A Igreja Universal do Reino de Deus deu início a uma ação no Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro contra Glaidson Acácio dos Santos e sua empresa de investimentos GAS Consultoria. De acordo com um ofício dirigido a uma vara cível de Cabo Frio, a Igreja Universal requer a comprovação pelas partes da origem dos cerca de R$ 72 milhões doados à entidade nos últimos 14 meses para poder esclarecer tais movimentações ao Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf).
O documento que o Portal do Bitcoin teve acesso está datado da última sexta-feira (27) e assinado por dois advogados e uma advogada do escritório Moraes Pitombo Advogados. A ação solicita a “tutela de urgência para que se determine aos Réus que apresentem, em 5 dias, os comprovantes das transferências e depósitos realizados em favor da Universal, bem como documentos fiscais que demonstrem a origem lícita dos valores doados”.
Nesse contexto, diz o escritório, embora tenha recebido referidas doações de absoluta boa-fé, com a devida contabilização da entrada dos recursos financeiros, a Igreja tem fundado receio quanto à origem lícita dos valores, que foram objeto de doação.
“AUTORA pretende a apresentação, pelos Réus, de documentos que comprovem a origem ou o lastro dos valores depositados a título de doação, no valor total de R$ 72.353.000,00 (setenta e dois milhões, trezentos e cinquenta e três mil reais), a fim de aferir a necessidade de prestar esclarecimentos e informações ao COAF, em relação às doações recebidas de forma aleatória”, diz um trecho do ofício.
Segundo o jornal Extra desta segunda-feira (30), relatórios da Polícia Federal e Ministério Público Federal apontam que apenas os 27 maiores destinatários de recursos das contas bancárias de Glaidson e da GAS receberam cerca de R$ 2,3 bilhões entre 2018 e 2020.
“A lista das transferências milionárias, que para a PF indicam lavagem de dinheiro, inclui empresas de consultoria, escritórios de advocacia, pessoas físicas e até a Igreja Universal do Reino de Deus”, diz a publicação.
Na ação, os advogados da Universal também requerem que o processamento da ação fique em segredo de Justiça, “a fim de preservar a imagem dos envolvidos e assegurar o sigilo das informações bancárias e fiscais, necessárias à comprovação da origem lícita dos valores doados”.
O documento argumenta, ainda, que as provas requeridas podem servir tanto para Igreja Universal quanto o Coaf no caso de eventuais medidas judiciais e extrajudiciais, “inclusive de natureza criminal, utilizando as provas produzidas para responsabilizar os envolvidos em eventuais ilicitudes”.
Glaidson se afastou da igreja após questionamentos
Conforme relata a Advocacia, Glaidson frequentava o templo da Igreja Universal na cidade de Cabo Frio, mas se desligou das reuniões quando começou a ser questionado — inclusive pelo bispo Jadson Santos, líder da entidade no estado do Rio de Janeiro — pelos altos valores doados à entidade, que foram notados a partir de maio do ano passado.
Segundo descreve o ofício, Glaison afirmava que “passava por fase de grande prosperidade econômica, a partir das atividades desenvolvidas nas áreas de tecnologia e produção de softwares”.
“Apesar da aparente justificativa, os valores das operações passaram a chamar muita atenção: nos últimos 14 (catorze) meses, Glaidson efetuou transferências da ordem de R$ 12.813.000,00 (doze milhões, oitocentos e treze mil reais), enquanto a empresa G.A.S. doou R$ 59.490.000,00 (cinquenta e nove milhões, quatrocentos e noventa mil reais), conforme demonstrado pela planilha anexa”, diz outro trecho descrito pelo escritório.
“Diante desses questionamentos, Glaidson acabou se desligando novamente da Igreja e deixou de frequentar os cultos em Cabo Frio, sem apresentar nenhuma explicação à AUTORA, que passou a buscar maiores informações, a partir de dados públicos”, descreve o ofício.
GAS Consultoria
Glaidson dos Santos foi preso na quarta-feira (25) no âmbito da operação Kryptos da Polícia Federal. O Ministério Público Federal (MPF) e a Receita Federal também participaram da ação. Outras quatro pessoas também foram presas. Após audiência de custódia na sexta (27), a Justiça Federal do Rio manteve a prisão preventiva do investigado, publicou O Dia.
Santos é acusado de ser o mentor de uma uma fraude bilionária por meio da GAS, empresa criada por ele e sua esposa Mirelis Zerpa que dizia trabalhar com criptomoedas e prometia pagar rendimentos de 10% por mês aos investidores. Zerpa está foragida.
O caso já estava sendo investigado pela PF há um bom tempo por suspeita da prática de crime contra a economia popular e lavagem de dinheiro. A Comissão de Valores Mobiliários (CVM) chegou a abrir em 2019 um processo administrativo para investigar a empresa.
Antes das prisões efetuadas na Operação Kryptos, constantes reportagens da Rede Globo denunciaram o suposto esquema de pirâmide. Glaidson, que segundo a empresa já teria planejado viagem ao exterior, foi preso antes de seguir com os planos.
Foi quando foram revelados os altos valores apreendidos por ordem judicial — cerca de R$ 150 milhões em bitcoins e R$ 13 milhões em espécie, além de carros de luxo e joias.