Índia: futuro polo tecnológico blockchain ou mais uma nação sem criptomoedas?

Segundo o autor, a postura oficial do governo indiano tende para um certo protecionismo, abrindo espaço para uma CBDC, a rúpia digital
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(Foto: Shutterstock)

Ao longo dos últimos anos, muitos países assumiram posturas mais concretas e objetivas em relação à tecnologia blockchain e às criptomoedas.

Na vanguarda da pesquisa, inovação e registro de patentes em blockchain está a China, cujo governo já adicionou este tópico às prioridades científicas nacionais. A Índia, porém, também vem conquistando território e ganhando cada vez mais destaque. 

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O governo da Índia, através do Ministério de Eletrônica e Tecnologia da Informação, publicou um plano de ação em dezembro de 2021. A exemplo do que já fez a China, o documento de 52 páginas apresenta estratégias detalhadas para guiar o país, ao longo dos próximos 5 anos, em direção ao desenvolvimento em tecnologia blockchain.

Entre os objetivos estão o fortalecimento e incentivo à inovação, ao cultivo de habilidades e à capacitação profissional em blockchain, à integração da Índia com o cenário global e à criação de um padrão blockchain nacional.

A Índia já ocupa posições importantes em alguns rankings mundiais: é o terceiro país mais atrativo, quando se trata de investimentos em tecnologia, e está entre as cinco nações com os maiores programas de exploração espacial.

Também está entre os líderes na pesquisa científica mundial, com 1019 universidades. No Índice de Inovação Global (GII), com 50 países, a Índia está na posição 46. Nesse contexto, o país se destaca ainda mais nos campos de informática e TI. A injeção de capital em TI esperada para 2022 é de US$ 98,5 bilhões. 

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Fica clara a prioridade nacional dada ao desenvolvimento científico e tecnológico, inclusive como forma de se impulsionar o desenvolvimento econômico.

A atenção que está sendo dada à tecnologia blockchain, que é frequentemente correlacionada ao futuro da internet e de vários outros segmentos tecnológicos e financeiros, surge do interesse indiano de se manter à frente e de impulsionar sua liderança mundial nesses setores.

A multiplicação dos empregos e cursos em blockchain na Índia

Está havendo uma explosão no número de posições de trabalho relacionadas a blockchain na Índia. Só em 2021, o aumento foi de 37%, acumulado em 138% desde 2018.

A maior motivação tem sido o aumento da quantidade de projetos em blockchain iniciados pelas empresas. O aumento na procura por profissionais capacitados é grande: as desenvolvedoras de software, por exemplo, viram um acréscimo anual de 76% das vagas de trabalho. Esse fenômeno também induz a um outro fenômeno paralelo: o crescimento da oferta de cursos de capacitação em blockchain.

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As vagas estão sendo criadas em universidades, plataformas e outras instituições de ensino, que já estão se antecipando à demanda crescente mostrada pelo mercado.

Um exemplo é o curso lançado recentemente pelo “Instituto Nacional de Tecnologia” (NIT), em Andhra Pradesh, voltado “para engenheiros de ciência da computação e pesquisadores que se interessem por blockchain, além de profissionais de TI que trabalhem com arquitetura, desenvolvimento e operação de redes blockchain”.

O mais recente posicionamento legal da Índia sobre as criptomoedas

Apesar do alto interesse nacional na tecnologia blockchain, a Índia não se mostra especialmente receptiva em relação às criptomoedas. Atualmente, possuir ou operar criptomoedas na Índia não é ilegal, contudo não existe legislação específica. As criptomoedas são consideradas investimentos, mas não são moedas de curso legal.

Foi no dia primeiro de fevereiro deste ano que o governo fez menção, pela primeira vez, a um projeto de lei (a ser implementado) que tratará desse assunto. A comunicação foi feita de forma verbal pela Ministra das Finanças Nirmala Sitharaman, enquanto apresentava o orçamento nacional de gastos para 2022. Essa divulgação oficial foi bastante comemorada, mas gerou bastante controvérsia.

Isso porque, de acordo com a ministra, o governo pretende recolher impostos no valor de 30% sobre lucros gerados por quaisquer transações envolvendo criptomoedas, e no valor de 1% diretamente sobre essas transações. A comunidade, especialmente as corretoras de cripto, considera os altos valores de taxação como impraticáveis.

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Se serão recolhidos impostos, há a expectativa de que o governo irá legalizar a utilização e posse de criptomoedas, mas nenhuma menção oficial foi feita sobre isso. Investidores se mantêm apreensivos e analisando a fundo a declaração da ministra, até mesmo pela escolha de palavras feita por ela: “ativos digitais virtuais”, ao invés de “criptomoedas”. 

Rúpia digital vs. criptomoedas

Também foi anunciado pela ministra que a Índia fará o lançamento da rúpia digital, a criptomoeda nacional (CBDC), ainda no ano financeiro de 2022. Apesar do claro incentivo nacional à pesquisa em blockchain, o governo nunca mostrou a mesma receptividade com o Bitcoin, Ether e outras criptos. A postura oficial vem tendendo para um certo protecionismo.

A expectativa mais realista é de que a Rúpia Digital se torne a única moda digital oficialmente caracterizada como moeda de curso legal, e todas as outras criptomoedas sejam restringidas. Ainda seria possível negociá-las como investimentos e usá-las na compra de NFTs (operações que seriam devidamente taxadas), porém elas não poderiam ser usadas como meios de pagamento em compras genéricas.

Sobre o autor

Fares Alkudmani é formado em Administração pela Universidade Tishreen, na Síria, com MBA pela Edinburgh Business School, da Escócia. Naturalizado Brasileiro. Atua como Business Development Manager Brasil na Kucoin.