No último dia 5 de fevereiro, Marcelo d’Agosto, em sua coluna no Valor, lançou uma crítica contundente ao Bitcoin – uma crítica que, embora toque pontos relevantes, por vezes se mostra simplista e até equivocada.
Mas essa análise não serve para encerrar o debate; ao contrário, evidencia a necessidade de aprofundarmos a discussão sobre ativos digitais, longe de dogmas e purismos. Afinal, no universo cripto, onde algumas vozes intransigentes tratam o Bitcoin quase como se fosse uma religião, os mais de 400 profissionais do MB demonstram que a análise cuidadosa e o debate fundamentado com o mercado financeiro tradicional são o caminho para evoluir o setor.
A seguir, apresento uma análise ponto a ponto, com fatos, dados e reflexões que se impõem no debate sobre o Bitcoin:
- “Bitcoin não tem utilidade prática, mas as pessoas continuam comprando”
Se algo é adquirido consistentemente há mais de 15 anos, há algum valor que merece ser investigado a fundo. O Bitcoin acumula um valor de mercado de US$ 2 trilhões por um motivo: a criação da escassez digital via blockchain foi, desde o início, a verdadeira revolução.
Em um brilhante artigo de 2018, Nic Carter, da Castle Island Ventures, revisitou as múltiplas narrativas do Bitcoin – de dinheiro eletrônico a rede de pagamentos barata, de ouro digital resistente à censura a ativo financeiro descorrelacionado. Esse mosaico de funções, que se mistura e evolui com o tempo, demonstrou seu poder ao atrair nomes como Paul Tudor Jones e Stanley Druckenmiller – pioneiros do mercado tradicional que colocaram quantias relevantes de capital e inauguraram uma nova era para os gestores de recursos.
- “O Bitcoin poderia ser usado como meio de pagamento, mas perdeu essa vantagem”
A crítica de que o Bitcoin “perdeu” sua vantagem como meio de pagamento ignora sua trajetória evolutiva. Assim como o ouro, que deixou de ser utilizado como moeda corrente para se transformar em reserva de valor, o Bitcoin trilhou um caminho similar.
Sim, os custos de transação podem oscilar, mas o verdadeiro mérito do Bitcoin reside em sua capacidade de viabilizar transferências bilionárias com tarifas ínfimas e que são confirmadas em poucos minutos, um feito impensável no sistema financeiro tradicional.
É crucial lembrar que, quando Satoshi Nakamoto lançou o whitepaper, sua proposta era a de um novo sistema de dinheiro eletrônico – uma ideia que, tal qual diversas outras invenções ao longo da história, evoluiria de maneira imprevisível e revolucionária.
- “A quantidade fixa de bitcoins gera um problema”
Aqui, a crítica se mescla com uma das virtudes mais marcantes do Bitcoin. O algoritmo que gera novos bitcoins a cada dez minutos – limitando a oferta total a 21 milhões – não é um defeito, mas sim uma característica de notável elegância.
Com a oferta definida, o preço é determinado pela demanda, que é fortemente influenciada pelos avanços na adoção, pela ampliação do entendimento do ativo por um público cada vez maior e pelos movimentos regulatórios, que se alternam de forma quase binária em cenários políticos e econômicos. Essa volatilidade é inevitável, pois reflete as constantes mudanças do mercado, mostrando que as oscilações – sejam elas altas ou quedas abruptas – ocorrem com um racional subjacente, em nítido contraste com as interpretações simplistas do autor.
- “Com a mudança de governo nos EUA, discute-se a criação de uma reserva estratégica de Bitcoin”
Esse ponto, por si só, já refuta a tese de que o Bitcoin carece de função. Se governos – e não só investidores particulares – passam a considerar o Bitcoin um ativo estratégico, é inegável que encontramos nele uma utilidade que transcende o mero especulativo. Ora, ora, parece então que finalmente encontramos uma utilidade para o Bitcoin!
A postura da administração Trump em relação ao setor cripto, com a discussão sobre incorporar o Bitcoin às reservas nacionais, deve se tornar um dos marcos mais revolucionários da história financeira moderna.
Leia Também
- “Economistas tradicionais são críticos ao Bitcoin”
É interessante notar que muitos economistas de renome também criticaram, por exemplo, o modelo de startups de alto crescimento. Sem esse modelo, Google, Amazon e Meta simplesmente não existiriam.
Marcelo cita, por exemplo, Eugene Fama, Prêmio Nobel de Economia, que chegou a afirmar que a chance de o Bitcoin valer zero em dois anos seria “muito perto de 1”. Contudo, como mostram os dados: o Bitcoin existe há 15 anos, nunca voltou a zero e hoje integra cada vez mais o sistema financeiro global com um market cap que se aproxima dos US$ 2 trilhões, além de contar com a aprovação massiva de ETFs que possibilitam atender a até mesmo estimular a demanda pelo Bitcoin.
É muito conveniente concordar com um Nobel. Nesse caso, eu ouso discordar. Assim como certamente o fazem meus colegas de MB, sempre embasados em dados e abertos ao debate.
- Um chamado ao debate
É irresponsável que grandes profissionais de investimento ignorem o que está acontecendo. Muitos seguem focados apenas nos mercados em que se sentem confortáveis, negando uma transformação global e deixando de, no mínimo, apresentar as alternativas do mundo cripto aos seus clientes.
Quando o assunto é Bitcoin ou criptoativos, a reação muitas vezes deixa a desejar: ao invés de analisar com seriedade, preferem descartar sem sequer entender o que acontece. É fácil arrumar uma desculpa. “É usado para crimes”, “é pirâmide”, “já subiu muito”. Mais difícil é mergulhar e compreender a transformação.
Felizmente, no Brasil, esse cenário está mudando. No MB, temos um relacionamento cada vez mais próximo com gestores de recursos, agentes autônomos e consultores de investimento, porque entendemos que educação é parte da nossa missão.
Sem deboche, sem arrogância — apenas dados, informação e diálogo.
Ainda está cedo para entender tudo. Ninguém está atrasado. Mas quem se recusa a olhar para essa revolução pode estar desperdiçando uma das maiores oportunidades da história dos mercados.
No Digital Horizons, evento promovido pelo MB no começo dessa semana, tivemos debates de altíssimo nível sobre o futuro dos criptoativos, tendo a administração Trump como pano de fundo. Esses encontros são essenciais para que o setor cripto e o mercado financeiro tradicional conversem de forma produtiva.
O convite está feito, Marcelo: junte-se a esse debate, aprofunde-se na análise e, sobretudo, olhe para o futuro.
Sobre o autor
Fabricio Tota é Diretor de Novos Negócios do MB | Mercado Bitcoin. Com mais de duas décadas de experiência no mercado financeiro, Tota explora no MB o potencial de novas tecnologias do universo cripto, como DeFi, CBDCs, NFTs e fan tokens, além de manter um olho nas tendências emergentes do setor.