Vários dos principais bancos portugueses estão fechando contas bancárias de corretoras de criptomoedas que operam no país europeu. As medidas atingiram a CriptoLoja, primeira corretora de criptomoedas de Portugal a receber uma licença do Banco Central local para operar no país e atualmente controlada pela holding que possui o Mercado Bitcoin no Brasil.
No caso da CriptoLoja, o encerramento, feito na semana passada, partiu de instituições financeiras como o Santander e o Banco Comercial Português, entre outras. Em entrevista ao Portal do Bitcoin nesta quinta-feira (4) o CEO da CriptoLoja, Pedro Borges, classificou a medida como “um completo abuso” e disse que não recebeu nenhum aviso sobre o porquê da medida. Segundo ele, “a verdade é que os bancos não gostam da indústria cripto e agora decidiram fechar as contas”.
Segundo o executivo, diversas outras empresas cripto, mesmo as reguladas pelo Banco de Portugal, enfrentam problemas similares. De acordo com reportagem da agência Bloomberg, também chegaram a pelo menos outras duas exchanges, a Mind the Coin e a Luso Digital Assets.
Bancos desconfortáveis com cripto
“Recebemos as cartas dos bancos no final de maio, dizendo que em 60 dias nossas contas seriam encerradas oficialmente. Não nos deram nenhuma razão clara, mas sabemos que é porque o setor de compliance desses bancos não está confortável em trabalhar com empresas da área”, explica Borges.
Em comunicado enviado à Bloomberg, o Banco Comercial disse que precisa alertar as autoridades sempre que detectar “transações suspeitas”, que poderiam determinar a interrupção de relações comerciais. Um representante Santander disse à reportagem que o encerramento ocorre “de acordo com sua percepção de risco”.
No entanto, de acordo com Borges, foi justamente a situação regular da CriptoLoja junto ao BC português que levou a 2TM, holding do Mercado Bitcoin, a adquirir uma participação majoritária da corretora em janeiro deste ano.
“O que é difícil de entender é que nós somos regulados pelo Banco Central, como os bancos também são. Temos que seguir as regras que eles impõem, e nós seguimos. Ainda assim, preferem não ter negócio conosco e acham que o Estado não faz o seu trabalho”, critica Borges.
Ele explica que diferente do Brasil, em Portugal não há diferentes níveis de compliance cobrados pelos reguladores. A corretora precisa informar ao Banco Central as movimentações dos clientes, sejam elas grandes ou pequenas:
“O investidor precisa passar pelo compliance, seja para operar um euro ou um milhão de euros. Seguimos as regras de prevenção a lavagem de dinheiro e ao financiamento ao terrorismo, pedimos a origem dos fundos, fazemos auditorias externas, tudo isso.”
Para conseguir continuar oferecendo saques e depósitos em euro para os clientes, a CriptoLoja precisa agora recorrer a bancos estrangeiros, o que na visão de Borges está longe de ser o ideal.
Para ele, operar com um banco de fora do país “causa um empecilho para o negócio”, além de dificultar as operações rotineiras do dia a dia, como pagar salários dos funcionários, fornecedores externos e até mesmo os impostos cobrados pelo governo português.
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A guerra entre bancos e corretoras
O CEO da CriptoLoja compara a situação que sua empresa enfrenta agora com a que muitas corretoras de criptomoedas tiveram que lidar aqui no Brasil anos atrás, quando bancos do país também fecharam contas de forma indiscriminada.
“Nós estamos passando aqui em Portugal a mesma coisa que aconteceu no Brasil uns dois anos atrás. Os bancos daqui estão ainda mais atrasados, eles claramente ficam assustados com uma indústria que não conhecem. Quando há ignorância sobre algo, tende-se a reagir da pior maneira”, reflete Borges.
Já aqui no Brasil, os bancos que até pouco tempo atrás fechavam contas das corretoras, agora estão se tornando concorrentes das empresas do nicho cripto. O Santander — que encerrou a conta da CriptoLoja —, por exemplo, anunciou semana passada que vai vender bitcoin para seus clientes brasileiros daqui alguns meses.
Borges, no entanto, não acredita que o comportamento dos bancos de encerrar as contas seja uma questão de concorrência, mas sim uma falta de confiança na legitimidade das empresas do país.
Mais do que isso, ele afirma que alguns bancos estão tirando a liberdade dos clientes de enviar dinheiro para corretoras de criptomoedas.
“Além de encerrar as contas das empresas, alguns bancos não deixam pessoas normais transferir o próprio dinheiro para corretoras, o que é um completo abuso. Hoje mesmo eu estava conversando com um amigo que tentava mandar dinheiro para a Coinbase mas o banco, ao ver que o destino era uma exchange, não deixou realizar a transação”, conta.
Regulação como saída
Neste cenário, na visão do executivo a regulação do mercado de criptomoedas em Portugal é o caminho que pode colocar um basta nestes problemas que as corretoras enfrentam com as instituições financeiras do país.
“É preciso de uma regulação para fugir da lógica de faroeste que impera no mercado cripto daqui. Não só uma regulação preocupada com a parte financeira e tributária, mas com a parte comportamental, que faça os bancos pararem para entender a indústria.”
Esse cenário ideal, no entanto, pode demorar para se concretizar. Como explica Borges, as empresas do país esperam para que seja aprovada a MiCA (“Markets in Crypto Assets”), regulação que vai fornecer o quadro legal para o mercado cripto a nível europeu.
“Antes disso, eu espero que os bancos tenham o bom senso de voltar atrás, até mesmo para não prejudicar o país”, diz Borges. “Portugal era visto até ontem como um país muito amigável para o ambiente das criptomoedas. Obviamente que essa postura dos bancos não ajuda em nada a manter essa visão positiva sobre o ecossistema do país.”
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