Mercados passaram por uma alta volatilidade e ainda mais queda na semana passada, à medida que responderam à decisão do Federal Reserve dos EUA em aumentar juros em 0,5%. Na quarta-feira (4), inicialmente, os mercados haviam respondido bem à notícia, pois o bitcoin (BTC) havia atingido uma alta semanal de US$ 39.881.
Porém, a positividade foi momentânea e os mercados foram bastante liquidados na quinta-feira (5) e o bitcoin terminou a semana com uma queda de 13,8% e encerrou a semana em US$ 33.890. É uma tendência que se repete no início desta semana, com a criptomoeda sendo negociada no entorno dos US$ 30 mil.
Neste relatório, a Glassnode irá avaliar o estado de rentabilidade da rede e, agora, como ele mudou em relação ao estudo de caso de “tolerância à dor no mercado de baixa”, proposto na semana passada. Em seguida, será feita uma análise holística para observar a reação de mercado à recente fragilidade de preço entre inúmeros setores de mercado:
– espaço de transações em blockchain e urgência no “mempool” (transações pendentes a serem verificadas no blockchain);
– entradas e saídas de capital em corretoras como métrica;
– mercados de futuros e liquidações para avaliar o risco de desalavancagem;
– capital sendo alocado em fundos de índice (ou ETFs) negociados em bolsa no Canadá;
– a primeira grande contração no fornecimento de stablecoins dos últimos anos.
“Touros” de bitcoin estão sob pressão
À medida que o preço do bitcoin cai, os “touros” continuam sob bastante pressão para estabelecer um preço mínimo de apoio enquanto a rentabilidade da rede continua caindo. Agora, o mercado de bitcoins está 49,5% abaixo da alta recorde de novembro.
Embora isso represente uma queda significativa, continua modesta em comparação às quedas de outros mercados de baixa. Em julho de 2021, o mercado havia registrado uma queda de 54,2% e os mercados de 2015, 2018 e de março de 2020 haviam despencado entre 77,2% e 85,5% em comparação às respectivas altas recordes.
Na edição da semana passada, a Glassnode apresentou um possível caso de uso para outra queda de 10% na rentabilidade total da rede (definida como uma queda na porcentagem de endereços, entidades e/ou fornecimento em lucro).
Nesse caso de estudo, estimou-se que preços precisariam cair para cerca de US$ 33,6 mil para chegar atingir “tolerância à dor” similar à de mercados de baixa anteriores e que a rentabilidade geral da rede caia para 60%.
À medida que os preços atingiram US$ 33,8 mil, agora esse cenário se aconteceu e outros 10% da rede Bitcoin caiu em um prejuízo não realizado. Todas as três métricas caíram de 72% para 60%-62% em lucro. Esses níveis coincidem com a rentabilidade registrada nos mercados de baixa no fim de 2018 e no fim de 2019 e 2020.
No entanto, é importante destacar que ambos os mercados de baixa aconteceram antes do evento final de capitulação (desistência de ganhos anteriormente obtidos pela venda de posições em épocas de queda).
Assim, pode haver mais quedas, que estariam no âmbito do desempenho histórico do ciclo.
Dado que essas métricas tendem a se mover juntas, é possível calcular uma simples mudança na rentabilidade média da rede nos últimos 30 dias. Isso nos fornece um indício da taxa de mudança no “estresse financeiro” para investidores em bitcoin. No último mês, a porcentagem da rede Bitcoin caiu em um prejuízo não realizado de 15,5% (em média).
Essa queda na rentabilidade é a quarta mais severa nos últimos três anos, em comparação a julho e dezembro de 2021, que tiveram quedas de 18,1% e 19,1%. Março de 2020 continua sendo a queda recente mais significativa, pois a rede Bitcoin havia caído 35,4% em poucos dias.
Reação em blockchain
Os mercados de bitcoin se tornaram cada vez mais dinâmicos nos últimos anos, com uma análise holística que agora precisa observar as movimentações de moedas, volumes relacionados a corretoras, veículos de investimento fora da blockchain (ETFs, ETPs etc.), mercados derivativos e stablecoins.
Com isso em mente, agora será avaliada a reação de mercado entre esses diversos espaços.
O indicador do escore de tendência na acumulação de bitcoin registrou um mês mais suave, apresentando valores menores do que 0,2 desde abril. Isso geralmente sinaliza um comportamento mais distributivo e que houve menos acumulação, coincidindo com preços mais fracos de mercado.
É possível esmiuçar essa tendência em grupos de carteira, onde grande parte dos grupos, desde “camarões” a “baleias”, suavizaram suas tendências de acumulação em blockchain.
Enormes entidades, com saldos superiores a 10 mil BTC, estão realizando bastantes distribuições nas últimas semanas, como demonstrado pelos grandes valores na cor vermelha.
Pequenos investidores (com saldo inferior a 1 mil BTC) são os acumuladores mais fortes, mas sua acumulação é bem mais fraca do que era em fevereiro e março.
Durante épocas de volatilidade e estresse de mercado, é normal ver um fluxo de transações “urgentes” entrando no “mempool” — local onde todas as transações válidas “esperam” para serem confirmadas pela rede — do Bitcoin conforme investidores buscam diminuir o risco, vender ou garantir novamente suas posições em margem.
À medida que o mercado realizou a liquidação na última semana, houve uma explosão de 42,8 mil transações entrando no mempool do Bitcoin. Foi o fluxo de entrada mais alto de atividades de transação desde outubro de 2021 (quando a Glassnode começou a rastrear a atividade no mempool).
Também podemos ver que houve um alto nível de urgência associado a essas transações, pois o valor total de todas as taxas pagas por transações em blockchain atingiu 3,07 BTC. É o valor mais alto registrado desde o evento de desalavancagem do dia 4 de dezembro de 2021, em que o mercado havia despencado 34,5% em um só dia.
A dominância de taxas de transações em blockchain associadas a depósitos em corretoras também indica urgência, atingindo o segundo maior valor na História. Também fomenta a hipótese de que investidores em bitcoin estavam buscando diminuir o risco, vendas e/ou o acrescentar de garantias à sua margem em resposta à volatilidade de mercado.
15,2% de todas as taxas de transação pagas foram associadas a transações de depósito em corretoras, mais alto do que no auge do ciclo de alta de 2017 (12,1%), perdendo apenas para a liquidação de maio de 2021 (16,8%).
Todos os dias, enormes volumes de bitcoin entram e saem de corretoras. Fluxos em corretora acima de US$ 750 milhões (tanto de entrada como de saída, acima de US$ 1,5 bilhão) estão em um limite inferior durante o ciclo de mercado entre 2021 e 2022.
Durante a liquidação da última semana, mais de US$ 3,15 bilhões de valor entraram ou saíram de corretoras, com uma porcentagem líquida maior para entradas de capital, totalizando US$ 1,6 bilhão (ou 50,8%).
Esse foi o maior auge de volume total e relacionado a corretoras desde que o mercado atingiu recordes entre outubro e novembro de 2021. Também é o equivalente aos níveis de entrada/saída de capital no auge do mercado de alta de 2017.
A escala do histórico recente, quando comparado ao ciclo anterior, demonstra quantos fluxos de capital denominados em dólar estão espalhados pela rede Bitcoin.
Avaliando a resposta fora do blockchain
À medida que o mercado de bitcoins se torna cada vez mais dinâmico, é necessário analisar tanto as dinâmicas na blockchain como fora da blockchain para definir os prováveis direcionadores das movimentações de preço, força de mercado e sentimento dos investidores.
Nos últimos dois anos, diversos produtos de ETF “spot” (ou de negociação à vista) surgiram no mercado e três desses veículos de investimento são negociados no Canadá. Embora fluxos de entrada desses produtos sejam fortes desde novembro, as duas últimas semanas viram essa tendência se reverter significativamente.
Em uma variação de sete dias, mais de 6,66 mil BTC saíram desses instrumentos toda semana, o que corresponde bastante com a recente fragilidade no preço.
No setor de derivativos, contratos em aberto em futuros estão relativamente calmos dada a magnitude de volatilidade esta semana. Antes do anúncio do Fed sobre a alta de juros, aproximadamente US$ 1 bilhão de contratos em aberto entraram para os mercados de futuros de bitcoin.
No entanto, parte dessa alavancagem rapidamente acabou e o total de contratos em abertos se estabilizou após a liquidação de quinta-feira (5), mantendo-se em US$ 14,3 bilhões.
É possível ver a ação inicial antes do anúncio do Federal Reserve na variação de um dia nos contratos em aberto de futuros. Contratos em aberto aumentaram para um total de 30,4 mil BTC em 3 de maio antes de 25,48 mil BTC de valor no fim do dia 4 de maio.
Embora esses valores não pareçam triviais em termos de tamanho, ainda continuam bastante pequenos em comparação a grandes eventos de desalavancagem nos últimos 12 meses. Assim, parece menos provável que a alavancagem excessiva em futuros tenha sido um grande direcionador da ação de preço na última semana.
É possível solidificar essa hipótese ao analisar o total de liquidações que acontecem nos mercados de futuros. De modo geral, durante um evento de desalavancagem nos mercados de futuros, é esperado um volume relativamente enorme de posições sendo encerradas à força por meio de liquidações.
Porém, esta semana, no auge das liquidações, um valor máximo de US$ 135 milhões em posições futuras foram liquidados. Isso representa menos de 0,2% do volume de futuros negociados. Conforme o esperado, posições de compra (“long”) foram as mais afetadas, com uma dominância de 61,5% de todas as posições liquidadas.
Ao todo, parece que grande parte da recente fragilidade na ação de preço é mais direcionada pelo fraco sentimento de investidores, saída de capital e diminuição de risco em vez de uma desalavancagem direcionada pelo mercado de futuros.
Por fim, para medir a entrada de capital no mercado, é possível analisar o mercado de stablecoins. Stablecoins são uma das principais áreas de crescimento exponencial na indústria nos últimos anos e representam um veículo fundamental para entrada e saída de capital.
Desde a liquidação em março de 2020, os fornecimentos totais das principais stablecoins (USDT, USDC, BUSD e DAI) aumentaram de US$ 5,33 bilhões para mais de US$ 158,25 bilhões.
É um crescimento impressionante de 2.866% em apenas dois anos. USDT continua sendo o ativo dominante, contabilizando 52,6% do fornecimento, seguido de USDC, com uma dominância de 30,8%.
Porém, desde o início de abril, o fornecimento total de stablecoins estagnou e, agora, contraiu US$ 3,285 bilhões. A alta recorde era de US$ 161,53 bilhões.
Grande parte do reembolso de stablecoins é direcionada por USDC, que caiu US$ 4,77 bilhões desde o início de março. USDT, por outro lado, continua registrando expansão em sua demanda, aumentando US$ 2,50 bilhões durante o mesmo período.
O gráfico abaixo mostra a variação nos últimos 30 dias no fornecimento total de stablecoins (na cor azul) junto com a contribuição da USDC (cor vermelha).
É possível notar que, principalmente desde maio de 2021, USDC é uma grande contribuidora ao fornecimento total de stablecoins. Também é possível ver que essa contração recente no fornecimento de stablecoins é um evento raro, pois a contratação total no fornecimento atingiu uma taxa de -US$ 2,9 bilhões por mês.
USDC é a stablecoin que mais está sendo usada em resgates (pelo dólar americano) e isso indica que um grau de saída líquida de capital está acontecendo na indústria de criptomoedas como um todo.
No total, existem inúmeros sinais de fragilidade líquida no setor — muitos indicam que o sentimento de redução de risco continua sendo a principal posição de mercado neste momento.
Conclusões
À medida que o mercado de bitcoins amadurece e mais capital institucional entra no setor, fica cada vez mais evidente que o mercado responde a choques macroeconômicos e condições monetárias mais rigorosas.
Os amplos mercados responderam de forma volátil ao anúncio do Federal Reserve das taxas de juros ainda mais altas que, embora eram esperadas, confirmam a liquidez cada vez mais tensa entre mercados.
Esta semana, a Glassnode tentou apresentar uma visão holística sobre o mercado, avaliando uma resposta tanto dentro como fora da blockchain.
Parece haver uma fragilidade agregada entre quase todos os setores que, por sua vez, parece ser bastante impulsionada pelo fraco sentimento entre investidores e uma mentalidade de diminuição de risco em vez de uma desalavancagem liderada pelo mercado de derivativos.
Além disso, uma contração significativa nos fornecimentos de stablecoin, principalmente USDC, sugere que uma saída líquida de capital do setor está a caminho – como demonstrado pela turbulência com a UST, da Fundação Terra, no início desta semana. Isso fomenta a recente observação sobre as saídas líquidas de capital dos mercados de derivativos à medida que os retornos disponíveis se comprimem para 2% ou 3%.
O bitcoin continua bastante correlacionado às amplas condições econômicas, sugerindo que o caminho a seguir infelizmente ainda pode ser difícil — pelo menos por enquanto.
Sobre o autor
A Glassnode é a maior provedora de dados e inteligência de blockchain que gera métricas e ferramentas on-chain para quem realmente quer entender o mercado de criptomoedas.
*Traduzido por Daniela Pereira do Nascimento com autorização da Glassnode.