A Binance impôs uma restrição que impede os traders P2Ps brasileiros de publicarem anúncios de compra e venda de criptomoedas na plataforma de negociação da exchange com qualquer outra moeda fiduciária que não o real.
Antes disso, os P2Ps que atuavam a partir do Brasil podiam negociar criptomoedas diretamente com outros usuários usando dólar, euro e peso argentino, entre diversas outras moedas. Na prática, isso limita a gama de clientes que os P2Ps brasileiros podem atender, já que agora só poderão negociar dentro da Binance com usuários que usem reais.
O Portal do Bitcoin confirmou a mudança na política da Binance com quatro profissionais P2P que usam a Binance para trabalhar. Procurada, a exchange não respondeu a uma série de questionamentos feitos pela reportagem, se limitando a dizer que “revisa seus processos e ferramentas como parte de seu compromisso com o desenvolvimento do ecossistema cripto”.
O P2P Daniel Hatano diz que notou a mudança na última sexta-feira (23), ressaltando que a Binance não fez qualquer aviso prévio para alertá-los sobre a nova política.
“Três dias atrás, de noite para dia, todo mundo [de fora do Brasil] foi proibido de negociar com brasileiro na plataforma P2P. Agora, somente brasileiro pode negociar com brasileiro. Isso é um problema porque havia muitos argentinos que negociavam conosco”, critica o profissional.
O P2P Nikolas Paolo diz que embora não opere com outras moedas fiduciárias além do real na Binance, também percebeu a mudança na plataforma. Na visão dele, isso vai afetar diretamente o fluxo de estrangeiros que compram criptomoedas em seus países de origem para vender no Brasil.
É o caso do token USDT, a stablecoin pareada ao dólar emitida pela Tether. Trata-se da criptomoeda mais negociada no Brasil que se tornou uma alternativa para aqueles que querem “dolarizar” seu capital, um caso mais comum em países que possuem moedas locais enfraquecidas, como Argentina e Venezuela.
USDT também se mostra uma alternativa para remessas de dinheiro para o exterior, já que utilizá-la envolve taxas muito menores do que uma operação de câmbio tradicional. Tal característica, somada ao anonimato da blockchain, já foi percebida por aqueles que querem contornar as autoridades e praticar evasão de divisas.
“Um argentino entrava no book P2P da Argentina, comprava USDT com pesos. Depois ele pegava esse USDT e vendia no book P2P brasileiro para receber reais. Muitos faziam isso. Se no P2P a pessoa, mesmo fazendo duas operações, gastava 5% de taxa, no câmbio oficial ela gastaria de 10% a 15%, então usar cripto continuava muito melhor”, compara Paolo.
Para o P2P, a mudança afeta o mercado local “pois agora a Binance perderá parcela significativa” dos possíveis clientes em busca dessa operação.
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Mudança de duas vias
O P2P Paulo Vitor notou que a Binance também passou a impedir que P2Ps com contas baseadas em outros países, como Argentina, publiquem anúncios de compra e venda de criptomoedas usando como par o real brasileiro.
Porém, enquanto nesses países outras moedas fiduciárias, como dólar e euro, continuam disponíveis na plataforma, no caso do Brasil apenas o real pode ser negociado como par pelos P2Ps.
“Acredito que a maior parte da movimentação de P2P no Brasil é feita com estrangeiros, não só argentinos. A comunidade de venezuelanos é muito grande, além dos árabes e chineses”, analisa Vitor.
Ele avalia a mudança da Binance como “limitante” e “perigosa” para os brasileiros que trabalham como P2P:
“Limita porque deixa de ter um volume de negociação no Brasil e fica perigoso no momento que fazemos negócios fora da plataforma que consideramos mais segura, com os processos de KYC [Conheça seu Cliente] . Além do que, nós brasileiros também podemos usar bancos estrangeiros ou conta em dólares de bancos nacionais para fazer P2P no exterior. Se não temos acesso a outras moedas, temos que recorrer a contas de terceiros, o que também torna a operação mais perigosa.”
Outro P2P ouvido pela reportagem que pediu para não ter o nome divulgado, vê a mudança da Binance com bons olhos, uma vez que pode trazer mais segurança para o mercado ao limitar que pessoas operem de maneira indevida, usando por exemplo, contas de terceiros. Ele inclusive diz já ver os efeitos da mudança da Binance na prática:
“Tem muitos argentinos vindo no privado querendo fazer negociação. Muitos deles conseguem abrir conta aqui no Brasil, ou alugar conta de brasileiros, para fazer câmbio. Como o KYC deles na Binance é de outro país, agora eles não conseguem mais operar com o par em real, da mesma forma que brasileiros que operavam em outros pares [de moeda fiduciária] não conseguem mais”, analisa.
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