O mercado cripto está em um momento de baixa brutal Mas você não saberia disso, se dependesse apenas da onda de convites festivos para o evento NFT NYC dessa semana.
O encontro, que mais parecia uma semana de festas espalhadas pelos bairros nova-iorquinos de Manhattan e Brooklyn do que uma conferência comum em um só prédio, reuniu anônimos que utilizam fotos de perfil (ou PFPs, na abreviatura em inglês) de Apes, Punks, Doodles e Cool Cats no Twitter ao mundo real, para que eles se conhecessem pessoalmente e impulsionassem seus JPEGs.
A insana NFT NYC de 2021, que foi a edição inaugural, havia acontecido em outubro e talvez tenha sido melhor caracterizada por um artigo muito compartilhado pela revista Input, intitulado “Os Bored Apes invadem Manhattan”.
O texto, que levou tudo a sério e citou orgulhosos holders de Bored Apes (e muitos estavam vestidos como seus ativos), foi imediatamente uma lenha para a fogueira da zombaria no Twitter. “Leia isso para morrer instantaneamente”, tuitou uma jornalista da revista Elle.
Um jornalista do jornal Chicago Reader tuitou: “Meu cérebro ficou piriforme ao ler que um primata ganhará um livro de memórias escrito por…” Neil Strauss, autor do livro “O jogo: A bíblia da sedução”.
“BAYC não é um culto de lavagem cerebral”
BAYC:
O artigo da revista Input questionou: “Quanto tempo a festa vai durar?”. Oito meses depois, a resposta vai depender da sua opinião sobre todo o setor.
Estouro da bolha
A atual queda do mercado cripto fez o preço mínimo das coleções NFT mais famosa despencar, permitindo que críticos alegassem que a bolha havia estourado. Mesmo que os preços tenham caído, o volume de vendas NFT subiu, sugerindo que muitas pessoas usaram os preços mais em conta como uma chance de entrar no segmento.
No mais recente episódio do podcast “gm”, o Decrypt recebeu Christine Brown, que deixou seu cargo como líder cripto na Robinhood para se tornar diretora de operações de um aplicativo de portfólio NFT.
Mesmo após a queda drástica da ação da Robinhood, a iniciativa ainda é bastante impressionante. Sugere que muitas pessoas inteligentes do setor de tecnologia realmente acreditam que NFTs estão aqui para ficar.
Agonia e êxtase
Em muitos aspectos, Bored Ape Yacht Club é a representação perfeita da agonia e do êxtase da febre NFT.
Dentre os interessantíssimos novos casos de uso dos NFTs (como Stepn, que usa tênis NFT como um mecanismo de recompensa a corredores com cripto, por exemplo), Apes são, sem dúvida, o rosto dos NFTs para a população comum.
Muitas pessoas que realmente acreditam que exista valor em NFTs consideram Apes problemáticos (como Vitalik Buterin e Muneeb Ali) e meio parecidos como um culto. Agora, a apecoin (APE) atingiu uma baixa recorde e o preço mínimo para comprar um Ape despencou para US$ 100 mil.
Mas US$ 100 mil por um JPEG de um primata ainda é bastante impressionante, pois a coleção foi lançada há pouco mais de um ano.
Em agosto do ano passado, escrevi* uma coluna que explicava como NFTs são usados como passes de acesso a comunidades. Ainda acredito que seja a melhor forma de explicá-los a novatos que tentam entender por que pessoas pagam centenas de milhares de dólares por JPEGs de primatas.
Andrew Millar, um empreendedor de nomes de domínio que já havia escrito sobre BAYC para o Decrypt, vendeu seu Ape em maio e lucrou bastante (nove meses após tê-lo comprado). Um mês depois, ele voltou e o recomprou, pois sentiu falta de fazer parte da comunidade BAYC.
Utilidade prática
Mais recentemente, a conversa sobre NFTs mudou para a utilidade, o que é saudável para o setor. Se NFTs vão continuar existindo, precisam ter um propósito além de ser uma ostentação digital.
Quando o assunto são Bored Apes, holders têm acesso a um Discord só para membros, lançamentos de produtos e uma apecoin gratuita. Mas isso é utilidade? O que é possível fazer com seu Bored Ape?
Yuga Labs, o estúdio que é dono dos Bored Apes e CryptoPunks, teve muita publicidade positiva quando anunciou que concederia direitos de propriedade intelectual (ou PI) completos a holders de Apes. Assim, você poderia usar seu Ape em tudo o que quiser, sem medo de ser processado. Porém, existe um problema: Todos também podem.
Ainda não existem bases jurídicas para impedir que alguém use um Ape que não possuem. Também não existe nada que evite que alguém use seu Ape como sua imagem de perfil no Twitter — além de zombar publicamente por membros da comunidade BAYC.
Ryder Ripps, artista e provocador, criou uma versão “recontextualizada” do BAYC ao recriar Apes e listá-los no site NFT Foundation. Seus apes “RR/BAYC” parecem idênticos aos Bored Apes originais. Inicialmente, ele recebeu um comunicado de remoção por violar a Lei de Direitos Autorais do Milênio Digital (ou DMCA) do Yuga Labs, entrou em disputa e Yuga o rescindiu.
Ripps considera isso como uma prova de que Yuga não está agindo muito para proteger seus holders. Ele também vendeu camisetas que contêm Apes dos quais não possui, sem ter sofrido consequências até agora.
“Para mim, a coisa mais maluca é que essa empresa gerou bilhões de dólares e convenceu pessoas com uma completa mentira, de que possuem os direitos comerciais desses desenhos”, disse Ripps pelo telefone. “O que realmente querem dizer é que não se importam com quem os usa e que não vão processar ninguém.”
Ripps não é antiNFTs. Sua crítica é contra especuladores que dominaram o setor. “Acredito que NFTs tenham seu lugar no mundo”, explica. “É uma pena que a galera que foi atraída a eles não está atraída na arte digital e os tratam como um cassino.”
Por enquanto, mesmo em meio a um inverno cripto, o cassino ainda está aberto.
*Artigo de opinião escrito por Daniel Roberts, editor-chefe do Decrypt.
**Traduzido por Daniela Pereira do Nascimento com autorização do Decrypt.co.