A dificuldade de mineração na rede do Bitcoin (BTC) voltou a aumentar na semana passada pela terceira vez consecutiva. A dificuldade agora subiu 2,18%, para 52,35 trilhões de hashes para conseguir minerar um bloco válido.
Os dados da Universidade de Cambridge e do site MacroMicro mostram que, em média, os custos para mineração de 1 BTC superam seu valor atual em dólar há dez meses, desde agosto de 2022, com apenas alguns alívios diários pontuais no período.
Estaria a média de mineradores de Bitcoin operando seus negócios no prejuízo há quase um ano? O Portal do Bitcoin procurou especialistas para comentar sobre os desafios da atividade e passar um panorama da mineração de BTC.
Quatro mineradores e educadores sobre mineração no Brasil concordam que os altos custos dificultam a atividade no país para o pequeno produtor. Eles explicam que a mineração com os dispositivos especializados, as ASICs, é cara e, muitas vezes, inviável.
Um dos entrevistados — que prefere se manter anônimo — disse que o estado do mercado para os pequenos é crítico:
“Falou em ASIC e mineração de BTC no Brasil, 99,5% é gato, ou mineração em áreas sem relógio”.
Segundo um minerador anônimo que não quer ser revelado.
Para Juliano Freitas, mais conhecido como Caju, que possui um canal no Youtube sobre mineração de criptomoedas, concorda em parte: “Hoje no Brasil, grande parte da mineração de ASICS é feita por mineradores que não pagam energia. Seja por energia fotovoltaica, créditos, áreas rurais, comunidades ou outros.”
“No Brasil é preciso ter energia gratuita para minerar com ASIC”, explica Caju. “De outra forma é impossível ter rentabilidade. Eu tenho ASICs no Paraguai, em uma estrutura de hosting”.
Caju estima que o custo energético da atividade no Paraguai fica em torno de 50% do faturamento bruto. Enquanto a porcentagem poderia chegar a 92% no Brasil, considerando a tarifa de R$ 1,00/kWh. “Isso sem contar taxa de iluminação e outras taxas que vem na conta de luz”, disse.
O também minerador e educador Denny Torres explica que seu objetivo com a mineração hoje não é a construção de um negócio profissional, mas uma estratégia de compra para investimento de longo prazo em BTC.
De 2016 a 2018, Torres tinha a mineração como sua principal renda, o que o permitia viver da atividade.
“Atualmente a minha estratégia é fazer um tipo de DCA (Dollar-Cost Averaging) comprar cripto todos os dias, sem fazer PIX para nenhuma corretora ou P2P. 100% anônimo. Não mais viver da mineração.”
Essa compra é realizada indiretamente — ao pagar pelos equipamentos necessários, consumo de energia, e demais custos que envolvem a atividade, para obter mais BTC em sua carteira pessoal.
Torres também tem um canal no Youtube sobre o assunto com mais de 191 mil assinantes; e conta que ele utiliza uma estrutura de GPU (placas de vídeos), ao invés do equipamento especializado (ASIC) para Bitcoin.
“Minerador que usa GPU ou CPU é como um motorista de Uber. E minerador de ASIC é como um empresário dono de uma frota de ônibus”, explicou. Como o educador não tem condições de ter uma “frota de ônibus”, ele acaba direcionando seu poder computacional para minerar “shitcoins”, que usa para trocar por BTC.
Por outro lado, o especialista, consultor e broker de mineração Allex Ferreira explicou que a atividade não é lucrativa para o pequeno, porque a indústria mudou muito nos últimos cinco anos. “Mineração de Bitcoin agora é brinquedo de adulto”, disse.
Allex conta que está no Bitcoin desde 2011 e minerou na China até 2017, mas passou a se dedicar para a consultoria e assessoria, pois minerar não é mais lucrativo como antes para pequenos empreendimentos. De 2018 para cá, novas estratégias aplicadas por grandes mineradores são o que mantêm a indústria rodando.
“Com a possibilidade de escolha de fornecedores de energia e a negociação de preços, a atividade tornou-se mais lucrativa e atraente para investidores em busca de novas oportunidades de negócio”; escreveu o profissional em um post publicado no LinkedIn.
Importância da dificuldade de mineração do Bitcoin
O penúltimo aumento da dificuldade de mineração ocorreu no dia 31 de maio, em alta de 3,4%, superando os 50 trilhões de hashes pela primeira vez na história da blockchain. E, antes disso, um aumento de 3,22% em 18 de maio.
No bloco 794304, confirmado na rede do Bitcoin na quarta-feira (14), a dificuldade registrada foi de 52,35 trilhões, quebrando novos recordes.
“Quanto maior a dificuldade, menor a recompensa. Consequentemente, menos a rentabilidade.”
Juliano Freitas (Caju)
A mineração através do sistema proof-of-work (PoW) foi o método escolhido para assegurar a rede do Bitcoin e distribuir novas unidades da moeda para os participantes que dediquem trabalho e recursos na atividade.
Para garantir uma distribuição programada até o limite máximo de 21 milhões, garantindo uma inflação controlada da oferta de BTC disponível no mercado, o protocolo do Bitcoin utiliza algorítimos que ajudam a manter a criação de um novo bloco (com o pagamento correspondente de sua recompensa) a cada cerca de 10 minutos.
Este algorítimo trabalha através do ajuste de dificuldade de mineração. Avaliando a frequência de descoberta de novos blocos nos últimos 2.015 blocos — cerca de duas semanas, considerando 10 minutos por bloco.
Caso os últimos 2.015 blocos estejam sendo minerados em um intervalo superior aos 10 minutos desejados, a dificuldade de mineração precisa diminuir, facilitando minerar mais blocos em um menor espaço de tempo. O inverso também é correto: aumentando a dificuldade de mineração caso os últimos 2.015 blocos tenham sido descobertos, em média, em um intervalo inferior a 10 minutos entre cada bloco.
O que significa que, quanto mais mineradores estão competindo entre si na descoberta dos blocos, direcionando poder computacional para a rede, mais o algorítimo tende a dificultar a atividade, consequentemente diminuindo a rentabilidade para os participantes.
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Isso pode fazer com que mineradores menores, como Denny Torres, sejam desincentivados a direcionar seus equipamentos para a rede do Bitcoin e busquem maior rentabilidade em outras redes.
“O aumento de dificuldade de mineração colabora para impedir que ‘motoristas de Uber’ consigam participar diretamente na rede do Bitcoin”, concorda Denny, utilizando sua analogia entre mineradores de GPU com motoristas de Uber; e mineradores de ASIC com donos de frotas de ônibus.
Fato que favorece as grandes fazendas de mineração, podendo concentrar o poder de hash em um menor grupo de maiores mineradores.
Segundo Juliano Caju, podendo até mesmo impactar a descentralização.
“A descentralização vem mesmo na distribuição de hashrate em muitas pools. Mineradores de BTC pequenos tem pouca parte do hash da rede. Grandes farms ainda são a maior força da mineração de BTC e outras altcoins.”
Desta forma, quanto mais difícil fica conseguir minerar Bitcoin, mais exclusiva a atividade se torna. Limitada a corporações com maior poder aquisitivo e capacidade de manutenção.
Faturamento, custos e lucros da mineração do Bitcoin
Segundo os dados do MacroMicro, no momento de redação, o custo médio para produzir um único bitcoin (1 BTC) é estimado em cerca de US$ 30.693. A média é obtida pela Universidade de Cambridge, através do cruzamento de dados e custos globais envolvidos na atividade.
Se colocada em contraste com o preço de mercado para 1 BTC, observa-se o resultado médio estimado de (-)US$ 4.709 por Bitcoin minerado, caso fossem vendidos imediatamente após aquisição.
Para Caju, quem minera BTC hoje, o faz pensando nos ciclos de alta, pois acredita em uma super valorização em breve.
Já Allex Ferreira, diz que grandes fazendas de mineração realizam o hedge (proteção) através da especulação de contratos futuros de energia elétrica — alguns com contratos com vencimento em cinco anos. O que garante a rentabilidade do negócio, mesmo em momentos de queda do preço do BTC no mercado à vista.
Allex insiste que a mineração não é mais para os pequenos, e que o preço “spot” do Bitcoin já não impacta tanto os grandes negócios. Ele também explica que o aumento de hash, que é constante, não prejudica os gigantes da indústria, nem mesmo é afetado pela volatilidade de preço.
“No passado, até 2017, o preço do Bitcoin caia, os mineradores desligavam as máquinas e o hashrate também caia. Hoje já não é mais assim, pois eles se protegem com crédito de energia e outras estratégias”.
Allex Ferreira
Utilizando o site Miningpoolstats, Torres mostra que a terceira maior pool de mineração do mundo — F2Pool — gera cerca de 49,5 EH/s, dos cerca de 300 EH/s totais da rede.
No caso da F2Pool, a cooperativa cobra uma taxa de 2% sobre o faturamento de seus mineradores (o que significa mais custos), equivalente a cerca de US$ 65 mil por dia, segundo Denny, ou 2,5 BTC/dia apenas em taxas para a empresa.
Juliano Caju conta que existe uma necessidade de atualização constante nos equipamentos dos mineradores para manter sua relevância competitiva e rentabilidade do negócio, já que novas ASICs mais eficientes são lançadas de tempos em tempos.
“As [ASICs] mais antigas não dão lucro algum”.
Juliano Freitas Caju
O que aumenta ainda mais a dificuldade de mineração no Brasil, já que existem barreiras financeiras para a importação do equipamento no país, segundo Denny Torres.
“A importação de ASICS no Brasil é complicada e cara. Ainda mais que ASICS de última geração custam milhares de dólares e depois de aplicadas as tributações de importação de nosso país, o PayBack acaba ficando muito distante.”
Denny Torres
Sobre isso, Alex Ferreira explica que hoje já é possível alugar as máquinas com seus produtores, podendo pagar até cerca de 1% por mês, dependendo do contrato de locação. O que viabiliza a expansão de negócios já bem estabelecidos que conseguem negociar estes termos.
Este processo de locação permite a execução de um modelo de importação chamado: “Admissão temporária”. O que, segundo Alex, garante facilidades aduaneiras.
Na admissão temporária, o importador adquire o produto que só pode permanecer no país durante um prazo pré-determinado.
Estado atual da rede e concentração de hashrate
Os efeitos do aumento da dificuldade de mineração, somados a uma atividade com custos muitos altos e necessidade constante de manutenção são visíveis na rede do Bitcoin. Enquanto as grandes companhias se mantém saudáveis e operantes, independente do cenário microeconômico para o criptoativo.
No período de uma semana é possível observar a dominância das cinco maiores pools de mineração de Bitcoin, recebendo 87,81% de toda recompensa de bloco, dominando a rentabilidade do negócio e atraindo mais mineradores (ou poder de hash) para suas cooperativas.
As duas maiores pools — Foundry USA e AntPool — descobriram, sozinhas, 56,9% de todos os novos blocos de Bitcoin nos últimos sete dias. E essa dominância vem aumentando, conforme aumenta também a dificuldade de mineração — já que em períodos maiores de tempo, suas participações não superavam 30% e 20%, respectivamente.
Dentro de duas semanas saberemos novamente se novos recordes de dificuldade de mineração de Bitcoin serão superados, ou se os valores atuais podem recuar, melhorando a rentabilidade e os resultados dos mineradores — que contribuem para a segurança da rede da criptomoeda com maior capitalização de mercado.
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