As operações com criptomoedas terão de ser declaradas à Secretaria da Receita Federal a partir de agosto. Essa foi a regra trazida pela Instrução Normativa 1.888/2019, que já está em vigor, e trouxe com ela uma série de dúvidas dos usuários de criptomoedas.
A norma, antes de começar a vigorar já passou por uma alteração, que simplificou um pouco mais a vida do usuário. Agora não será mais preciso informar o endereço de carteira tanto de emissão quanto de recebimento da criptomoeda.
Mesmo assim, ainda há questões em torno dessa instrução normativa para os usuários de criptomoedas. Confira o que está em jogo:
O que é a norma da Receita Federal?
A instrução normativa 1.888/2019, como ela própria traz no seu artigo 1º, é uma norma que veio para tornar obrigatória a prestação de informações que sejam relacionadas a transações com criptomoedas.
Essas informações devem ser prestadas mensalmente à Secretaria Especial da Receita Federal do Brasil (RFB).
Ela é voltada só para corretoras de criptomoedas?
Não. Qualquer pessoa (jurídica ou física) que resida ou tenha domicílio no Brasil e que transacione fora de exchange de criptoativos “domiciliada para fins tributários no Brasil”, terá que declarar para a Receita essas operações.
Essa não é uma questão de fácil elucidação. O Código Tributário Nacional (CTN), traz essa definição sobre o que é “domicílio para fins tributários no Brasil”.
De acordo com o art. 127 dessa lei, o domicílio fiscal será “quanto às pessoas jurídicas de direito privado ou às firmas individuais, o lugar da sua sede, ou, em relação aos atos ou fatos que derem origem à obrigação, o de cada estabelecimento”.
Esse dispositivo da instrução normativa da Receita Federal, no entanto, deve ser lido com muita cautela. Márcio Ávila, professor de Direito Tributário Internacional nos cursos de mestrado da PUC-Rio, Ibemec e Universidade Federal Fluminense (Uff), alerta que “tudo irá depender se a pessoa está negociando com a empresa fora do país ou com um escritório dela no Brasil”.
Tenho mais de R$ 30 mil em bitcoin. Devo declarar todas as operações que eu fizer à Receita Federal?
Não necessariamente. A Instrução Normativa nesse quesito não abre margem para outra interpretação senão a de que “as informações deverão ser prestadas sempre que o valor mensal das operações, isolado ou conjuntamente, ultrapassar R$ 30 mil”.
Essa prestação de informação por parte dos usuários, contudo, somente devem ocorrer nos casos em que elas transacionarem com exchanges com domicílio fiscal fora do Brasil ou no caso em que elas negociarem com outras pessoas sejam físicas ou jurídicas (desde que essas não sejam exchanges).
Assim, mesmo que o usuário tenha mais de R$ 30 mil em Bitcoin ou em qualquer outra criptomoeda, ele só terá de declarar as operações que ultrapassem esse valor num determinado mês.
Em outras palavras, caso a pessoa tenha R$ 40 mil em uma criptomoeda, tenha transacionado em abril R$ 20 mil e no mês seguinte R$ 15 mil, ela não terá de informar essas operações.
A Receita Federal, por meio de sua assessoria de comunicação, esclarece à reportagem que “a IN RFB nº 1.888, de 2019, não impacta os investidores de criptoativos, ela é uma declaração prestada majoritariamente pelas exchanges”.
Qual é a diferença entre essa declaração e o chamado ganhos de capital?
Segundo a Receita Federal, uma coisa não deve ser confundida com a outra:
“Essa declaração é informativa, portanto, não substitui a Declaração de Ganhos de Capital, aplicável a qualquer contribuinte que obtenha ganhos na alienação de ativos.”
Assim, se pessoa transacionou mais de R$ 30 mil num determinado mês fora de exchange com domicílio fiscal no Brasil, terá de a partir de agosto, prestar informação mensal dessas operações independentemente se houve lucro ou não nessas operações.
Outra caso é se ela transacionou mais de R$ 35 mil num determinado mês, dentro ou fora de exchange brasileira e obteve lucro. Nesse caso, essa pessoa terá de pagar tributo sobre o percentual daquilo que foi ganho.
Emília Malgueiro, diretora legal & Compliance do Atlas Quantum, explicou como funciona a tributação sobre ganhos de capital:
“Os ganhos obtidos com a alienação de moedas virtuais (bitcoin, por exemplo) cujo total alienado no mês seja superior a R$ 35 mil são tributados, a título de ganho de capital, segundo alíquotas progressivas estabelecidas em função do lucro, e o recolhimento do imposto sobre a renda deve ser feito até o último dia útil do mês seguinte ao da transação”.
As alíquotas sobre o ganho de capital são escalonadas e partem de 15%, para lucros abaixo de R$ 5 milhões; indo até 22,5%, nos casos dos ganhos que ultrapassem os R$ 30 milhões.
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O fato, contudo, é que a declaração das operações feitas por usuários de criptomoedas não tem ligação alguma com aquilo que é informado para fins de ganhos de capital.
Quais as operações com criptomoedas que eu tenho de informar à Receita Federal?
Todas. A instrução normativa traz no parágrafo 2º do artigo 6º, um rol exemplificativo. Além de elencar transações como compra e venda; permuta; doação e dação em pagamento; esse dispositivo traz no inciso IX, “outras operações que impliquem em transferência de criptoativos”.
O que devo informar nessas declarações e como devo informar?
A Receita Federal procura, por meio dessa declaração, saber quem participou da transação (seja outra pessoa ou uma exchange no exterior), que tipo de operação foi essa, o dia exato em que ela ocorreu, quais criptomoedas foram operadas, o valor da transação separado do valor das taxas de serviços cobrados para que essa operação ocorresse.
Vale mencionar que os valores devem ser informados em real. Caso a pessoa tenha transacionado numa moeda que não seja o dólar americano, terá primeiramente que converter o valor da moeda cotado no dia da transação para o dólar americano e depois fazer essa cotação para a moeda nacional, conforme explica o art. 4º da IN 1.888/2019.
A pessoa na hora de prestar essas informações terá de tomar cuidado na forma que deverá apresentar a quantidade das criptomoedas operadas, quando se tratar de fração delas.
Esse ponto foi, inclusive, questionado pelas associações brasileiras do setor.
A Receita Federal respondeu que “a instrução normativa interpretada conjuntamente com os manuais publicados pela Receita Federal é clara no sentido de acrescentar 10 casas decimais para o reporte de criptoativos. No caso de reais, o reporte deve ser realizado até a segunda caso decimal com regras de arredondamento utilizadas pela ABNT”.
Um outro detalhe é que as informações deverão ser prestadas com a utilização do sistema Coleta Nacional, disponibilizado por meio do Centro Virtual de Atendimento (e-CAC) da RFB, em leiaute que foi definido pela Receita.
Até quando eu tenho que declarar?
A pessoa tem de apresentar essas informações até às 23h59min59s (horário de Brasília) do último dia útil do mês que subsequente àquele em que ocorreu o conjunto de operações com criptomoedas.
O primeiro conjunto de informações a ser entregue em setembro de 2019 será referente às operações realizadas em agosto de 2019, conforme consta na norma.
O que acontece se eu não declarar no prazo ou se cometer algum equívoco nessa declaração?
Caso a declaração não seja apresentada com exatidão, a pessoa terá de corrigir esses erros ou omissão sobre alguma operação antes que o órgão inicie qualquer procedimento para não ter de pagar nada à Receita.
Tanto a declaração fora do prazo quanto a sua apresentação contendo algum erro traz para a pessoa a incidência de multa.
As multas aplicadas pela Receita diferem a depender da situação. Caso a pessoa deixe de apresentar a declaração no prazo, terá de pagar se for pessoa física R$ 100 por mês ou fração do mês; se pessoa jurídica em início de atividade, imune ou isenta, optante pelo Simples Nacional, a multa será de R$ 500. Já as demais pessoas jurídicas pagarão R$ 1.500.
Ainda que essa pessoa declare antes de a Receita promover qualquer ato de ofício, ela terá de pagar algo. No entanto, ela será reduzida a metade.
A multa para qualquer espécie de inexatidão na declaração, entretanto, será da seguinte forma: Em caso de pessoa jurídica, é de 3% sobre o valor, não inferior à R$ 100, da operação omitida ou apresentada com erro. Já a pessoa física arcará com 1,5% sobre o valor da operação omitida na declaração ou apresentada com algum equívoco.
A receita irá intimar a pessoa para corrigir o erro ou “para prestar esclarecimentos nos prazos estipulados pela autoridade fiscal”. Se após isso, a pessoa não cumprir o que estiver estabelecido pelo órgão terá de arcar com R$ 500 por mês.
No caso de pessoa jurídica optante pelo Simples Nacional, esse percentual será de 70% sobre a multa.
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