Sete meses depois do lançamento do protocolo que deu voz aos NFTs e tokens fungíveis na rede do Bitcoin, chegou o momento de fazermos uma análise geral sobre o que aconteceu desde então.
Mas antes, vale dar um contexto geral para os que não estão familiarizados com o protocolo que está dando o que falar.
- O protocolo Ordinals permite a identificação ordenada dos Satoshis (1º, 2º, 3º, 4º, 5º, etc.), permitindo com que eles sejam identificados, rastreados e negociados de forma individual. Esse protocolo, de certa forma, quebra a não fungibilidade do Bitcoin, dado que agora todo satoshi tem um atributo que o torna único.
- Satoshi é a menor divisão do Bitcoin. Um Satoshi =1/100.000.000 Bitcoin.
- O protocolo Ordinals também viabiliza as inscriptions, que permitem a inclusão de conteúdo arbitrário (imagem, áudio, etc) em satoshis individuais, transformando-os em artefatos digitais nativos do Bitcoin.
- O protocolo Ordinals não deu origem aos NFTs na rede do Bitcoin, mas foi o que catalisou essa narrativa. Em 2014, já era possível anexar imagens diretamente na rede do BTC por meio do Counterparty. Um exemplo famoso é a coleção Rare Pepes. No entanto, essa prática foi enxotada por alguns core devs da rede.
Agora que vocês já estão contextualizados, vamos aos números.
Status atual do mercado
Desde o lançamento do protocolo em janeiro, foram registradas mais de 17 milhões de inscrições na rede do Bitcoin.
Com base no gráfico a seguir, é possível observar o número diário de inscrições e os diferentes tipos de arquivos utilizados nessa atividade.
Entre as 17 milhões de inscrições, é evidente a predominância dos arquivos de texto. Isso se deve à popularização dos “domain names” e aos experimentos com o padrão brc-20, que tem como objetivo replicar o protocolo erc-20, permitindo a criação de tokens fungíveis na rede do Bitcoin.
Ainda não está totalmente claro a que se refere a categoria “outros” nesse gráfico, mas supõe-se que esteja relacionada às inscrições de arquivos “html”.
Em termos de volume, o mercado já registrou a participação de mais de 150 mil usuários únicos, movimentando mais de USD 200 milhões em ativos criados com base no protocolo Ordinals.
É perceptível pelo gráfico abaixo, que mostra o volume diário por marketplace, que o mercado atingiu o seu pico de volume em maio e tem experimentado um aumento contínuo de desde junho.
O elevado volume registrado em maio foi impulsionado pelo boom dos experimentos relacionados ao brc-20, e isso pode ser observado pelo fato de que, na época, o marketplace “unisat” negociava exclusivamente esse tipo de ativo.
No momento, Magic Eden e OKX lideram o mercado. Opensea e Blur ainda não realizaram integrações para permitir a negociação desses ativos em suas plataformas.
É curioso trazer que apesar do protocolo ter sido lançado em janeiro, o volume só começou a ser mensurado em fevereiro, pois antes dessa data não havia nenhum marketplace dedicado aos Ordinals. As vendas eram realizadas de maneira P2P via Discord, intermediários e planilhas no Google Sheets.
Estive envolvido na criação do primeiro marketplace de Ordinals da história, então segue uma história inédita aqui no Portal do Bitcoin: o Ordinals.Market foi criado por dois brasileiros em uma única madrugada. Posteriormente, o marketplace foi adquirido pela coleção Bitcoin Punks, que era uma das principais coleções do momento.
Naquela época, antes do surgimento do Ordinals.Market, uma das formas mais convenientes de adquirir um Ordinals, além das negociações peer-to-peer (P2P), era através dos cofres da Emblem Vault. Esses cofres eram basicamente carteiras de Bitcoin envelopadas e transformadas em NFTs na rede Ethereum, e eram comercializados no OpenSea.
No entanto, esse método estava suscetível a muitos golpes. Algumas pessoas pegavam a mesma imagem dos NFTs mais valiosos, convertiam-nas em cofres da Emblem Vault e os listavam no OpenSea. Assim, você acabava comprando um NFT “falso”. Foi nesse contexto que surgiu o Ordinals.Market, um marketplace que verificava a autenticidade desses cofres, reduzindo drasticamente os golpes na época e impactando positivamente o volume do mercado.
Satoshis Raros continuam dominando a narrativa
Como o protocolo permite a identificação de satoshis de maneira individual, é possível identificar os satoshis que estiveram presentes em momentos históricos da rede. Esses atributos históricos estão sendo chamados de “satributes” pelo mercado.
Pela imagem abaixo, é possível verificar os principais atributos que satoshis históricos podem ter.
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No momento, o queridinho do mercado é o “uncommon”, cada satoshi do bloco 9 está sendo negociado por cerca de USD 100 e um Rare Sat em leilão já recebeu lances superiores a USD 500 milhões.
A Rare Satoshi Society é a maior provedora de satoshis raros do ecossistema e em uma conversa particular, Gansy, fundador da RSS, abriu comigo que o grupo já faturou mais de US$2,5 milhões vendendo satoshis históricos.
Além de serem colecionados de maneira pura, esses satoshis raros também têm sido utilizados para a criação de muitas coleções. Ao invés de inscrever obras em satoshis comuns, muitos artistas estão optando por inscrevê-las em satoshis históricos, atribuindo assim, mais valor ao projeto.
A coleção Ordinal Maxi Biz, criada por Zk-Shark e pelo lendário caçador de satoshis, Nullish, foi a primeira coleção de PFPs inscrita em satoshis do Bloco 9, por exemplo.
OMB já movimentou mais de 300 Bitcoin em volume no mercado secundário e atualmente um NFT da coleção custa 0.27 Bitcoins.
Outro exemplo interessante do uso dos rare sats é esse criado por DAnTer, um dos maiores “inscribers” do ecossistema. DAnTer criou uma cartela de satoshis históricos que qualquer um pode comprar para criar a sua coleção em cima deles.
Como pode ser visto abaixo, essa cartela contém 600 satoshis, 100 do bloco 78 que foi o primeiro bloco minerado pelo lendário Hal Finney, 100 satoshis minerados por Nakamoto, 200 satoshis utilizados na famosa transação das Pizzas do Papa Johns e 200 satoshis dos primeiros 1000 blocos minerados.
O mais interessante é que DAnTer utilizou o método de “inscrição recursiva” para criar essa cartela. Então, caso você utilize algum satoshi dela, os números irão se alterar.
Ordinals já impactaram diretamente a rede do Bitcoin?
Além dos impactos culturais decorrentes do protocolo Ordinals, é válido entender se a rede também está sendo incrementada.
Ao analisar o gráfico abaixo, que mostra o número de carteiras de Bitcoin com saldo maior que zero, não é possível avaliar o impacto dos Ordinals na criação de novas carteiras. Embora tenha ocorrido um aumento significativo durante o período de boom, não podemos afirmar com segurança que os Ordinals foram responsáveis por esse crescimento.
Apesar disso, como pode ser visto no próximo gráfico, Ordinals levaram o Bitcoin a atingir o seu maior pico de transações na história, durante o período em que o boom das brc-20 ocorreu.
E com isso, também tivemos o segundo maior dia de recompensas derivadas das fees, para os mineradores. O seguinte gráfico mostra esse spike bem no período de boom das brc-20.
E como pode ser visto no último gráfico, depois de anos, Taproot finalmente começou a ser utilizado pelo mercado.
Por fim, outras layers agregadas ao Bitcoin também começam a sentir os efeitos iniciais de Ordinals. Como a Messari aponta em seu último relatório sobre as principais L1’s do mercado: “Com Ordinals renovando o interesse na programabilidade do Bitcoin, Stacks se destacou entre as L1s, liderando o crescimento trimestral em capitalização de mercado (340%), receita (218%), uso da rede (~35%), valor total bloqueado (TVL) em DeFi (276%) e volume de negociação em DEX (330%).”
Sobre o autor
Lugui Tillier é CCO da Lumx Studios durante o dia e navegante da Web3 underground durante a noite.
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