No último sábado (13), outra grande aquisição de token não fungível (ou NFT, na sigla em inglês) foi “hypada” nas redes sociais. O CryptoPunk nº 5.822, um “alienígena”, foi vendido por 8 mil ETH, equivalentes a US$ 23,7 milhões.
O NFT foi adquirido por Deepak Thapliyal, CEO da Chain e que, anteriormente, havia ganhado notoriedade por pagar US$ 4,5 milhões por um NFT “Mega Mutant Serum” no início de janeiro deste ano.
No Dirty Bubble Media, o mantra é “siga o dinheiro”. Neste caso, a trilha à blockchain leva para um CEO misterioso, uma empresa de tecnologia blockchain ressuscitada e um token de “US$ 10 bilhões” que, provavelmente, não vale nada.
Seguindo o dinheiro
Anteriormente, grandes aquisições por Thapliyal eram financiadas por transferências simples da corretora FTX diretamente à sua carteira.
No entanto, o dinheiro do CryptoPunk nº 5.822 veio de uma série complexa de transações envolvendo diversas carteiras, corretoras e a plataforma de Finanças Descentralizadas (ou DeFi) Compound. As transações começaram em 21 de janeiro com a carteira “Chain Team 2” (“CT2”):
– no dia 21, US$ 70 milhões na stablecoin USC foram transferidos da corretora Bittrex à “CT2” em 17 parcelas;
– em seguida, “CT2” transferiu US$ 70 milhões de USDC à FTX;
– FTX enviou de volta 8.307 ETH, equivalentes a US$ 20 milhões na época;
– diversas conversões em um contrato criado pela corretora descentralizada (ou DEX) 1inch acabaram enviando mais 12.746 ETH à “CT2”.
No sábado (12), “CT2” enviou 20 mil ETH à carteira do CEO da Chain Deepak Thapliyal (“deepak.eth”). Dois minutos depois, “deepak.eth” transferiu todos os 20 mil ETH ao protocolo DeFi Compound.
Em seguida, pegou US$ 25 milhões em USDC emprestado do Compound, enviado ao mesmo contrato da 1inch que “CT2” havia interagido anteriormente. O contrato convertou US$ 25 milhões por 8 mil ETH. Por fim, “deepak.eth” adquiriu o CryptoPunk nº 5.822 por 8 mil ETH do Larva Labs.
Como sempre, as transações em blockchain nos geram mais perguntas do que respostas. Quem é Deepak Thapliyal? O que a Chain faz para ganhar esse tipo de dinheiro? E por que a Bittrex enviou US$ 70 milhões à Chain para serem usados em aquisições de NFT?
Deepak Thapliyal, CEO de lugar nenhum
É bem fácil encontrar muitas informações sobre executivos de empresas como a Chain. Geralmente, haverá um texto no site da empresa, uma página no LinkedIn, vídeos no YouTube, artigos citando suas declarações etc.
No entanto, Thapliyal não entra nessa tendência. Não há páginas no site chain.com que falam sobre sua liderança e não foi possível encontrar uma página dele no LinkedIn.
Só foi identificado em um artigo recente que o cita e existe um vídeo no YouTube (publicado pela Chain). Sua conta verificada no Twitter ficou ativa em novembro de 2021; foi renomeada para “This_That_Vip”:
Então, segundo a internet, o desconhecido sr. Thapliyal surgiu do nada em novembro de 2021 quando se tornou CEO da Chain… Agora, é hora de analisar a Chain.
Anteriormente uma gigante empresa cripto, Chain é uma casca de sua antiga versão
Fundada em 2014, Chain foi criada para desenvolver soluções em blockchain para clientes comerciais. Chain recebeu financiamento de múltiplas grandes corporações, incluindo Visa e Citibank.
Em 2018, foi adquirida pela Stellar Development Foundation por cerca de US$ 500 milhões. No entanto, Chain foi “readquirida” em seguida por partes desconhecidas em 2021. Essa reaquisição incluía o nome da Chain, mas não parecia ter incluído a propriedade intelectual da empresa.
Uma quantidade significativa de espaço no site chain.com enfatiza os prévios sucessos da empresa antes de ser adquirida pela Stellar. O site não apresenta nenhum dos executivos ou investidores dessa nova empresa.
Agora, a Chain oferece “Sequence”, um serviço privado de blockchain que parece similar ao conceito original no qual a Chain havia sido criada. Sequence ainda está sob desenvolvimento, segundo o novo site da Chain.
A empresa também emitiu um novo token cripto chamado “Chain” (CHN), apresentado como um “utility token” usado para “descontos, acesso premium e pagamento por taxas comerciais”.
A descrição também afirma que CHN será um token de governança para “projetos fomentados pela comunidade”:
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Com base nessa informação, parece que Chain é uma nova empresa com grandes produtos ainda sendo desenvolvidos. Então de onde vem todo o dinheiro usado para aquisições de NFTs?
Por que a Bittrex deu US$ 70 milhões à Chain? Pode ter a ver com o CHN
O token CHN parece ser o único produto atualmente oferecido pela Chain, sugerindo que esse token possa ser a fonte principal de receita da empresa. CHN é negociado a US$ 100 por token, fazendo a capitalização de mercado do token chegar a US$ 10 bilhões.
No entanto, essa capitalização de mercado provavelmente não reflete o verdadeiro valor do CHN, conforme será descrito abaixo. Para entender o mercado do CHN, é importante avaliar quem possui CHN, quão concentrada é a propriedade e como é negociado em corretoras.
Primeiro, vamos examinar a distribuição de CHN. CHN é hiperconcentrada, pois as dez principais carteiras possuem 75% do fornecimento total.
Dessas dez carteiras, oito são controladas ou associadas à Chain. A corretora Bittrex é a quinta maior holder do CHN, com quase oito milhões de tokens:
Ao analisar carteiras menores de CHN, surge um padrão estranho: muitas dessas carteiras possuem quantidades quase idênticas de CHN e receberam seus tokens diretamente de carteiras controladas pela Chain.
Esse padrão sugere que grande parte dos holders de CNH são “carteiras-fantasma” – basicamente carteiras secretas que não estão ligadas a pessoas de verdade.
A atividade de negociação para CNH demonstra uma demanda relativamente baixa de mercado para o token, conforme o volume diário varia em apenas US$ 10 milhões ou 0,1% da capitalização de mercado do CNH.
CHN é negociado na Bittrex, BitMart e Uniswap, conforme a Bittrex registra 90% do volume negociado diariamente:
Apesar de ser um token pouco negociado e relativamente obscuro, o par CHN:USDT consegue ser o maior par negociado na Bittrex, totalizando mais de 12% do volume total da corretora:
De forma inesperada, parece que o token CHN possui a maior alocação na carteira da corretora Bittrex, com um saldo maior em dólares do que todos os outros token em sua carteira juntos…
Apesar de a corretora Bittrex contribuir 90% do volume diário do CHN, só houve 54 transferências do token CHN para e a partir da corretora.
O que é ainda mais preocupante é que essas transações aconteceram entre a Bittrex e apenas outras nove carteiras (a grande maioria está ligada diretamente à Chain).
Por fim, CHN demonstra padrões estranhos de negociação tanto na Bittrex como na BitMart, incluindo um volume anormalmente consistente e longos períodos sem volatilidade pontuada por grandes oscilações ocasionais no valor do CHN:
Juntos, esses dados sugerem que: 1) grande parte dos tokens CHN são controlados pela Chain; 2) provavelmente há pouca demanda verdadeira pelo CHN; e 3) o preço do CHN é manipulado, possivelmente com a ajuda de corretoras como a Bittrex.
Como sempre, a viagem pela blockchain nos gera mais perguntas do que respostas. Embora seja possível demonstrar uma relação próxima entre a Chain e a Bittrex, não se sabe a origem ou a extensão dessa relação.
Sabe-se que Thapliyal é um CEO esbanjador, mas sua origem e trajetória para se unir à Chain continuam misteriosas.
Também não se sabe por que uma empresa (que ainda está desenvolvendo seus principais produtos) enviaria US$ 70 milhões da carteira pessoal de seu CEO para comprar NFTs. Nem sabemos quem é dono da Chain…
Se a Chain estivesse desenvolvendo produtos para clientes, essas aquisições de NFTs poderiam ser consideradas como um golpe de publicidade. Porém, Chain afirma estar focando em soluções comerciais em blockchain bastante técnicas.
É difícil imaginar que uma empresa seja persuadida a firmar parceria com a Chain porque seu CEO gasta bastante com um CryptoPunk. No mínimo, deve ser considerada como um grande sinal de alerta.
Sobre o autor
MikeBurgersburg é um pesquisador anônimo que mora no centro-oeste dos Estados Unidos. O artigo acima foi originalmente publicado na newsletter Dirty Bubble Media.
*Traduzido e editado com permissão do autor por Daniela Pereira do Nascimento.