Há todo tipo de golpe no mercado de bitcoin no Brasil, mas este vai além de tudo que é conhecido. Um grupo conseguiu roubar R$ 30 milhões de uma conta da metalúrgica Gerdau no banco Santander e, a seguir, tentou usar o dinheiro para comprar bitcoins no mercado brasileiro.
O Portal do Bitcoin teve acesso ao boletim de ocorrência, registrado no dia 20 de abril, e ao processo, feito no dia seguinte, no qual o banco espanhol pede ao Ministério Público do Rio Grande do Sul a abertura da investigação por furto qualificado em uma agência sediada em Porto Alegre.
O documento mostra que no dia 16 de abril a Gerdau informou ao Santander do problema, que assumiu o prejuízo. Conforme a investigação interna, os desvios ocorreram após um tipo até então desconhecido de invasão feito no internet banking da metalúrgica. Em seguida, foram realizadas 11 TEDs para diferentes locais.
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Os valores foram transferidos para quatro empresas situadas em São Paulo, Rio Grande do Sul e Rondônia para contas de outros bancos. A rápida atuação permitiu que o Santander monitorasse o caminho do dinheiro, que acabou chegando em OTCs brasileiras.
A fraude é tão complexa que causou estranheza à própria investigação interna. O singular é que as transferências não foram feitas a partir de um login da conta da Gerdau. O débito foi efetuado por uma outra empresa, também correntista, situada na região metropolitana de Porto Alegre chamada Mundial Iluminação.
Por meio do internet banking da Mundial, os golpistas conseguiram programar e realizar as TEDs. Ao final da operação houve uma manipulação da codificação do canal do interno do sistema. Ou seja: o dinheiro não saiu da conta da empresa que estava logada, a Mundial, mas sim da Gerdau.
“É como se uma conta bancária corporativa tivesse invadido outra conta bancária corporativa para a ordem de débito ao banco”, diz a investigação enviada ao Ministério Público.
Conforme a investigação interna, todas as transações foram feitas de um mesmo IP. A fraude vinha sendo programada desde a semana anterior. Seis dias antes do golpe, o Santander travou uma operação da Mundial Iluminação por se tratar de um alto valor fora do padrão da movimentação da empresa — um procedimento comum de segurança.
O responsável pela empresa entrou em contato com o banco e solicitou a liberação de risco da conta corrente para permitir a liberação da transação de valores elevados, o que preparou as altas movimentações na semana seguinte.
Comprando Bitcoin
Embora não conste na investigação interna do Santander, o dinheiro roubado foi usado para tentar comprar bitcoin nos OTCs (operações de grandes volumes) no mercado brasileiro.
Em conversas com oito pessoas envolvidas com o caso, o Portal do Bitcoin descobriu que os golpistas tentaram comprar R$ 30 milhões em criptomoedas, provocando uma tempestade de bloqueios de contas bancárias onde quer que o dinheiro tenha passado.
Qualquer empresa ou p2p que tenha recebido uma fração do dinheiro roubado do Santander teve a conta indisponibilizada.
Três pessoas envolvidas questionadas pela reportagem confirmaram que tiveram contas travadas por diferentes bancos. Uma quarta negou a participação, embora tenha sido mencionada por cinco pessoas diferentes.
Não foi possível confirmar quantos bitcoins foram entregues aos golpistas, já que os valores divergem entre as pessoas consultadas — de R$ 3,5 milhões a R$ 15 milhões. O certo é que não foi valor total, pois o compliances de algumas empresas flagraram inconsistências antes que a venda fosse efetuada.
“Como era um valor muito alto, de R$ 5 milhões, a gente pediu um extrato da conta de origem. Quando percebemos que o dinheiro que recebemos tinha entrado na conta de origem no mesmo dia, nós travamos operação. Imediatamente, o cliente começou a me pressionar para que eu enviasse os bitcoins, mas não mandei. Pouco tempo depois, o banco bloqueou a minha conta”, disse o dono de uma OTC, que pediu para não ser identificado.
Até onde se sabe apenas um p2p pode estar envolvido diretamente com o golpe. Os demais OTCs e p2ps brasileiros não sabiam da origem do dinheiro e podem ter relaxado demais os procedimentos de checagem do cliente.
Questionados sobre o caso, o banco Santander e a metalúrgica Gerdau afirmaram que não iriam se manifestar.