Sheik das Criptomoedas: conheça a trajetória do cuidador de pets que virou líder da pirâmide financeira Rental Coins

Em um blog, o Sheik das Criptomoedas conta que começou a trabalhar com marketing multinível nos EUA e conheceu as criptomoedas por acaso
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Sheik das criptomoedas em festa à fantasia (Foto: Reprodução)

Preso nesta quinta-feira (3) em Curitiba pela Polícia Federal, o empresário Francisley Valdevino da Silva entrou definitivamente para o panteão dos empresários presos por usarem criptomoedas como chamariz para esquemas de pirâmide financeira que deixaram milhares de vítimas pelo país – a estimativa da polícia é que apenas Francisley tenha movimentado R$ 4 bilhões através da empresa Rental Coins.

Além da prisão, o grupo parece ser unidos pelo gosto por apelidos extravagantes. Personagens como Glaidson Acácio dos Santos e Claudio Oliveira se tornaram mais conhecidos pelas alcunhas de de “Faraó do Bitcoin” e “Rei do Bitcoin“, respectivamente. Já Francisley ficou conhecido como o Sheik das Criptomoedas.

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O nome, aliás, parece ter produzido um profundo complexo no empresário, em suas próprias palavras:

“Quando pequeno, eu sofri um pouco com meu nome, afinal, não era fácil para uma criança ser chamada de Francisley Valdevino da Silva, e em uma das vezes que eu estava reclamando para minha mãe das brincadeiras de mau gosto que os meninos faziam com meu nome, ela me disse: “Filho, seu nome ainda será muito lembrado, você será um grande homem e seu nome estará relacionado as grandes coisas boas que fará e você terá muito orgulho de ser o Francisley Valdevino da Silva”. A partir deste dia meu foco mudou e eu decidi conquistar meu próprio futuro”.

O relato de Francis Silva, como é chamado pelos amigos, é contada em um blog de sua autoria e que ainda está no ar. Via Internet, ele conta a sua trajetória de vida, como conheceu as criptomoedas e começou a empreender nesse setor.

No blog, Sheik aborda sua passagem pelos Estados Unidos – uma época da qual talvez se arrependa agora. Foram autoridades do Departamento de Justiça dos EUA que entraram em contato com autoridades brasileiras para informar que investigavam uma série de crimes cometidos por Francis no país da América do Norte – e que suspeitavam que era cometidos também no Brasil.

Essa comunicação fez a Polícia Federal eventualmente bater na porta do Sheik nesta quinta por descumprir imposições das medidas cautelares impostas pela Justiça em uma fase anterior das investigações sobre a Rental Coins.

Francisley respondia a uma série de processos em liberdade, dadas algumas condições, como o afastamento da direção de suas companhias. No entanto, segundo a polícia, ele passou a realizar encontros frequentes, em sua residência em Curitiba, com funcionários de suas empresas. Isso “demonstra que a organização criminosa continuava ativa e promovendo atos criminosos”, de acordo com a PF.

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O Sheik é acusado de montar uma organização criminosa que movimentou R$ 4 bilhões pelo sistema bancário oficial do Brasil, um valor que não leva em consideração as movimentações com criptomoedas. Uma de suas vítimas seria a modelo Sasha Meneghel, filha da apresentadora Xuxa. A celebridade investiu R$ 1,2 milhão na pirâmide financeira.

Começo difícil

Segundo os relatos de Sheik no blog, seu começo nos negócios foi bem longe do padrão luxuoso posterior – reportagem da TV Globo mostrou que em uma casa usada por ele foram apreendidos relógios, joias, carros de luxo, barras de ouro e dinheiro em espécie.

Francisley afirma que seu primeiro emprego foi em uma pet shop chamada Águia de Ouro. Por lá, teria passado por todos os cargos possíveis, desde a limpeza dos animais de estimação até o cargo de vendedor externo, durante quatro anos de trabalho.

Os momentos difíceis continuaram: em 2007, morando em Sorocaba (SP), diz ter aberto uma web rádio gospel, que não deu certo. Ele se mudou para Curitiba e abriu uma loja de roupas. Inicialmente bem-sucedida, com sete unidades no Sul do Brasil, a empreitada acabou falindo por “má administração”, segundo ele próprio.

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Foi aí, que segundo o próprio, que o poder gravitacional das pirâmides financeiras começou a puxá-lo para sua órbita.

“Para tentar me reerguer como empresário, decidi investir na área de Marketing Multinível e abri a empresa Wolkeb Club, que oferecia um serviço de clube de compras e descontos para os conveniados. Após de seis meses de empresa atuando como presidente, comecei a sofrer difamações sobre estar aplicando um golpe financeiro”, afirma.

Esse texto tem com título “O Início de um Império”.

Um encontro fortuito

Em 2016 Francisley se muda para os Estados Unidos, passando pelos estados da Flórida e de Utah. E é lá que sua vida é alterada por um encontro fortuito.

“No final de 2016, passando por algumas dificuldades financeiras nos EUA, estava em um supermercado com apenas $20 no bolso, quando encontrei um homem que, em uma conversa de poucos minutos, me falou sobre as criptomoedas. Ao final recebi um convite para conhecer um pouco mais sobre os ativos digitais”, relembra.

O Sheik diz que resolveu estudar o tema, estagiou em uma empresa – da qual não cita o nome e resolveu montar uma companhia própria, a Intergalaxy Softwares Digitais.

Esse teria sido o pulo do gato para uma vida de riqueza. E, mais que isso, para ele, uma vingança contra o mundo e contra quem zombava de seu nome:

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“Hoje, o nome que era tirado sarro quando pequeno, Francisley Valdevino da Silva, é proprietário de uma das maiores empresas privadas de tecnologia do mundo, e também de um patrimônio que soma casas, carros, prédios, salas comerciais e ativos digitais”.

O sucesso e o emaranhado de CNPJs

Francisley trouxe a Intergalaxy para o Brasil – e a transformaria em um confuso conglomerado de empresas. Reportagem do Portal do Bitcoin de fevereiro desse ano mostra como todas essas entidades – que incluiu nomes como Rental Coins, Interag Consultoria, Intertradec SA, Compralo Intermediação e a própria Intergalaxy Holdings – estão reunidas por um novelo de controle cruzado de acionistas, do qual o nome de Francisley se sobressai.

É desse bolo que nasceria a pirâmide financeira da Rental Coins, que logo atrair milhares de clientes com uma agressiva propaganda enganosa.

A Rental Coins promovia um suposto serviço de aluguel de criptoativos com pagamento de remunerações mensais que poderiam alcançar até 20% do capital investido.

Alegando vasta experiência no mercado de tecnologia e criptoativos, ele teria iludido os clientes informando possuir uma grande equipe de traders que realizariam operações de investimento com as criptomoedas alugadas e, assim, gerariam lucro para suportar o pagamento dos rendimentos.

Todas as promessas de investimento, no entanto, seriam uma farsa. Em reportagem do Fantástico exibida no último domingo, o delegado da Polícia Federal, Filipe Hille Pace, apontou que o esquema de Francisley era uma pirâmide clássica: não havia nenhum investimento, apenas dinheiro de novos clientes pagando os antigos.

“Não existe qualquer registro de que os valores ingressavam e eram realizadas operações de trading, de investimento em criptomoedas. O que reforça indícios que confirmam a prática dessa fraude, de que ele não investia o dinheiro das vítimas”, conclui o delegado.

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O Sheik e os outros membros da organização são acusados de praticar crimes contra a economia popular e o sistema financeiro nacional, de estelionato, de lavagem transnacional de dinheiro e de formação de organização criminosa.

Deus acima de todos

Em seu blog, Francisley fala extensivamente sobre religiosidade e Deus. O homem investigado pela Polícia Federal diz ser iluminado com dons como uma retórica clara mesmo em uma língua que não domina.

“Uma pergunta que as pessoas fazem bastante para mim é como eu consigo me comunicar tão bem com outras pessoas de outros países, sendo que eu tenho apenas meu português e espanhol fluente. Bom, meu inglês é muito ruim, mas quando eu subo em um palco para fazer alguma apresentação, parece que Deus entra ali e tudo flui”.

O autor afirma que passou por um momento de humildade e teve chance de rever seus erros em 2019 e que isso o fez parar de cometer deslizes – mesmo que as provas da Polícia Federal e Sasha mostrem outro lado dessa moeda.

“Nesse último ano Deus fez eu olhar pra mim mesmo, olhar meus erros e reconhece-los e percebi que ao invés de assumir que errei, preferi situar as condições, enumerar as circunstâncias, explicar todo o contexto e no fim das contas, me coloquei como vítima da situação. Mas quando assumi meus erros, abri os olhos para compreender os motivos que me levou a errar, pude evitar de errar novamente”, afirma.

Foto de Francisley sendo batizado publicada em seu blog (Foto: Reprodução/Medium)

Ironia nos conselhos

Não é só de trajetória pessoal e Deus que Francisley trata em seu blog. Em outras publicações, ele busca falar sobre criptomoedas e blockchain para leigos.

Curiosamente, o Sheik dá um conselho sensato ao seus leitores. Ressalta que o Bitcoin foi criado para ser uma moeda, mas que com o tempo virou uma forma de investimento e que isso apresenta riscos.

“As criptomoedas como o Bitcoin foram criadas inicialmente para serem utilizadas como moeda, então elas não são um tipo de investimento, mas as pessoas a usam como tal, mesmo tendo um grande risco, devido a constante oscilação do valor”, diz.

E o Sheik vai além: “Como elas não tem um órgão regulador a flutuação da moeda e muito grande, hoje a moeda está super valorizada, mas amanha ela poder ter uma queda muito grande”. Os clientes da Rental Coins que o digam.

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