Com moeda fraca e inflação alta, nigerianos adotam bitcoin e governo declara guerra

Banco Central da Nigéria fechou as contas das corretoras de criptomoedas
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Protesto em Lagos, na Nigéria (Foto: Shutterstock)

Correção: A Nigéria é o terceiro país do mundo com maior volume de negociações P2P, não o segundo, como informado inicialmente. A informação foi corrigida.

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Enquanto governo da Nigéria vem considerando o Bitcoin uma peste para a economia nacional, para muitos nigerianos trata-se de forma uma proteção. No começo de fevereiro, o Banco Central do país determinou que bancos e instituições financeiras do país deveriam identificar e fechar as contas de clientes que negociassem criptomoedas.

A medida resultou no fechamento de corretoras locais e internacionais, como a Binance, pois elas ficaram sem acesso aos bancos. Além disso, é uma tentativa de impedir o acesso popular aos ativos digitais em um momento de crise econômica no qual a moeda local, a Naira, vem perdendo valor. Na prática, porém, não é tão fácil fazer a decisão funcionar.

“Dane-se o Banco Central da Nigéria e o governo. Vamos continuar comprando e negociando bitcoin e altcoins da mesma forma por meio de P2P”, disse ao Portal do Bitcoin o empresário e arquiteto de blockchain Charles Okaformbah durante uma videochamada.

Em negociações P2P, uma pessoa transfere criptomoedas diretamente para outra sem a intermediação de uma exchange.

Okaformbah, que mora em Lagos (maior cidade da Nigéria) e trabalha com tecnologias de registro distribuído desde 2017, disse que os nigerianos não precisam de corretoras ou empresas. “A gente sempre acha um jeito de comprar e vender”.

O cenário P2P retratado pelo empresário — que foi aquele sonhado por Satoshi Nakamoto ao criar a rede Bitcoin — pode ser visto nos números. De acordo dados das exchanges P2P Paxful e LocalBitcoin, compilados pelo Usefultulips, a Nigéria é o terceiro país do mundo em volume de negociações entre pessoas, atrás dos Estados Unidos e da Rússia.

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Em 2020, segundo a ferramenta, os nigerianos negociaram US$ 347 milhões em criptomoedas nas plataformas, um aumento de 20% em relação ao ano anterior. Nos EUA, os investidores movimentaram US$ 1,2 bilhão no ano passado, enquanto que na Rússia o total foi de cerca de US$ 416 milhões.

Só na Paxful, segundo dados enviados ao Portal do Bitcoin, há cerca 1 milhão de nigerianos cadastrados na empresa, o que representa um quinto do total de clientes.

O que houve com economia da Nigéria

Desde 2020, a Nigéria vem sofrendo com a queda da demanda e do preço do petróleo, seu principal produto de exportação. Como consequência, as reservas cambiais caíram e a inflação disparou.

Para controlar a lacuna cambial entre a moeda e o dólar e proteger a economia, o Banco Central da Nigéria desvalorizou a Naira três vezes em 2020. Além disso, limitou as transações internacionais com moeda estrangeira e o acesso ao dólar em US$ 200 por mês para cada cidadão — algo similar ao que acontece na Argentina.

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A instabilidade em torno da Naira, combinada com as políticas de controle de capital, fez com que as pessoas procurassem maneiras melhores de proteger suas riquezas, disse ao Portal do Bitcoin a comunicadora Enitan Dosumu, que mora em Lagos, capital do país.

“Por causa dessas políticas governamentais e da desvalorização da Naira em relação a algumas das principais moedas do mundo, alguns nigerianos têm preferido manter parte de suas economias em criptomoedas, pois elas servem como reserva de valor”.

Enitan Dosumu (Foto: Reprodução/Facebook)

Dosumu usa criptomoedas desde 2018. Em conversa pelo chat do Instagram, ela também disse à reportagem que os ativos digitais, além de ajudarem os nigerianos a protegerem o patrimônio, funcionam ainda como meios para fazer remessas internacionais de dinheiro:

“Usamos bitcoins e altcoins para contornar as restrições impostas por alguns dos principais processadores de pagamento, como Paypal, Stripe, Skrill etc, nas transações comerciais com empresas na comunidade internacional. É uma maneira mais rápida, fácil e barata de enviar dinheiro e receber valor (dinheiro)”.

Bitcoin no Senado

Além de virar pauta no Banco Central da Nigéria, a discussão sobre criptomoedas também chegou ao Senado do país no início deste mês. O senador Sani Musa disse que o bitcoin é forte e tornou a Naira “quase inútil ou sem valor”.

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Um outro senador, chamado Biodun Olujimi, falou que o momento é “de harmonizar todas as questões que envolvem as criptomoedas”.

Sobre a regulação, a comunicadora Dosumu acha que os senadores vão tentar banir as criptomoedas: “Isso porque eles têm medo e não sabem como elas funcionam”.