“O único meio de pagamento que o Banco Central reconhece é o Real”. Foi dessa forma que Mardilson Fernandes Queiroz, consultor do Banco Central do Brasil falou sobre a hipótese de as criptomoedas serem consideradas como meio de pagamento. Ele participou da audiência pública, que aconteceu na tarde de quarta-feira (11), na Câmara de Deputados.’
De acordo com Queiroz, não cabe ao Banco Central decidir “se um ativo pode ou não ser usado como meio de pagamento”. Ele sustentou que apesar de qualquer ativo poder ser usado entre as partes como forma de pagamento de algo, “por si só não caracteriza uma atividade regulada pelo Banco Central”.
Ele deu um exemplo de que uma pessoa pode até comprar um apartamento com título público federal se o titular do apartamento assim aceitar, mas isso não vincula o Banco Central em aceitar ou regular esse título como uma espécie de meio de pagamento.
Dilema das Criptomoedas
Segundo Queiroz, a criptomoeda não é meio de pagamento reconhecido no Brasil, pois o ordenamento jurídico já “delimitou o perímetro regulatório do Banco Central quanto aos pagamentos feitos por meio da moeda soberana”.
Essa visão do consultor do Banco Central, no entanto, não agradou muito o deputado federal Áureo Ribeiro (Solidariedade/RJ), que havia questionado o que faltava para o Banco Central regular as criptomoedas como meio de pagamento.
Queiroz ponderou afirmando que o debate sobre esse tema é de grande importância pois está sendo discutido no mundo todo.
Outra questão apontada foi a do Banco Central incluir as criptomoedas no balanço de pagamento do país. Queiroz esclareceu que assim como qualquer outro ativo que é transacionado entre fronteiras deve estar incluído no balanço de pagamento, não haveria razão de deixar as criptomoedas de fora, pois se trata de uma commodity que por sua própria natureza não é transacionada apenas dentro do país.
Ele ainda disse que essa não seria uma decisão apenas do Banco Central brasileiro, mas que se tratava de um padrão internacional instituído pelo Fundo Monetário Internacional (FMI).
“Os balanços de pagamento dos países seguem a recomendações internacionais e isso é padronizado pelo FMI”.
Além disso, Queiroz também falou dos impactos que a Libra pode trazer aos governos. A criptomoeda desenvolvida pelo Facebook tem trazido desafios para os Bancos Centrais do mundo inteiro, segundo o Consultor no Departamento de Regulação do Sistema Financeiro do Banco Central do Brasil.
Problema da Libra
A razão disso é que o advento da Libra, segundo Queiroz, “trouxe problemas de política econômica além de atingir o Sistema financeiro.Juntou uma stablecoins com os big techs (empresas gigantes que atuam no setor de tecnologia)”.
Ele afirmou que esse fato levou o G7 e o FSB (sigla em inglês para Conselho de Estabilidade Financeira) a criar “grupos específicos para discutir os potenciais riscos que essa junção de big techs e stablecoins podem trazer”.
De acordo com Queiroz, a Libra é apenas um exemplo e que existiriam outras criptomoedas do mesmo modelo, mas não citou qualquer outra. Ele disse que o Brasil tem participado de fóruns internacionais que buscam mapear esses riscos.
Caminho da regulação
Na visão dele, o resultado desses fóruns pode auxiliar a regulação no Brasil não só da Libra, mas também de outras criptomoedas semelhantes à ela.
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“No próximo ano deve sair um relatório específico desses fóruns internacionais em relação a essas iniciativas. Isso não quer dizer que parte das atividades que a plataforma Libra esteja querendo ofertar já estariam reguladas”.
O white paper da Libra ainda não traz clara definição em diversos aspectos, conforme mencionou Queiroz. Ele, no entanto, esclareceu que se a plataforma Libra passar a trabalhar com lastro no Real, sofrerá regulação do Banco Central como se fosse uma espécie de moeda eletrônica.
“Se tiver dentro da plataforma Libra movimento de tokens lastreados 100% em Real ofertados aqui no Brasil, ela deveria seguir a regra nossa de regulação para instituição de pagamento”, afirmou.
Autonomia dos bancos
Ao ser questionado pelo deputado federal Áureo Ribeiro (Solidariedade /RJ), autor do projeto de lei de regulação de criptomoedas, sobre encerramentos de contas de corretoras de critptomoedas, o representante do Banco Central apenas afirmou que o órgão não pode obrigar as instituições financeiras a manter contrato com quem quer que seja.
“Algumas instituições financeiras decidiram rescindir o contrato com empresas de criptomoedas. A instituição financeira não é obrigada a manter um relacionamento com pessoas”.
Queiroz apontou que a única obrigatoriedade dos bancos é de tão somente comunicar a Unidade de Inteligência Financeira – UIF (antigo coaf – conselho de controle de atividades financeiras) sobre as operações suspeitas.
Ele, no entanto, deixou claro que os bancos teriam total autonomia para decidir sobre os encerramentos das contas ao julgarem por si só algo suspeito.
“Ao verificar algo que ela entenda que está trazendo risco para atividade dela, por exemplo, em que ela é responsável pela prevenção de lavagem de dinheiro e combate ao terrorismo, ela pode decidir encerrar e isso é até recomendação do Gafi (Grupo de Ação Financeira contra a Lavagem de Dinheiro e o Financiamento do Terrorismo)”.
Quanto a regulação de criptomoedas por parte do Banco Central, Queiroz se limitou a dizer que não cabe ao órgão regular esses ativos, uma vez que elas não são não são moedas.
Presenças no debate
O debate foi presidido pelo deputado federal Luis Miranda (DEM/DF) e contou também com a participação de Natalia Garcia, Conselheira da Associação Brasileira de Criptoeconomia (ABCripto); de Ricardo Liáo, Presidente da Unidade de Inteligência Financeira (UIF).
O auditor-fiscal Paulo Antonio Espíndola González, Coordenador-Geral de Programação e Estudos (Copes), da Secretaria Especial da Receita Federal, também esteve presente no debate representando a Receita Federal e o Ministério da Economia.
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