BC vai apresentar projeto para fiscalizar corretoras de criptomoedas e exigir que tenham sede no Brasil

Segundo presidente do Banco Central, sede em território nacional será ponto inegociável do projeto; exchanges como a Binance ainda não possuem esse quesito
Presidente do Banco Central Roberto Campos Neto falando diante de um microfone

Roberto Campos Neto, presidente do BC (Foto: Wikipédia)

O Banco Central pretende apresentar um projeto de lei para regular a atuação de corretoras no mercado de criptomoedas. A informação foi divulgada pelo presidente Roberto Campos Neto durante audiência nesta terça-feira (31) na Câmara dos Deputados (assista mais abaixo).

“No nosso PL a gente vai começar a regular as corretoras. Antes não estava sob regulação do Banco Central. Agora nós vamos regular as corretoras. E regulando as corretoras a gente vai saber se tem lastro ou não. Também vamos pedir que as corretoras tenham uma sede no Brasil”, disse Campos Neto.

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O executivo se refere a lastro como a quantia suficiente de criptomoedas para honrar os certificados de compras feitas pelos clientes.

Enquanto o presidente falava, o deputado Celso Russomano (Republicanos/SP) o interrompeu e pediu que fosse determinado de forma obrigatória que as corretoras tenham sede no Brasil. Campos Neto então concordou que essa será um ponto inegociável do projeto.

Hoje, corretoras estrangeiras como a Binance não tem sede no Brasil. Conforme reportagem do Portal do Bitcoin, a exchange tem um novo CNPJ no Brasil desde o dia 4 de fevereiro deste ano. O documento mostra que a empresa se apresenta como domiciliada no exterior — especificamente em Dublin, capital da Irlanda.

Trata-se do segundo CNPJ relacionado à empresa. Em abril, com esse mesmo registro, a Binance entrou com sócia da B Fintech — uma empresa fundada no Brasil que tinha como sócio o CEO da exchange, Changpeng “CZ” Zhao. Conforme os documentos, ele agora se retirou da sociedade.

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Recentemente, Campos Neto esteve reunido com representantes da Binance no dia 13 de maio. O objetivo foi tratar de “assuntos institucionais”, segundo agenda divulgada pela instituição.

Abaixo o vídeo com a fala do presidente do BC (o trecho sobre criptomoedas começa após uma hora e 28 minutos do início do vídeo):

Presidente do Banco Central debate sobre juros e inflação na Comissão de Defesa do Consumidor

Tramitação

O executivo lembrou que já existe um PL na Câmara, já aprovado pelo Senado e em regime de urgência, que visa ser o marco regulador do setor.

“Nós gostamos das duas versões [a que foi para o Senado e a que voltou para a Câmara]. A gente ainda vai ter um outro projeto em cima desse, para melhorar”, disse.

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Normalmente, em Brasília, após uma lei mais geral estabelecer o marco regulatório sobre determinado setor, o órgão apontado como regulador elabora junto ao Governo um projeto mais específico com os detalhes do tema.

Em geral, o Governo então repassa o texto para alguma liderança no Senado ou Câmara o apresentar como projeto de lei.

No caso do PL que está na Câmara, o texto atribui ao Poder Executivo o poder de apontar qual órgão irá regular o tema – a expectativa é que seja justamente o Banco Central, pela expertise que já possui no setor de criptomoedas.

Na terça-feira. o Banco Central anunciou que adiou para 2023 os testes do real digital, a CBDC (Moeda Digital Emitida por Banco Central, segundo a sigla em inglês) nacional cujo projeto-piloto deveria começar no segundo semestre deste ano. O atraso foi revelado por Fábio Araújo, economista do BC e responsável na instituição por coordenar o projeto.

“Tínhamos a intenção de começar o [teste] piloto talvez ainda no final deste ano, mas a greve atrasou bastante o cronograma”, explicou Araújo. A greve a que se refere é a dos servidores do Banco Central, que reivindicam reajuste salarial de 27% e reestruturação de carreira. Nesta terça-feira (31), a classe aprovou em assembleia dar continuidade à greve por tempo indeterminado.

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Custódia e stablecoins

Campos Neto tocou em um ponto muito debatido na comunidade, a custódia: que a posse das criptomoedas só é de fato da pessoa se ela tem também a senha criptográfica que dá acesso a um endereço que se relaciona com a blockchain.

Quando a criptomoeda está com a corretora, o cliente tem um certificado afirmando que possui direito sobre um ativo específico. E essa questão da custódia é para o presidente do BC um grande problema, não só brasileiro, mas mundial.

“Hoje você pode comprar uma criptomoeda tendo um encryption e guardar num pen drive, em uma digital wallet. Mas não é assim que é feito no Brasil em grande parte. Em grande parte é no Brasil como se fosse uma nota de participação: você comprar uma criptomoeda de uma corretor e recebe um certificado de que tem a criptomoeda, mas você não tem o encryption. Imagina-se que a corretora tenha um lastro para te vender aquela participação sobre um ativo que ela estaria custodiando. O que se notou é algumas corretoras ou não tinham lastro integralmente”, disse.

O executivo relatou que esteve recentemente com o diretor de uma grande corretora de criptomoeda e externou a preocupação da concentração da custódia de criptomoedas (segundo o presidente do BC, quatro empresas controlariam 80% do mercado mundial). Provavelmente, Campos Neto se referiu à própria conferência com a Binance.

Por fim, Campos Neto falou também da preocupação que critpomoedas algorítmicas representam para o mercado. O presidente do BC citou nominalmente o crash do projeto Terra.

“Uma preocupação que temos é com esses criptoativos que são interligados por algoritmos. A gente viu agora o Terra LUNA um exemplo de um criptoativo que virou zero em algumas horas.