Fabiano Lorite de Lima e Cláudio Barbosa, dois dos fundadores da Trust Investing, empresa que não paga seus clientes há oito meses, não podem mais deixar o Brasil após terem seus passaportes confiscados em agosto do ano passado, quando foram presos em flagrante na região de Dourados (MS).
Na ocasião, a dupla foi presa durante uma abordagem da Polícia Rodoviária Federal portando R$ 500 mil em esmeraldas de origem e destino desconhecido. Quando a nota fiscal das pedras preciosas apresentadas por eles foi checada no sistema, os policiais constataram que esta era “inidônea”, ou seja, continha informações fraudulentas — o que pode configurar o crime de falsidade ideológica.
No momento da prisão, os líderes da Trust Investing — menos o CEO da empresa, Diego Chaves, que não estava no local — não foram capazes de comprovar a origem das pedras, bem como a concessão de lavra ou guia de utilização emitida pela Agência Nacional de Mineração (AMN). A nota também não apresentava a base de cálculo de tributo, apenas o valor total de R$ 508,9 mil referentes ao suposto valor das esmeraldas.
Outras suspeitas apontadas pela Justiça são o fato de que o flagrante aconteceu a 100 quilômetros da fronteira com o Paraguai e que, nos carros, foram encontrados rádios transceptores sem autorização da Anatel, o que pode gerar suspeitas de contrabando. Também contribuiu para a prisão em flagrante a suspeita de terem cometido o crime de usurpação de minério da União Federal e falsidade ideológica.
Um terceiro homem chamado Jean Pessoa de Souto também foi preso junto com eles, mas ao que tudo indica, ele era um vigilante contratado e que apresentou o contrato de serviços no momento da prisão.
O trio foi solto logo no dia posterior à prisão, mas a liberdade provisória veio acompanhada de medidas cautelares. Entre elas estava a obrigação de entregar passaportes para Polícia Federal, não frequentar região de fronteira, não sair do país até o término de eventual ação penal, não mudar de endereço, telefone ou viajar por mais de oito dias sem autorização da Justiça, comparecer a todos os atos do processo e não voltar a cometer nenhum delito.
O Portal do Bitcoin tentou entrar em contato com Fabiano Lorite e Cláudio Barbosa, mas a defesa jurídica de ambos se negou a responder as perguntas da reportagem e afirmou que não fará declarações sobre o assunto.
Pedido de prisão preventiva
Embora os líderes da Trust Investing estejam livres atualmente esperando julgamento, o Ministério Público Federal lutou para que eles fossem detidos em prisão preventiva quando foram pegos em agosto.
O Ministério Público justificou o pedido de prisão preventiva com base na possível formação de organização criminosa e na prática de crimes contra a economia popular — no âmbito deste último crime está a formação de pirâmide financeira, golpe do qual muitos investidores acusam a Trust Investing de ter aplicado.
O envolvimento no mercado cripto, especialmente transações com bitcoin citadas no processo e que levantaram suspeitas de irregularidades pelo MP, foram direcionadas contra Fabiano Lorite.
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No entanto, a prisão preventiva não foi aplicada pelo juiz Vitor Figueiredo de Oliveira, do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (MS), para Fabiano nem para os outros dois acusados, uma vez que o possível crime não foi cometido com o emprego de violência ou grave ameaça, pela falta provas e existência de risco concreto de fuga e pelo contexto de pandemia, segundo o juiz.
Investigação do Ministério Público
Embora o Ministério Público Federal não tenha conseguido manter a prisão preventiva de Fabiano Lorite e Cláudio Barbosa, o flagrante abriu as portas para que o órgão desse início a investigações sobre as operações dos líderes da Trust Investing.
As suspeitas foram levantadas por uma série de motivos que vão além das circunstâncias da prisão de agosto, como o fato, por exemplo, de que Cláudio Barbosa já havia sido preso no passado pelo crime de roubo.
Em segundo lugar, os empresários se contradisseram durante os depoimentos prestados após a prisão em flagrante. O Ministério Público afirmou que “há indícios do cometimento do delito de lavagem de dinheiro, dada a inconsistência das informações acerca da empresa ‘VICTORY’, que teria, em tese, comprado as pedras preciosas”.
O MP destaca, por exemplo, que embora Claudio e Fabiano fossem supostos proprietários da VICTORY, eles não foram capazes sequer de informar qual era o endereço da empresa. Também não sabiam o nome do responsável administrativo, nem contar elementos simples sobre a negociação das esmeraldas, como forma de pagamento e data.
“Da simples leitura do depoimento prestado por um dos investigados, denota-se alguns pontos indicativos de que a empresa VICTORY é uma empresa de fachada ou, ainda, uma empresa fantasma, havendo, ademais, suspeitas de que o próprio Cláudio Barbosa seja um “testa-de-ferro” — já que sequer sabe o endereço de sua empresa”, aponta o Ministério Público.
Em seguida, o MP também levanta suspeita sobre Fabiano Lorite, afirmando que ele “apresentou outras informações que também indicam a prática do crime de lavagem de capitais, além de contradizer, em alguns pontos, o depoimento prestado por seu sócio, Cláudio”.
Além disso, o MP ressalta que a série de contradições no depoimento se torna ainda mais preocupante levando em conta que eles foram pegos com pedras preciosas com nota fiscal fraudulenta, algo que o MP afirma ter “um perfil de risco único, que pode ser facilmente explorado para fins de crimes de lavagem de dinheiro”.
O MP defendeu que o acesso aos aparelhos celulares do grupo era de suma importância pois estes poderiam conter gravações de mensagens, e-mails e de ligações que poderiam ajudar a identificar outros envolvidos na possível prática criminosa.
O pedido foi aceito pelo juiz Bruno Cezar da Cunha Teixeira, da 3ª Vara Federal de Campo Grande, que tem a competência para julgar crimes contra o Sistema Financeiro Nacional e lavagem de dinheiro.
Ao deferir o pedido, o juiz também estabeleceu a ordem para que a investigação do inquérito policial tramitasse de forma direta entre Polícia Federal e Ministério Público, sem a necessidade de intervenção do judiciário.