O advogado e membro da Silicon Valley Arbitration and Mediation Center (SVAMC), Daniel Becker, afirma que é “necessário existir regulação, mas a que traga segurança jurídica e não uma zona de incerteza para quem está investindo ou querendo se capitalizar através de ICOs”.
Quanto a natureza jurídica das criptomoedas, Becker aponta que o ideal seria tratar delas como algo sui generis, o facilitaria uma regulação de forma responsável.
Becker, que também é diretor de Novas Tecnologias do Centro Brasileiro de Mediação e Arbitragem (CBMA), defende que os smart contracts efetuados na Blockchain são o caminho para se ter uma transação segura, mas só seriam emplacados com uma “internet das coisas evoluída”.
Confira abaixo a entrevista completa que Becker concedeu ao Portal do Bitcoin:
Portal do Bitcoin – As moedas digitais são valor mobiliário, de commodity digital, uma moeda em si mesmo, ou nada disso?
Daniel Becker – É complicado de estabelecer. Tem opção de moeda, como meio de pagamento; de ativo… São leituras de órgãos e entes da Administração Pública brasileira. Pelo Bacen (Banco Central) é uma classificação. Pela CVM é outra. Existe aquele projeto de lei de 2015 (PL 2303) que tenta classificar como meio de pagamento equiparando aos programas de milhagem.
O desembargador do TJRJ, Alexandre Câmara, ao se manifestar sobre a possibilidade de penhora das criptomoedas, emitiu a opinião pessoal de que bitcoins seriam moedas. Mas o que você acha?
Não seriam moedas. Vamos ao aspecto prático e até fazendo uma leitura com base no que Alexandre Câmara falou. O Código de Processo Civil estabeleceu um rol dos bens que podem ser penhorados. O problema de tratar a criptomoeda como uma moeda é a oscilação tremenda do valor dela, seja um Bitcoin ou uma altcoin. Para liquidar um crédito exequendo em criptomoeda, você pode ter uma distorção muito grande na valoração dele que pode ser uma no início da execução, outro momento da penhora e ainda um diferente na hora de fazer a transformação daquele bem em dinheiro.
A Wall Street começou a negociar Bitcoin no Mercado Futuro e isso pode chamar a atenção para a SEC (A Comissão de valores dos Estados Unidos) para trazer para si a competência para regular e tratar criptomoeda como uma espécie valor mobiliário.
O pessoal começou a ganhar muito dinheiro especulando com Bitcoin e não utilizando-o como meio de pagamento ou moeda de transação, que era ideia partindo de lá trás com Cypherpunk e depois com Satoshi Nakamoto. Transformar criptomoedas em mera especulação é um problema. Mas é o que vemos hoje em dia em vez das trocas.
As taxas dificultam o processo…
As pessoas não usam Bitcoin para compras no varejo. Virou muito mais uma estratégia de marketing da empresa seguir o hype das criptomoedas.
Como a SEC tem feito nos EUA, a CVM tem tentado puxar a competência regulatória para si. Como você analisa essa briga tanto da SEC nos EUA e quanto da CVM no Brasil de tentar regular algo que sequer tem sua natureza jurídica definida?
A CVM está muita bem alinhada com SEC no caso das criptomoedas e das ICOs. Ambas não estão regulando por meio de atos normativos. Elas estão expedindo notas, ofícios, deliberações. É mais uma postura receosa do que uma postura efetivamente ativa por parte da CVM e da SEC. Acreditar numa ausência de regulação das criptomoedas e das ICOs é uma irrealidade. É necessário existir regulação que traga segurança jurídica e não uma zona de incerteza para quem está investindo ou querendo se capitalizar com ICOs.
O que eu vejo é uma posição muito alinhada das duas em expedir esses ofícios com base em normas existentes para outra realidade que não a da economia digital. Estão utilizando uma base jurídico-normativa antiga para regular uma coisa nova. Não vai dar certo. Não tem como colocar as mesmas regras de como fazer uma IPO (Initial Public Offering) para uma ICO, simplesmente por equiparar o Token QR Code a uma emissão de debênture. Sou muito a favor de regulação, mas acho que tem de se criar uma regulação específica assim como Gibraltar e Malta estão fazendo.
Qual seria o papel do regulador para evitar matar a inovação?
Essa é uma pergunta bem difícil porque é quase impossível prever qual vai ser a melhor forma de lidar com esse fenômeno. O que muita gente fez foi comparar agora esse momento que vivemos em 2017 com uma pré-crise econômica que seria causada por uma bolha de criptomoedas, algo que não aconteceu e nem deve acontecer nesse ano. É muito difícil a regulação acompanhar a inovação. Todas as vezes que o Direito e a Tecnologia se bateram, a tecnologia saiu na frente. Tem de se criar uma regulação específica para esse tipo realidade e se estabelecer a criação de uma nova natureza jurídica. É pegar os elementos do ICO e da criptomoeda, não precisa necessariamente entrar em detalhes de natureza de moeda corrente, moeda não tradicional, ativos, etc. e encarar como algo sui generis. Não entra nenhuma categoria que já existe e se pode dotá-la de uma nova qualificação jurídica que não encara algo novo como se fosse antigo.
E qual seria a diferença entre criptomoeda e moeda virtual?
É mais uma diferença técnica. A criptomoeda envolve criptografia. Tem aqueles outros critérios da Blockchain e as descendentes dela. A moeda virtual, por exemplo, pode ser o ouro do World of Warcraft.
O presidente do Conselho de Estabilidade financeira, Mark Carney, que coordena o regulamento financeiro do G20, declarou que criptomoedas não eram um risco à estabilidade global. Foi estratégico?
Ela nunca seria feita no ano passado. 2017 mostrou que os governos estavam preocupados. Então, acho que essa queda brusca do Bitcoin e a demonstração de fragilidade da moeda causada pela especulação dos usuários, mostrou que de fato o Bitcoin não precisa ser regulado agora, no sentido de que não representa ameaça ao mercado financeiro. Mas insisto na ideia da regulação por causa dos benefícios para a criptomoeda.
E quais seriam os benefícios ?
Acho a ideia de capitalização das ICOs seria fantástica. No Brasil, não aconteceu nenhum pelo que sei. Existem muitas ICOs fora do país. Nos Estados Unidos, tem um terreno acidentado para ICOs. Aconteceram alguns deles, outros não tiveram sucesso, alguns mal saíram do papel e a SEC obteve medidas contra como foi os casos do Adamantium e da Tezos.
A SEC, inclusive já chegou a soltar um alerta aos investidores tratando criptomoedas como esquemas Ponzi.
Determinadas situações não tenho dúvidas de que sejam “ponzi schemes” (pirâmide). Não sei se isso ainda está acontecendo, mas o McAfee, famoso criador do antivírus, costumava tweetar que determinada criptomoeda iria bombar. As pessoas, então, compravam aquela criptomoeda. Em consequência ela subia e subia e depois caia. Mas você não pode culpar a faca pelo homicídio.
Mas a pirâmide não seria se usar de um produto fictício para atrair outras pessoas para um negócio que tem como fim não o produto mas sim o de aumentar uma rede na qual quem está na base sairá no prejuízo? O MCAfee teria feito isso?
Mas isso funciona através da especulação. Você já tem a moeda… Teve até um anúncio da SEC relacionado a promoção de ICOs por celebridades, na qual ela declarou que essas celebridades teriam de revelar o que estavam ganhando para fazer aquela publicidade. É a transparência do mercado financeiro. A CVM não fez nada semelhante. A SEC está tentando conter os danos de um mercado que ainda não amadureceu.
Sabemos que criptomoedas são apenas uma ponta da inovação chamada Blockchain, a qual deve modificar a forma de fazer contratos. O que você tem a falar sobre os smart contracts e o que deve mudar de fato?
Tem gente que diz que smart contratcs não é um contrato propriamente. Ele é um código de computador que tem a origem no Ethereum, onde é programada a maior parte dos smart contracts. Ele trabalha com uma condicional. Se determinado evento ocorrer, você receberá o valor “x”. Isso tudo numa rede programada de Blockchain. Ele torna segura a transação porque ele afasta o surgimento de qualquer dúvida ao cumprimento de determinada obrigação. Na minha visão para os smart contratcs emplacarem, seria necessário uma internet das coisas evoluída.
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