Criptomoeda da Venezuela é uma farsa, mostra reportagem da Reuters

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Desde que foi anunciada, a criptomoeda da Venezuela Petro já tem feito história, mas não por ser considerada uma arma do ditador Nicolás Maduro para acabar com o fracasso econômico que ele mesmo criou, mas por ser uma criptomoeda que teria como lastro 5 milhões de barris de petróleo.

Há um problema grave, contudo. Uma reportagem da publicada pela Reuters foi até a região onde estariam armazenados o petróleo e não encontrou nada.

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No entanto, na cidade de 1.300 habitantes de Atapirire, indicada por Maduro como seria a área de 380 km² onde estariam os mais de 5 milhões de barris de petróleo que vão apoiar a criptomoeda.

Os moradores de Atapirire, que fica em uma savana isolada em Francisco de Miranda, no centro do país, disseram não haver indícios de exploração das supostas reservas de petróleo. Eles também mostraram pouca esperança de que o vilarejo possa se tornar um lugar privilegiado com as mudança anunciadas pelo governo.

“Não há sinal desse petro aqui”, disse a moradora Igdalia Diaz à reportagem da agência de notícias. 

A dona de casa de 35 anos não hesitou em contar ao repórter das dificuldades que eles têm passado e que tudo que tem está sucateado por responsabilidade do governo, como escolas, ruas, falta de energia e, principalmente, alimentação.

“Eles passam fome”, revelou a Reuters, que durante quatro meses conversou com especialistas em criptomoeda e avaliação de petróleo, viajou ao local das reservas prometidas e investigou registros de transações da Petro.

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A professora Rosa Alvarez, que disse ter sido ‘instruída’ pelo governo a ensinar sobre a Petro a seus alunos, revelou que metade das crianças de primeiro grau pararam de ir às aulas porque sentiam fome. A escola não oferecia mais comida com verba estatal.

“Como explicarei isso a eles se ninguém me diz o que é uma Petro, como eu a compro e com o quê?”, desabafou a professora.

“É difícil encontrar o petro em qualquer lugar”, notou a reportagem. E a busca revelou que todo esse espetáculo na mídia em torno da Petro, por enquanto, não passa de ilusão. A criptomoeda não é vendida em nenhuma grande casa de câmbio, muito menos foram encontrados comércios que a aceite.

Os únicos ‘entusiastas’ localizados foram aqueles que participam de fóruns relacionados a criptomoedas na internet, obviamente mais fáceis de serem encontrados, porém nenhum deles quis se identificar.

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Um deles, segundo a Reuters, se queixou de ter sido “ludibriado”. Outro revelou que recebeu suas petros sem problema, e culpou as sanções e a imprensa por prejudicarem o lançamento do criptoativo.

No entanto, Hugbel Roa, ministro da Ciência e Tecnologia envolvido no projeto, disse à reportagem que a tecnologia por trás da moeda ainda está em desenvolvimento, ninguém ainda fez seu uso e nenhum recurso foi recebido.

Após uma visita à agência do governo que supervisiona a Petro, a Superintendência de Criptoativos, notou-se que fisicamente o órgão ainda não existe, e isso foi confirmado com uma recepcionista no local indicado. O mesmo acontece com o seu site, que se encontra inacessível.

Muitos analistas ainda demonstram ceticismo em relação aos ‘milhões já arrecadados em moeda real’ que Maduro tem dito e insistido, mas, desde que a Petro foi anunciada, o governo venezuelano não ofereceu nenhuma transparência dessas negociações, o que impede informações verídicas.

O governo da Venezuela não oferece um registro transparente de compras e só mostra o movimento de petros entre contas, não permitindo que se determine por quanto a criptomoeda foi vendida ou se elas realmente trocaram de mãos.

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“Não encontramos nenhuma evidência de que alguém tenha emitido uma petro, nem que tenha sido negociada ativamente em nenhuma bolsa”, disse à Reuters, Tom Robinson, especialista em blockchain.

Em Atapirire, há poucas atividades ligadas à indústria petroleira. As únicas perfuradoras visíveis, segundo a reportagem, eram máquinas pequenas instaladas anos atrás e já envelhecidas, sendo que muitas delas, lamentavelmente, se encontravam cobertas pelo mato.

“Independentemente de quanto petróleo contenha, a área carece de infraestrutura crucial para sua extração, como estradas, oleodutos e geração de energia”, disse Francisco Monaldi, professor da Universidade Rice de Houston que nasceu naquela região.

“A Petro está sendo estabelecida com um valor arbitrário, que só existe na imaginação do governo”, escreveu Ramírez, que vive recluso em um local secreto, pois foi acusado por Caracas de corrupção, o que ele nega. A PDVSA foi questionada, mas não se manifestou.

Transações de Petros

Tudo o que é novidade tem seus prós e seus contras. Com a Petro não foi diferente, uns se empolgaram enquanto outros se sentiram enganados, como por exemplo, comprar e depois não conseguir transferir ou vender, ou também a demora na transação.

No White Paper da Petro diz que a principal plataforma para a moeda é a NEM (detentora do token XEM) e que ela é descentralizada e que os proprietários das contas são anônimos, mas podem se revelar, se desejarem, por meio de uma descrição.

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De acordo com a Reuters, em março, uma conta NEM supostamente operada pelo governo de Maduro, emitiu 82,4 milhões da Petro como Oferta Inicial de Moeda (ICO), que, aparentemente, foi descrita no documento do projeto.

Cerca de 2.300 unidades de petro foram transferidas para 200 contas anônimas, que podem ser dos primeiros entusiastas, pois o período das transações condiz com os de relatos de compras no fórum Bitcointalk.

Em abril, outra conta anônima emitiu uma série de petro — descrita como uma fase para grandes investidores — e, em junho, essa mesma conta transferiu cerca de 13 milhões de unidades para mais de dez contas contas anônimas.

Estas transações resultou num valor de aproximadamente US$ 850 milhões, mas não há, contudo, como provar que foi uma venda, pois nenhum grande investidor se manifestou em estar apoiando o projeto.

O ministro Roa, que também é supervisor do Observatório Venezuelano de Blockchain, parece ser conivente com a ideia de que a Petro ainda não existe como moeda funcional. 

Contudo, o que ficou claro, segundo a Reuters, é que a Petro não é negociada em nenhuma grande casa de câmbio, o que também condiz com anúncios de grandes exchanges, como a Bitfinex, por exemplo, que após relutar na aceitação da criptomoeda, acabou banindo o criptotivo venezuelano de sua plataforma, temendo que as sanções dos Estados Unidos aplicadas ao país sul-americano pudessem prejudicá-la.

Outras gigantes no mercado de criptomoedas, como Coinbase  e Kraken e Bittrex, simplesmente ignoraram e nem sequer se manifestaram sobre o projeto de Maduro, que, em abril, anunciava 16 casas de câmbios certificadas e habilitadas que já se encontravam em operação com a Petro, mas nenhuma de grande expressão.

A única corretora que debateu publicamente planos para listar a Petro foi a indiana Coinsecure, que, por meio de seu diretor-executivo, Mohit Kalra, revelou uma parceria para negociar a Petro — lembrando que a Índia não tem planos para importar o petróleo venezuelano e pagar com a criptomoeda.

Petro e Venezuela

A Petro foi anunciada pela primeira vez no início de dezembro de 2017 por Nicolás Maduro como uma forma de contornar as sanções dos EUA, em meio a uma crise econômica e hiperinflação da antiga moeda oficial, o Bolívar.

Na ocasião, Maduro disse que a criação da criptomoeda era para que o país avançasse em matéria de soberania monetária, realizasse transações financeiras e, assim, vencer o bloqueio americano.

Maduro ordenou, então, que as empresas estatais usassem a criptomoeda para compra e venda de produtos e serviços — elas deviam realizar uma porcentagem de suas vendas e compras em Petro.

Recentemente o governo mudou o Bolívar para o Bolívar Soberano, que agora é a moeda oficial venezuelana, e cortou cinco zeros na conversão. Maduro, em seu anúncio, disse que as alterações mudarão as finanças do país “de forma radical”.


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