Bitcoin
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Recentemente, você pode ter visto parte do drama destrutivo e insalubre envolvendo a “comunidade” de bitcoiners sobre quem é — e quem certamente não é — um “maximalista”.

Um maximalista de bitcoin (BTC) é uma pessoa que tem muitos investimentos no ativo e acredita que o bitcoin é a única criptomoeda digna de importância e que todas as outras são, se não forem golpes, distrações desse projeto valioso e arrasador.

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O propósito desse projeto continua sendo o foco de um intenso debate no mundo maximalista: Existem teóricos monetários que acreditam que a “rigidez” natural do bitcoin garanta seu status futuro como uma reserva de moeda global; outros que acreditam que deve servir apenas como um amortecedor contra a interferência governamental na oferta monetária; outros que consideram o ideal “cypherpunk” da resistência à censura como o caso de uso aniquilador e menosprezam outras criptomoedas principalmente porque dependem de uma arquitetura inferior de segurança.

É o primeiro grupo, dos teóricos da “moeda forte” — conhecidos como “toximaxis” devido à sua tendência de serem agressivos no Twitter com qualquer um que não compartilhar da mesma opinião — que estão em crise neste momento.

Mais recentemente, estavam discutindo com um possível ex-aliado, o capitalista de risco e ensaísta Nic Carter, após ele revelar no Twitter que seu fundo, o Castle Island Ventures, havia investido em uma empresa que estava desenvolvendo uma funcionalidade de log-in baseada em carteira e que não tinha envolvimento com o bitcoin.

Os maximalistas ficaram furiosos com a suposta traição de um grande defensor. Carter publicou um artigo no Medium e chamou o maximalismo de “doença” para, em seguida, foi visto fraternizando (de forma irônica) com um temido não investidor em bitcoin. Foi tudo muito infantil e constrangedor.

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Obsessão

Mas essa não foi a primeira vez que um grande bitcoiner — que Carter ainda afirma ser — quis se distanciar de um movimento cuja obsessão com a pureza continua custando o apoio de pessoas influentes que, por outro lado, seriam aliados naturais.

O grupo está sempre afastando possíveis parceiros de jornada: Os tuiteiros Udi Wertheimer e Hasu fugiram com nojo há um tempo e o ex-herói bitcoiner Nassim Taleb chegou a remover seu prefácio a um artigo de economia e maximalista.

Outros suavizaram sua retórica. Alex Adelman, CEO do aplicativo de recompensas para compras feitas apenas com bitcoin Lolli, agora se considera um “otimista de bitcoin” e elogiou a cultura do setor de tokens não fungíveis (ou NFTs, na sigla em inglês) durante o evento NFT NYC. Já o fervoroso ex-maxi Dan Held afirma ser um “maismalista” — ou alguém que acredita muito no bitcoin, mas não despreza outros projetos.

Também existe a lista de pioneiros de bitcoin que há muito tempo aderiram à abordagem multiconfessional às criptomoedas, como Erik Voorhees, Roger Ver e Jesse Powell. E também existem os pragmáticos, como Carter e Anthony Pompliano, que são craques em irritar a vanguarda fanática do bitcoin — até que esta se volta contra eles.

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Também existe um consenso de que o projeto do maximalismo de moeda forte está se autodestruindo, e que existe uma maçã podre no meio. É importante mencionar que muitos do próprio grupo principal, incapazes de resistir a uma oportunidade atrativa de mercado, acolheram projetos que teriam chocado os mais virtuosos.

Por exemplo, outro ex-maximalista, Eric Wall, me* contou que deixou o movimento quando grandes nomes se tornaram “cada vez mais hostis” ao seu interesse em blockchains de segunda camada do Bitcoin chamadas de “drivechains” — uma forma de explorar a “funcionalidades de altcoins”, como contratos autônomos e corretoras descentralizadas (ou DEXs) via Bitcoin.

Os planos de uma drivechain foram abandonados por motivos técnicos desconhecidos e Wall migrou de foco.

“É assim que eu saí do maximalismo”, explicou. Foi “a realização de que a camada-base do Bitcoin não iria alimentar essas funcionalidades interessantes que vemos em outras blockchains, como a tecnologia de conhecimento zero (ZKP) para a escalabilidade e privacidade, por exemplo”.

Ironia

A ironia é que essas mesmas pessoas, principalmente funcionários da grande desenvolvedora Blockstream, depois criaram a Liquid — uma rede “sidechain” (paralela) do Ethereum que permite a venda de tokens e Finanças Descentralizadas (ou DeFi) na blockchain do Bitcoin —, um serviço que era justamente o que Wall procurava.

Quando o Ethereum estava bombando em 2021, a Blockstream claramente queria participar da festa, promovendo uma série de lançamentos NFT na plataforma conforme a popularidade do mercado NFT só subia.

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A Liquid ainda não ganhou força. Grande parte dos blocos da Liquid tem, em média, uma transação: O minerador pagando pelo privilégio de verificar o bloco. O fracasso é resultante de “uma falta de compreensão por humanos”, explicou Wall.

Ele acrescentou que os desenvolvedores da Liquid, cegos pela aliança ao Bitcoin, falharam em levar algumas “tolices” em consideração, como a experiência de usuário (ou UX) e a adequação do produto ao mercado.

“Você precisa entender os humanos para entender por que a Liquid não é atrativa. A Blockstream só se importou com seus próprios argumentos, que não é a forma como você deixa um impacto no mundo.” A Blockstream não respondeu ao pedido por comentários.

Da mesma forma, nos últimos anos, maximalistas apoiaram plataformas que permitem a venda de tokens desenvolvidos no Bitcoin e muitos defendem stablecoins centralizadas, como tether (USDT), reconhecendo seu papel em garantir a capitalização e liquidez do bitcoin.

O apoio interminável à implementação do bitcoin como moeda corrente em El Salvador pelo autoritário presidente Nayib Bukele foi um espetáculo particularmente incômodo.

Surge a seguinte pergunta: Os maximalistas ficam felizes demais em contrariar seus ideais quando a oportunidade aparece? Os altos ganhos feitos em outro lugar do mercado cripto os corrompe tão facilmente?

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Pete Rizzo, ex-editor da CoinDesk e que agora trabalha na corretora cripto Kraken e se identifica como maximalista (apesar de ser de um tipo diferente), me disse que nenhum dos aspectos acima constituíam uma “podridão” ou traição aos princípios: Para ele, tokens, NFTs e stablecoins não eram o problema.

Em vez disso, ele disse que o perigo apresentado a investidores do varejo são as ofertas não reguladas de valores mobiliários em plataformas como o Ethereum.

“A crítica não é que tokens além do bitcoin sejam inerentemente ruins, e sim que são estruturados de uma forma onde a responsabilidade é dos investidores do varejo”, explicou.

NFTs foram criados na plataforma de Bitcoin Counterparty, acrescentou ele (sim, é verdade!), e a tentativa em integrá-los ao Bitcoin não é uma grande heresia. “O maximalismo de bitcoin apenas afirma que o bitcoin é a única criptomoeda descentralizada”, disse ele.

“É a única cujo acúmulo de valor e cuja operação acontecem de maneira uniforme, então é melhor se empenhar em criar todas as coisas de volta no Bitcoin (seja lá quanto tempo isso demore) com o objetivo final de trazer o máximo possível [à rede].”

Porém, o testemunho de Rizzo a uma abordagem fundamentada bastante em princípios é difícil de conciliar com a realidade dos diversos projetos paralelos dos maximalistas: Seu apoio, por exemplo, à tether, que é operada no Ethereum e, historicamente, não é muito honesta com seus investidores do varejo, ou exemplos importantes em que maximalistas não integraram a inovação com a qual estão envolvidos à rede Bitcoin.

Quem consegue esquecer, por exemplo, a vez em que o ex-Blockstream Samson Mow, um dos maiores críticos de Carter em junho, apoiou — olha só — um token desenvolvido no Ethereum!

Rizzo argumentou que aquele token só estava acessível para investidores qualificados e não era um risco a investidores do varejo, mas é preciso perguntar: Até onde esses limites são impostos?

É sobre valorizar o caso de uso do bitcoin acima de todo o restante? Ou tem a ver com garantir que qualquer inovação só seja implementada no Bitcoin? Ou que o varejo não seja prejudicado? E aquele país que foi prejudicado com o fracassado “título de Bitcoin” de Bukele?

Promessas

Na sequência, existe o excesso de promessas e modelos bizantinos de previsão que, um após o outro, resultaram em nada: O célebre modelo “stock to flow”, o tão hypado “halving”, o bitcoin como uma “proteção contra a inflação”, como “dinheiro digital” — cada um foi abandonado quando as previsões não foram precisas.

Outros supostos princípios maximalistas, como a aversão à interferência do Estado, também são descartáveis: Recentemente, maxis, incluindo o bilionário Michael Saylor, pediram que reguladores desligassem redes adversárias, como o Ethereum, mesmo que tentem lucrar com suas imitações.

É preciso pensar no que realmente é o maximalismo — se é que significa alguma coisa. Na opinião de Rizzo, a atual estirpe de maximalismo de moeda forte pouco tem a ver com o etos anarcocapitalista e de livre mercado que surgiu com o movimento.

Rizzo observa que muitos dos libertários mais ferrenhos do bitcoin, como Ver e Voorhees, saíram há muito tempo com a implícita intenção de buscar outras oportunidades.

Quem sobrou adotou um estilo de vida quase teológico da ideologia despida do libertarianismo e suas tentações, traficando óleos de semente, aderindo a dietas cetogênicas e vivendo com suas “esposas tradicionais”. Claramente, também negociam nos amplos mercados cripto — mas apenas sob uma série de justificativas obscuras.

No máximo, essa parte específica de “maximalismo” agora é uma ideologia desgastada — que se vende e se reformula com cada correção de mercado.

Assim como o grupo feminino Sugababes e sua troca de membros, a doutrina possui uma forma, mas nenhum conteúdo. É um ideal vazio que não sugere nada duradouro — rígido o suficiente para gerar devoção, mas volúvel o suficiente para sobreviver às inevitáveis traições de seus aderentes mais “tóxicos”.

É por isso que eu acredito que o maximalismo do bitcoin vai durar para sempre.

*Artigo por Ben Munster, ex-redator do Decrypt e responsável pela coluna “Zero Knowledge” (ou “Conhecimento Zero”) e que fala sobre o mercado cripto a partir da perspectiva de uma pessoa leiga na indústria.

**Traduzido por Daniela Pereira do Nascimento com autorização do Decrypt.co.

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