica aumentar. A dívida do Brasil em dólar é baixíssima. E, aqui se tem muito mais reserva do que volume de dívida. Liquidamente, o Brasil tem mais dólar do que precisa pagar.

A gente passou por uma desvalorização grande nesses últimos meses do Real, mas o Brasil ainda tem uma “bazuca” que são os mais de US$ 300 bilhões em reservas. Mesmo com o pior episódio de saída de capitais das últimas décadas, o Brasil não gastou nem 10% das suas reservas.

VOCÊ PODE GOSTAR
Deputado republicano Rich McCormick posa para foto

Deputado culpa apatia dos EUA com cripto pela lenta reação à prisão de executivo da Binance

Rich McCormick afirma que o tratamento dado ao caso de Tigran Gambaryan, detido na Nigéria, é marcado por hipocrisia em comparação a outros casos de destaque
Chefe de compliance da Binance, Tigran Gambaryan é fotografado na Nigéria

Congresso dos EUA avalia pedir libertação imediata de diretor da Binance preso na Nigéria

Tigran Gambaryan está sob custódia da Nigéria desde fevereiro, mas agora uma resolução pedindo sua libertação está progredindo entre os parlamentares
mark cuban

Mark Cuban ama Dogecoin, mas diz que qualquer outra memecoin é “rug pull”

Estrela do Shark Tank admite estar tentado a entrar no jogo das memecoins, mesmo reconhecendo que pode ser apenas uma “dança das cadeiras”
Agente do FBI retirando arma das costas

“Poderoso Chefão” de Los Angeles se passou por agente do FBI para roubar criptomoedas

Adam Iza é acusado de usar fundos roubados em veículos de luxo, aluguel de mansão e cirurgia para aumentar as pernas