Segurança dos investidores precisa ser o centro da regulação do mercado cripto no Brasil | Opinião

Autora discute como a Lei das Criptomoedas, apesar de positiva, ainda deixa de lado importantes mecanismos de defesa dos investidores
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Foto: Shutterstock

O surgimento do Bitcoin mais de uma década atrás, certamente estabeleceu um marco para a humanidade. Os ativos digitais e suas transações descentralizadas logo chamaram a atenção de investidores e entusiastas que apostam nas criptomoedas como o primeiro passo de uma grande transformação na nossa relação com as indústrias, o varejo, o trabalho e a construção de patrimônio.

Só no Brasil, 33% da população entre 18 e 64 anos se mostram interessados em adquirir Bitcoin em algum momento de 2023, segundo dados da Statista em associação com a Finbold. O perfil dos investidores está mudando, porém, vale lembrar que o sucesso de uma instituição também depende da segurança que a mesma oferece para a sociedade.

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Em 2022, presenciamos um novo marco para a história do mercado. A queda de uma das maiores corretoras de criptomoedas do mundo deixará cicatrizes que devem ser encaradas como um lembrete para todos. 

A FTX se tornou um grande atrativo para os novos investidores, ao prometer mais acessibilidade ao mercado. A exchange, que chegou a atingir o valor de US$ 32 bilhões antes de entrar com pedido de recuperação judicial este ano, veio ao chão após a informação de que havia perdido o dinheiro de seus clientes em aplicações para salvar outras empresas.

Com lucros impressionantes e investidores experientes, a exchange não gerava dúvidas sobre sua saúde financeira, até a chegada do chamado inverno cripto, que evidenciou o castelo de cartas no uso do token da FTX para lastrear as operações da empresa irmã Alameda Research. Após o conhecimento da situação, uma enxurrada de pessoas tentando resgatar seus investimentos causaram um colapso financeiro da empresa, sentido por todo o mercado cripto.

A grande lição da derrocada da FTX é a necessidade de uma regulamentação forte e processos transparentes que garantam a confiança do investidor ao custodiar de com segurança suas economias em empresas do setor.

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A principal questão levantada por todos é, o que pode, ou poderia ter sido feito para evitar uma situação como esta? Nos Estados Unidos, o Congresso tem pressionado autoridades financeiras para que haja uma regularização do mercado. 

No Brasil, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM), autarquia vinculada ao Ministério da Economia, iniciou uma discussão por meio de instruções, em caráter educativo, sobre caracterização, nomenclaturas e termos alinhadas às práticas do mercado.

No entanto, o terceiro marco para o mercado, pelo menos em território nacional, pode partir de uma semente plantada pela lei nº 4.401/2021, sancionada na semana passada.

As lacunas da lei cripto

A aprovação do texto base da lei por parte da Câmara dos Deputados estabelece caminhos importantes para regulamentação das prestadoras de serviços de ativos digitais, apresenta regras para inibir fraudes e lavagem de dinheiro, além de incluir os crimes virtuais desta natureza ao Código Penal.

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Dentre os pontos positivos, também podemos listar o fortalecimento de conceitos já trabalhados pela Receita Federal, Banco Central e CVM no que tange criptomoeda e taxonomia dos tokens. 

Apesar dos avanços, é preciso lembrar que a aprovação de um texto elaborado no passado não corresponde totalmente com o cenário vivido atualmente. Uma das questões que ficaram de fora da lei cripto sancionada, por exemplo, é a segregação patrimonial, que prevê que o dinheiro dos clientes custodiado pelas empresas não seja utilizado por elas para investimentos ou compras, como observado com a FTX.

A segregação patrimonial dá mais segurança para os investidores e estabilidade para o mercado. Por outro lado, existem empresas contrárias a esse movimento, defendendo que este mecanismo inibe a expansão das gestoras que poderiam utilizar o dinheiro de seus clientes para ganhar mais posições no mercado.

As finanças descentralizadas (DeFi), que são serviços e produtos financeiros oferecidos através de aplicações blockchain, foram uma outra temática pertinente ao universo dos ativos virtuais não abordada expressamente pela lei cripto.

Futuramente podem haver regras estabelecidas pelo regulador, mas, no momento, projetos desse tipo de ecossistema podem ficar em um limbo regulatório. Hoje, uma operação de empréstimo de criptomoeda peer-to-peer pode estar desamparada de processos Know Your Partners (KYP) e políticas de prevenção à lavagem de dinheiro.

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De toda forma, muitos pontos trazidos na lei que regula o mercado de criptomoedas no Brasil já eram adotados como boas práticas e auto regulação entre as empresas de cripto, sendo o texto apresentado muito próximo a atender aos anseios do mercado. 

Contudo, para garantir a segurança dos valores custodiados e a confiança do investidor, ainda é necessário criar novas discussões  sobre o cenário atual, a fim de buscar soluções que preencham as lacunas que permaneceram na nova lei cripto.

Sobre a autora

Marina Perelló é COO do Yaak Studio, startup especializada em soluções Web3 e experiências imersivas no Metaverso. A partir da liderança criativa de Thiago Yaak, o Yaak Studio desenvolve tokenização de ativos, produz projetos de arte e experiências digitais tanto autorais quanto em parcerias com marcas.