Com a proliferação dos relatórios de mercado analisando diferentes setores e teses de investimento cripto, como as “Crypto Theses” do Messari e “The Year Ahead” da Pantera Capital, me senti na obrigação de selecionar alguns temas recorrentes entre eles e tentar oferecer uma interpretação mais leve e didática do que aconteceu em 2022 e o que pode vir em 2023.
Lá vai o experimento:
1. “It was the best of times, it was the worst of times”.
2022 foi um ano de agitação. Até para a norma cripto. Corretoras renomadas internacionalmente foram à falência por fraude descarada (FTX), um dos principais projetos cripto explodiu por uma falha nos seus modelos econômicos (Luna), instituições de crédito se encontraram descobertas por terem realizado empréstimos com colaterais insuficientes ou de qualidade duvidosa (Genesis, BlockFi, Celsius) e, para coroar o ano de 2022, praticamente todos os criptoativos em existência tiveram uma desvalorização significativa.
Mas, antes que me acusem de uma visão absolutamente apocalíptica, também podemos destacar alguns dos acontecimentos positivos do mercado em 2022, como a aprovação da regulamentação de cripto no Brasil (Lei 14.478/22), a entrada de instituições de relevância no mercado tradicional em cripto (Fidelity em custódia, JP Morgan com experimentos em DeFi) e a intensificação dos ativos digitais (NFTs) na estratégia de empresas criadoras de tendências (Starbucks, Reserva, Meta, Nike, Reddit, NBA).
Além disso, independente dos eventos efêmeros que vivemos (coloco nesse balde desde a quebradeira em dominó de players relevantes até cenário global de juros alto reduzindo espaço para ativos de risco), é inegável o avanço dos fundamentos nos principais protocolos… só para dar uma palinha:
O Bitcoin (BTC) continua funcionando os 365 dias do ano, 24 horas por dia todos os dias, sem intermediários centralizados, transferindo mais US$ 100 trilhões (com T) desde sua primeira transação em 2009, de acordo com dados da Glassnode.
O segundo maior criptoativo, Ethereum (ETH), realizou uma das maiores transformações tecnológicas da história do mercado, ao alterar sua forma de validar transações no processo conhecido como “The Merge“.
Pulando o tecniquês, isso gerou uma redução de mais de 99% da energia consumida e possibilita que soluções de escalabilidade destravem ainda mais casos de uso em cima da rede ao aumentar as transações por segundo de uma maneira barata e sem comprometer a segurança da rede.
Mercado bear (em baixa) é visto como sinônimo de foco em construção pelos principais participantes do segmento. Atualmente, temos mais de 16.102 aplicações descentralizadas (Dapp Radar) e vimos um crescimento de 453% nos contratos inteligentes na rede do Ethereum, segundo a Alchemy. People are building.
2. Confiança abalada em soluções centralizadas ressaltam uma das propostas de valor do mercado. Mas, experiência do usuário (UX) continua sendo um desafio (marcando o 14º ano seguido em que UX é destacado como ponto de dor no segmento).
É difícil contra-argumentar que o colapso de instituições centralizadas não gere um questionamento sobre quais riscos ocultos estão sendo assumidos em uma relação entre usuário e prestador.
Mas, ao mesmo tempo, também não é fácil a defesa de que os serviços completamente descentralizados já estão no ponto de serem apresentados aos bilhões de usuários leigos; quantos aqui sabem o que é uma extensão de navegador para usar uma wallet não custodial? quantos aqui estão dispostos a perder absolutamente todos seus fundos se guardarem uma senha no lugar errado?
Para mim, uma das maiores tendências voltadas para massificação cripto em 2023 é a abstração da conexão entre usuário e atividade-fim de protocolos.
O usuário médio não precisa necessariamente saber que está usando um projeto de finanças descentralizadas (MakerDAO) na camada 2 (Optimism, Arbitrum) de uma plataforma de contrato inteligente (Ethereum) para tomar um empréstimo usando uma carteira não custodial (Metamask) e tendo que lidar com operações em nomenclaturas que desconhece completamente (gwei, limite de gás, taxas no token nativo, sem conexão direta com reais, bridges entre as camadas, entre outros).
Me arriscando a fazer uma generalização, esse usuário gostaria apenas de (i) ver uma das menores taxas de empréstimo do mercado; (ii) de receber juros em dólar para se proteger de sua moeda fraca local ou, ainda, (iii) interagir com um bem de consumo digital da sua marca favorita.
Claro, existem os cripto-raiz veteranos que geram uma chave privada numa sala a vácuo em um bunker militar, registram em dezenove placas de ferro industrial e escondem em localizações protegidas e distribuídas desde a savana africana aos picos remotos dos himalaias orientais. Esses já estão bem servidos.
Mas, para os demais, vejo cada vez mais o uso de “portais” entre o que querem fazer no mundo e seu nível de sofisticação, ao ponto de talvez nem termos mais que nos referir ao termo “wallet” como um ser apartado da nossa vida, e sim como uma infraestrutura invisível do nosso dia a dia.
Não vemos diretamente. Mas, nos possibilita acessar uma boa parte do que o universo cripto tem a oferecer sem nem mesmo saber que se trata de cripto.
Sobre o autor
Lucas Pinsdorf é responsável por novos negócios no Mercado Bitcoin desde 2017, teve participação no lançamento dos primeiros ativos alternativos digitais brasileiros. No passado, participou de operação de gestão de ativos alternativos e trabalhou no Pinheiro Neto Advogados. Se formou em Direito pela USP.
Já pensou em inserir o seu negócio na nova economia digital? Se você tem um projeto, você pode tokenizar. Clique aqui, inscreva-se no programa Tokenize Sua Ideia e entre para o universo da Web 3.0!