O mercado de criptoativos acelera as perdas nesta quarta-feira (9) com as dúvidas de investidores em torno do resgate da encrencada corretora FTX pela Binance. Alguns analistas acreditam que o negócio não deverá ir em frente, diante das incertezas sobre a real saúde financeira da FTX.
O anúncio de uma possível compra ocorreu em meio a uma série de dúvidas sobre a liquidez da FTX e forte queda do token nativo da exchange, que despenca 76% nas últimas 24 horas, cotado a US$ 4,35. O saldo de bitcoins da corretora foi praticamente zerado antes do congelamento dos saques.
Como resultado, o Bitcoin (BTC) mergulha 10,4% nas últimas 24 horas, cotado a US$ 17.954,46, segundo dados do CoinGecko. O Ethereum (ETH) registra queda de 18,4%, negociado a US$ 1.215,87
Em reais, o Bitcoin cai 7,24%, para R$ 95.469,79, conforme o Índice do Portal do Bitcoin (IPB).
As altcoins também operam em forte baixa, entre elas Binance Coin (-8,6%), XRP (-16,8%), Dogecoin (-20,8%) Cardano (-9,1%), Polygon (-21,9%), Polkadot (-9,3%), Shiba Inu (-13,5%) e Avalanche (-12,3%).
Solana (SOL) registra queda de 40,6% nas últimas horas diante do peso do token no balanço da Alameda, braço de investimentos da FTX.
Com a forte volatilidade, a Binance acessou um fundo de emergência destinado a proteger usuários. Em tuíte, o CEO da corretora, Changpeng “CZ” Zhao, informou que a empresa havia adicionado fundos ao “Secure Asset Fund for Users” (SAFU) “para se ajustar às recentes flutuações de preços” e para garantir que contenha novamente US$ 1 bilhão em criptomoedas.
Futuro da FTX
O mercado está dividido sobre a viabilidade da compra da FTX pela Binance. Investidores da Polymarket acreditam que há 45% de chance de a Binance desistir do acordo com a FTX, enquanto 55% apostam que a aquisição será aprovada.
Em entrevista à Bloomberg, o CEO da corretora cripto Coinbase, Brian Armstrong, disse que observa um aumento na atividade em sua plataforma de negociação após os problemas de liquidez da FTX.
O executivo afirmou que o mesmo não aconteceria na Coinbase, porque a empresa não se envolve em “comportamentos arriscados”.
Já o cripto evangelista e ex-desenvolvedor de Bitcoin, Jimmy Song, disse ao Valor que não acredita que a Binance irá comprar a FTX porque, segundo ele, a corretora do bilionário Sam Bankman-Fried irá falir de qualquer maneira.
Quem também está cética em relação à viabilidade do negócio é Gracy Chen, diretora administrativa da Bitget, corretora cripto fundada em Singapura em 2018.
“É altamente improvável que a Binance consiga adquirir a FTX. Pode parecer que CZ saiu vitorioso, mas a Binance acabará pagando o preço por prejudicar os interesses de longo prazo da indústria”, contou ao Valor.
Também há questionamentos sobre a reação das agências antitruste à potencial aquisição.
Pouco após o anúncio da compra feito pelo CEO da Binance, o professor associado da Universidade de Amsterdã, Thibault Schrepel, que é especializado em questões de blockchain e antitruste, fez um alerta ao portal Coindesk de que reguladores em todo o mundo têm poder interferir nesse tipo de negociação.
“Da próxima vez, antes de postar, verifique se o seu tuíte está em conformidade com as leis antitruste”, escreveu Schrepel, acrescentando: “Eu não ficaria surpreso ao encontrar esse tuíte em um processo judicial”.
Em newsletter na Bloomberg, Emily Nicolle destaca que um problema para as agências antitruste é identificar as jurisdições responsáveis pelas corretoras, com a FTX sediada nas Bahamas e a Binance sem sede formal em nenhum país.
Momento Lehman
Jeremy Allaire, cofundador e CEO da Circle, disse que a crise de insolvência da FTX é o momento “Lehman Brothers” do mercado de criptomoedas.
“Como alguém que está envolvido nesta indústria há 10 anos, é decepcionante que uma tecnologia que foi gerada em reação ao momento Lehman Bros. de 2008 tenha dado origem a sua própria versão”, disse em tuíte.
E diante do caos, Sam Bankman-Fried, CEO da FTX, já não é mais bilionário. Sua fortuna encolheu 94%, ou US$ 14,6 bilhões, em um dia. Agora seu patrimônio é avaliado em cerca de US$ 991,5 milhões, de acordo com o Índice de Bilionários da Bloomberg.
Bitcoin hoje
Com o mercado cripto em choque diante do colapso de outro gigante, o cenário macro ficou em segundo plano. Nesta quarta, os índices futuros das bolsas americanas operam entre perdas e ganhos à espera dos resultados das eleições de meio de mandato nos EUA.
O resgate da FTX pela Binance provocou um “minicrash” na Nasdaq na terça-feira (8), conforme o Valor. As ações da Robinhood, apontada como alvo de aquisição da FTX, recuaram 19%, enquanto as ações da Coinbase perderam 11% e as da Microstrategy, 20,6%. A Nasdaq fechou com ganho de 0,49%.
Amanhã (10), outro fator pode trazer mais volatilidade aos ativos de risco com a divulgação do índice de preços ao consumidor nos EUA.
“O mercado ainda vai se fixar na inflação, que deve se manter alta e persistente pelo menos nos próximos dois trimestres”, disse Luke Barrs, chefe global de gestão de carteira de clientes de ações fundamentais da Goldman Sachs Asset Management, em entrevista à Bloomberg Television.
Outros destaques
Diante da instabilidade no mercado de criptoativos, várias empresas institucionais de capital cripto, como Amber Group, Auros e LedgerPrime, receberam um “alerta” do Clearpool, um protocolo de empréstimo sem garantias, porque atingiram 99% do valor máximo de crédito disponível para essas empresas na plataforma, informou o CoinDesk.
A 99, conhecida por seu aplicativo de transporte, lançou um serviço de crédito pessoal, segundo o Estadão. A empresa vai oferecer empréstimos a motoristas de R$ 500 a R$ 10 mil, que podem ser pagos em até 12 vezes, com taxas de juros que variam entre 2% e 10% ao mês. Por meio da carteira digital 99Pay, a fintech também permite operações com Pix, além da compra e venda de Bitcoin.
A exchange cripto Bitmex planeja iniciar a negociação de seu token nativo BMEX na próxima sexta-feira (11), de acordo com o The Block. O token será usado para recompensar clientes em meio à decisão da corretora de recuperar participação no segmento de derivativos.
A mineradora de Bitcoin Marathon Digital registrou prejuízo líquido de US$ 75 milhões no terceiro trimestre, mais de três vezes a estimativa média de analistas. A mineradora teve receitas de US$ 12,7 milhões no período, menos da metade da projeção média de analistas, de US$ 28,4 milhões, compilada pela FactSet.
O cofundador do Ethereum, Vitalik Buterin, publicou em sua conta no Twitter nesta semana um infográfico técnico compartilhando o roteiro atualizado para atualizações planejadas para a rede. Inclui uma nova adição para o Verge – uma nova etapa para a Fusão – e um “novo estágio”, chamado Scourge, entre outras novidades.
Regulação, CBDCs e Cibersegurança
Diante da nova turbulência causada pelo colapso da FTX, parlamentares nos EUA já fazem um novo apelo para a regulação do mercado cripto. A senadora republicana Cynthia Lummis (Wyoming), que elaborou um projeto de lei para o setor com a democrata Kirsten Gillibrand, senadora pelo estado de Nova York, mandou um recado ao Congresso:
“Manipulação de mercado, atividade de crédito e se os fundos e ativos de clientes foram adequadamente protegidos são apenas algumas das muitas questões que meus colegas e eu precisamos considerar nos próximos dias”, escreveu Lummis em comunicado divulgado pelo The Block.
Na Alemanha, o regulador do setor financeiro (BaFin) está de olho nas exchanges cripto. A agência ordenou que o braço da Coinbase no país cumpra os requisitos de risco e capital descritos pela legislação bancária nacional.
No Brasil, um levantamento realizado pelo MB e pelo Instituto FSB Pesquisa mostra que 81% dos entrevistados acham que uma entidade governamental deve supervisionar as corretoras de criptomoedas no país.
Uma das principais dúvidas entre os principais playersdo mercado de criptomoedasé se o projeto de lei 4.401/2021 pode ser aprovado ainda este ano. O texto, que propõe a criação de um marco legal para o setor, está pronto para ser votado no plenário da Câmara dos Deputados. Caso seja aprovado, irá para sanção presidencial.
Presente ao evento Criptorama na terça-feira (8), Karen Duque, diretora da Bitso, não há nenhuma grande oposição ao projeto, seja de alguma bancada ou outro setor da sociedade, segundo reportagem do Portal do Bitcoin. O ponto, segundo ela, seria conseguir transformar o PL em tema prioritário no Congresso.
Perguntado sobre como seria um cenário no qual o PL fique para o ano que vem, Julien Dutra, diretor de relações governamentais e institucionais da 2TM, dona do MB, respondeu com uma metáfora futebolística: “Agora o mercado cripto está jogando no ataque, basta empurrar para o gol. Se o texto ficar para ano que vem, a bola estará com os zagueiros, tendo todo um campo para percorrer até entrar na pequena área”.
Vanessa Butalla, diretora jurídica e de compliance da 2TM, concorda: “Seria um retrocesso voltarmos a discutir um novo projeto sendo que este está sendo discutido desde 2015. Um novo PL para trazer aprimoramentos ao que espero que seja aprovado agora seria ok, mas pelo menos os princípios mínimos já deveríamos estabelecer antes de 2023”, destaca em artigo no Valor.
Também presente ao evento, o CEO da exchange Bitso, Thales de Freitas, ressaltou como a criptoeconomia pode ter um uso prático no Brasil na área de câmbio, espelhando-se em um caso já existente: “O blockchain é infinitamente melhor que o SWIFT. No México, como não temos travas regulatórias, a Bitso opera bilhões de dólares ao ano. É o fluxo dos Estados Unidos para o México de remessas”.
A 1ª edição do Criptorama, organizado pela Associação Brasileira de Criptoeconomia (ABCripto) em São Paulo, termina nesta quarta-feira (9).
Nos EUA, o Tesouro anunciou novas sanções ao Tornado Cash,serviço de mixagem de criptomoedas. Além das sanções anunciadas em agosto, a empresa agora é designada por seu papel em crimes cibernéticos relacionados ao programa de armas nucleares da Coreia do Norte, o que caracteriza o serviço como uma ameaça à segurança nacional.
Metaverso, Games e NFTs
O CEO da Meta, Mark Zuckerberg, disse a centenas de executivos que os planos de demitir funcionários começam nesta quarta-feira (9), segundo o The Wall Street Journal, que citou pessoas com conhecimento do assunto. Zuckerberg assumiu a culpa pelos erros da empresa e pelo elevado número de funcionários. O CEO tem sido criticado pela decisão de investir bilhões de dólares no metaverso.
No Brasil, quem aposta no mundo virtual é a investidora tech Camila Farani, que anunciou dois projetos ligados à Web3, conforme a Forbes. O primeiro é a avatar Mila, uma personificação virtual de Camila. Mila também estará no metaverso F/Land, desenvolvido com o objetivo de conectar a comunidade empreendedora brasileira.
No Japão, a operadora móvel NTT Docomo planeja investir até 600 bilhões de ienes (US$ 4,1 bilhões) ao longo de vários anos com foco na tecnologia web3, disse a empresa na divulgação do balanço do segundo trimestre.