Imagem da matéria: Em crise, BitcoinToYou tem passado polêmico envolvendo "roubo" de Bitcoin entre sócios e ligação com pirâmides
André Horta, CEO da Bitcointoyou (Foto: divulgação)

Enquanto o halving do Bitcoin era o assunto mais comentado no mercado de criptomoedas global, no Brasil um caso de possível fraude ganhou destaque na sexta-feira (19) com um crescimento de reclamações de clientes da BitcoinToYou que não conseguem mais sacar seus fundos na corretora.

André Horta, o CEO da BitcoinToYou, não responde às tentativas de contato do Portal do Bitcoin, nem retorna as mensagens de clientes. Nos canais oficiais da BitcoinToYou também não há pronunciamentos sobre o bloqueio dos saques.

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No Reclame Aqui, a exchange deixou de responder às reclamações desde o início deste mês. As queixas no site de defesa do consumidor se concentram no mesmo problema: os saques não estão mais sendo processados. Quanto usuários tentam pedir ajuda ao suporte da corretora, não recebem resposta alguma.

A questão fez voltar ao holofote uma história envolvendo os dois principais sócios da BitcoinToYou: André Luiz Horta Santos Pereira e seu irmão Thiago Henrique Horta Lourenço. O primeiro acusa o segundo de roubar pouco mais de 775 bitcoins da empresa em 2019. Na atual cotação do BTC, essa quantia equivale a mais de R$ 250 milhões.

Entenda o caso

André entrou com um processo contra o irmão em 2021 pedindo a devolução das criptomoedas e uma indenização por dano moral de R$ 100 mil. O caso ainda está correndo na Justiça na 5ª Vara Cível da Comarca de Contagem, em Minas Gerais.

“Apesar de se apoderar indevidamente das criptomoedas transferindo-as para sua carteira, no montante total de 775,69507314 Bitcoins, o réu–Thiago se nega a restituir os Bitcoins, objeto do ilícito perpetrado, não socorrendo à autora-Vivar outra solução senão a busca de seu direito junto ao Judiciário”, diz petição acessada pela reportagem.

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A Vivar citada no texto é a autora da ação e era o nome empresarial da BitcoinToYou na época do processo. Em 2022, porém, os irmãos assinaram um termo de distrato encerrando a sociedade entre eles.

Segundo o processo, o desvio dos bitcoins teve início em 22 de janeiro de 2019, quando Thiago sacou indevidamente 675,69507314 BTCs de dentro da empresa, o que posteriormente foi confirmado por ele em conversas com o irmão.

Na época, Thiago supostamente tentou acobertar a questão registrando um Boletim de Ocorrência na 1ª Delegacia de Polícia Civil/Leste de Belo Horizonte relatando o roubo de 10 bitcoins.

Em 5 de fevereiro do mesmo ano, André teria confrontando o irmão, que assume ter “pego emprestado” mais 100 bitcoins e que iria devolver o mais rápido possível. Conforme a quantia não foi devolvida, André decidiu entrar com o processo.

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André argumenta no processo que esses saques indevidos feitos pelo irmão resultaram em “constrangimento injusto e descabido, tendo em vista que a autora-Vivar não consegue exercer regularmente suas atividades profissionais, como demonstra seu Balanço Financeiro”.

Ou seja, ele diz que a situação financeira ruim da exchange seria culpa do seu irmão. Porém, além de não comunicar clientes e continuar funcionando normalmente, não é possível afirmar por enquanto que existe relação entre o problema dos saques enfrentados agora pela companhia e a retirada de ativos por Thiago.

O documento anexado no processo mostra que, no fim de 2020, a BitcoinToYou tinha um prejuízo de pouco mais de R$ 111 milhões.

Desde o início, a Vivar representada por André pediu a gratuidade das custas do processo, argumentando que, diante de prejuízos anuais e os saques ilegais feitos por Thiago, não teria como arcar com esses valores.

A juíza Ivana Fernandes Vieira, porém, interpretou que a companhia possuía um ativo circulante suficiente para pagar esses custos, ainda que estivesse com prejuízo. Além disso, em determinado momento, por conta do fim da sociedade, André pediu para que a Vivar deixasse de ser a autora do processo e ele se tornasse o autor principal.

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Sem ter pago as custas iniciais para abrir o processo, e tendo seus recursos negados para garantir a gratuidade, em novembro de 2023, a juíza decidiu pela extinção do processo sem o julgamento do mérito.

Em 5 de abril desde ano, André entrou com um recurso para tentar derrubar a decisão, mais uma vez pedindo a gratuidade do processo. Na mais recente etapa do caso, André anexou um comprovante de pagamento de R$ 17.968,64 referente às custas do processo.

As polêmicas da BitcoinToYou

A BitcoinToYou foi uma das primeiras corretoras de criptomoedas lançadas no Brasil, mas sua história é cercada de polêmicas. Em 2019, por exemplo, a Justiça bloqueou R$ 6,4 milhões da conta da corretora após descobrir que a pirâmide financeira D9 Club usava uma conta na BitcoinToYou para movimentar seus fundos.

Por meio desses depósitos, os bitcoins da pirâmide eram convertidos em dinheiro. A D9 ainda teria recomendado que o mesmo deveria ser feito pelos investidores para receber seus rendimentos.

Na época, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS) afirmou que havia indícios de envolvimento entre os sócios da BitcoinToYou e Danilo Santana (sócio da D9). Levando isso em conta, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) negou o desbloqueio dos R$ 6,4 milhões da corretora.

A BitcoinToYou negou na ocasião qualquer relação com a D9, afirmando que eram apenas clientes como os outros “mais de 200 mil cadastrados”.

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“Ponte” para dinheiro de pirâmide

O CEO da BitcoinToYou, André Horta, voltou a ganhar manchetes em 2023, quando o Portal do Bitcoin descobriu com exclusividade que uma outra empresa de criptomoedas da qual ele também era dono, chamada Blockskip, foi usada pelos líderes de duas das maiores pirâmides financeiras com criptomoedas do Brasil, a GAS Consultoria e a Trust Investing, para transacionar cerca de R$ 233 mil entre si em 2020. 

Cláudio Barbosa, diretor de tecnologia da Trust Investing, permanece foragido da Justiça até hoje e foi identificado como a pessoa que recebeu dinheiro de Glaidson Acácio dos Santos, o “Faraó do Bitcoin”, através da Blockskip.

A Blockskip, aliás, era uma das principais receptoras de dinheiro de Cláudio, conforme identificou o Conselho de Controle de Atividades Financeiras, o Coaf.

No registro de CNPJ (baixado em dezembro de 2022), a atividade principal da Blockskip era a intermediação e agenciamento de serviços e negócios em geral. Apesar disso, nunca teve presença online, sem site ou perfis em redes sociais, e seu nome não era conhecido no setor cripto brasileiro.

De quase R$ 1 milhão transacionado por Cláudio em pouco mais de dois meses, R$ 524,6 mil passaram pela Blockskip, pouco mais da metade de todas suas transações no período.

A investigação da Polícia Federal vista pelo Portal do Bitcoin na época mostrou que a Blockskip também recebeu R$ 233,4 mil de Glaidson Acácio dos Santos, como pessoa física, cujo destinatário final era Cláudio Barbosa.

O papel de intermediação que a empresa de André Horta exercia para os fundos – possivelmente ilícitos – do líder da Trust Investing chamou atenção das autoridades, que fizeram uma visita ao endereço onde a Blockskip estava registrada em Belo Horizonte (MG). Por lá, não encontraram nada que remetesse ao negócio.

A Polícia Federal também não deixou passar em branco a relação que a BitcoinToYou já teve no passado com outra pirâmide financeira ligada a criptomoedas, a D9 Club.

“Pode se verificar a possibilidade da mesma [BitcoinToYou] atuar em crimes de pirâmide financeira e estar junto de Danilo Vunjão Santa (Danilo Dubaiano, Criador da pirâmide D9, que prometia rendimentos com Bitcoin e vive vida de luxo e ostentação em Dubai)”, dizia trecho da investigação da PF.

Procurado pela reportagem comentar o assunto na época, Horta não quis dizer que tipo de serviços a Blockskip oferecia nem qual era a relação da empresa com Cláudio e Glaidson. Falou, no entanto, que a BitcoinToYou sempre seguiu “altos padrões de compliance, KYC e AML”. Um ano depois, no entanto, a crise se intensificou na corretora, cujos clientes seguem temerosos sobre o destino de seus fundos.

*Com colaboração de Saori Honorato.

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