A CPI das Pirâmides Financeiras propôs em seu relatório final, aprovado pelos deputados na noite de segunda-feira (9), a criação pelo Congresso Brasileiro de três projetos de leis (PL) para o mercado de criptomoedas e um para o mercado de milhas aéreas.
De acordo com a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI), os PLs visam aprimorar a legislação penal para punir fraudadores, disciplinar influenciadores e tornar transparente os programas de milhas.
Veja abaixo o que propõem cada um dos projetos de lei focados no mercado de criptomoedas:
1 – Aprimora legislação para punir pirâmides financeiras
Altera Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), a Lei nº 1.521, de 26 de dezembro de 1951 e a Lei 7.492, de 16 de junho de 1986.
O primeiro projeto de lei proposto visa “aprimorar a legislação penal com relação às formas de obtenção de ganhos ilícitos através de processos fraudulentos, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar”.
A Comissão Parlamentar de Inquérito justificou a proposta ressaltando os vários casos de pirâmides financeiras envolvendo criptomoedas — “aliados a uma publicidade atraente” — que têm gerado grande prejuízo aos investidores brasileiros.
“Chegaram ao conhecimento desta CPI diversos relatos de pessoas que investiram todos os seus recursos em esquemas criminosos, e algumas, sem nenhuma perspectiva de receber suas economias de volta, tiraram suas vidas”, descreve o documento.
A Comissão diz que embora a lei 1.521 trate dos crimes contra a economia popular, ela está desatualizada e carece de especificidade quanto à tipificação de pirâmides financeiras ou crimes parecidos que “devem ser tratadas com o rigor condizente com os atos perpetrados”.
“Assim, visando sanar essas deficiências, o presente expediente promove modificações significativas no nosso arcabouço jurídico, que vão desde a criação de tipo penal próprio na Lei dos Crimes contra a Economia Popular e a ampliação do alcance dos crimes da Lei 7.492, de 1986, para alcançar ativos virtuais e quaisquer ativos financeiros, até a criação de tipo específico na Lei de Crimes Financeiros.”
Vale lembrar que no Senado já avança um outro projeto de lei (3.706/2021), que cria a tipificação do delito de constituição de pirâmide financeira e a intermediação ou a negociação de criptomoedas com o objetivo de praticar crimes.
2 – Cria regras para empresas atuarem no setor cripto, impõe segregação patrimonial e proíbe oferta de derivativos sem autorização da CVM
Cria a Lei e altera o Art. 3º da Lei nº 13.506, de 13 de novembro de 2017.
A Comissão diz que esse novo projeto de lei visa estabelecer requisitos para a autorização do funcionamento de prestadores de serviços de criptomoedas, como capacidade econômico-financeira dos controladores e se os recursos usados no negócio são lícitos.
Conforme descreve o documento, o PL também torna obrigatória a transferência de recursos entre usuários e prestadores de serviços por meio de contas de depósito ou de pagamento individualizadas.
Dispõe também sobre a segregação patrimonial entre prestadores de serviços e usuários do setor cripto ao determinar a constituição de recursos separados, e proíbe a oferta ou a negociação de derivativos sem a autorização da Comissão de Valores Mobiliários.
“Art. 3º Constitui infração punível com base neste Capítulo: I – realizar operações no Sistema Financeiro Nacional, no Sistema de Consórcios, no Sistema de Pagamentos Brasileiro e a prestação de serviços de ativos virtuais em desacordo com princípios previstos em normas legais e regulamentares que regem a atividade autorizada pelo Banco Central do Brasil.”
A Comissão justificou a criação do PL descrevendo situações envolvendo corretoras de criptomoedas que despertam “graves preocupações” no que se refere ao uso irregular de ativos, bem como a prática de lavagem de dinheiro ou remessa ilegal de recursos para o exterior.
“É fundamental aprimorar a legislação aplicável ao setor. Hoje, é possível que exchanges de criptoativos prestem serviços a – e recebam recursos de – investidores brasileiros sem que sequer tenham uma pessoa jurídica constituída no Brasil”, diz a proposta.
3 – Estabelece regras para contratos de publicidade entre empresas de criptomoedas e influenciadores
A terceira proposta da Comissão é que uma nova lei seja criada para disciplinar a contratação de influenciadores digitais para qualquer tipo de anúncio ou propaganda relativo a criptomoedas onde houver benefícios e vantagens para as partes.
“A relação contratual onerosa entre influenciador e seu contratante — ou contratos feitos por intermediários — deve ser divulgada por meio de aviso, de forma clara e facilmente visível, em todas as manifestações do influenciador a respeito dos produtos ou serviços anunciados”, diz um trecho do texto.
Outro ponto diz que se torna obrigatória às empresas contratantes a disponibilização na internet da relação de todos os influenciadores contratados nos últimos cinco anos.
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Fora isso, o contrato por escrito deve conter a descrição detalhada do escopo e do tipo de publicidade a ser feita, bem como a descrição da remuneração do influenciador e de quaisquer outros benefícios e vantagens por ele recebidos.
Como justificativa para a criação do PL, a Comissão disse que ao longo dos trabalhos da CPI das Pirâmides Financeiras foi constatado que muitos criminosos que organizaram pirâmides financeiras se valeram da contratação de influenciadores digitais para atrair vítimas para seus golpes.
“O presente Projeto de Lei busca jogar luz sobre a relação entre os influenciadores e aqueles que os contratem para qualquer anúncio ou publicidade relacionada a ativos virtuais. Assim, acreditamos ser possível alcançar alguns objetivos”, diz a Comissão, que acrescenta dois pontos.
O primeiro se refere a “aumentar o risco reputacional dos influenciadores” devido a seus nomes serem publicados pelos seus respectivos contratantes: “Os influenciadores terão prejuízos para suas reputações caso algum dos seus contratantes esteja envolvido em pirâmides financeiras e fraudes semelhantes.”
Dessa maneira, o projeto de lei visa incentivar os influenciadores a serem mais prudentes ao analisarem propostas de contratação para publicidade ligadas ao mercado cripto.
Em segundo lugar, continua o texto, “a necessidade de elaboração de documentos formais – especialmente um contrato com conteúdo determinado em lei – fará com que eventuais investigações sobre a participação de influenciadores em esquemas de pirâmides tenham mais subsídios”.
“Ao exigirmos dos influenciadores certificações para determinados tipos de anúncios, evitamos condutas irresponsáveis de pessoas que recomendam produtos ou serviços sem a expertise necessária para tanto”, conclui.
Programas de milhagem também ganham projeto de lei
A Comissão também incluiu os programas de milhagem nas propostas de projetos de lei. O texto prevê todos os direitos e obrigações das empresas aéreas acerca do tema, como possuir regulamentos de fácil acesso e públicos, além de dispor de canais de comunicação próprios para contato direto com os participantes.
As empresas devem destacar publicamente cláusulas que prevejam qualquer penalidade ou restrição ao direito de utilização das milhas pelas participantes, bem como disponibilizar saldo e extrato para o usuário, e também promover “alternativas para utilização das milhas pelos participantes, além da emissão de passagens aéreas”.
“Entre as alternativas para utilização de milhas previstas no caput, deverá ser oferecida aos participantes a possibilidade de obtenção de reembolso das milhas compradas diretamente da empresa administradora de programa de milhagem, na forma prevista no regulamento do programa”, diz um trecho do PL.
Fora isso, as empresas ficam comprometidas a fornecerem aos entes regulatórios relatório anual contendo as quantidades de milhas emitidas e expiradas, de participantes dos programas, além de outras informações consideradas relevantes pelos reguladores.
A Comissão justificou o PL discorrendo sobre o caso da empresa 123 milhas “que vendeu aos seus clientes promessas de emissão de bilhetes que, muitas vezes, ainda não eram sequer oferecidos pelas companhias aéreas”. O texto também relembra que antes de cumprir com o dever assumido de entregar as passagens aos compradores, a empresa se declarou insolvente e apresentou pedido de recuperação judicial.
“Ao longo dos trabalhos, percebemos que não é possível resolver problemas relacionados à intermediação de milhas sem antes enfrentar questões relacionadas aos direitos dos seus titulares. É isto que este Projeto de Lei busca fazer”, justifica a Comissão.
Segundo os deputados, “merece especial destaque a criação do direito do participante ao reembolso, ao menos parcial, do valor pago pela compra de milhas”.
Por fim, concluiu o texto, “para evitar os graves problemas verificados na infame Linha Promo da 123 Milhas, estamos proibindo que, na venda comissionada e intermediada de passagens aéreas e hospedagens, o intermediador receba pagamento dos seus clientes contra simples promessa de aquisição futura do serviço contratado”.
Caso a lei entre em vigor, as empresas do ramo terão 12 meses para se adaptarem as novas regras.
Entenda os poderes de uma CPI
A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que investigou pirâmides financeiras que usaram criptomoedas para enganar investidores brasileiros foi instaurada na Câmara dos Deputados em Brasília no dia 13 de junho.
O deputado federal Aureo Ribeiro (Solidariedade-RJ), que propôs a formação da comissão, foi eleito o presidente da CPI. O político não teve competição e foi eleito com 15 votos a favor e dois em branco.
As comissões parlamentares de inquérito têm poderes de investigação semelhantes às autoridades judiciais, e fornecem ao Parlamento uma forma de exercer sua atividade fiscalizadora na prática.
Conforme dita a Lei nº 1.579/52, essas comissões podem ser abertas somente para apurar um fato determinado e por um curto período de tempo. Entre os poderes que a CPI concede aos parlamentares está o de convocar autoridades, requisitar documentos e quebrar sigilo bancário, fiscal e telefônico pelo voto da maioria dos integrantes da comissão.
Uma CPI não processa nem julga os suspeitos, apenas investiga seus possíveis delitos. Porém, no âmbito dessas investigações, a comissão tem uma série de poderes, como inquirir testemunhas e quebrar sigilos bancários, fiscais e de dados.
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