Governo nega recurso da Worldcoin e suspende compra de íris por criptomoedas no Brasil

Worldcoin foi ordenada a suspender serviços de comprar de íris por criptomoedas pela Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD)
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O recurso da Worldcoin para que fosse adiada a suspensão do serviço de escaneamento de íris por troca de criptomoedas no Brasil foi negado pela Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD). Ou seja, esse serviço da empresa está proíbido no território brasileiro.

A decisão foi publicada nesta terça-feira (11)  Diário Oficial da União e mantém a suspensão da concessão de compensação financeira, seja em criptomoeda (WorldCoin – WLD) ou em qualquer outro formato, para identidades digitais (World ID) criadas pela coleta de íris de titulares de dados pessoais no Brasil. 

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No recurso, a empresa havia solicitado prazo adicional de 45 dias para implementar mudanças no aplicativo e interromper a oferta de compensação financeira, mas o pedido foi negado. 

Porém, o Conselho Diretor da ANPD entendeu que a suspensão do pagamento pode ser realizada por outros meios, incluindo o adiamento dos agendamentos, até que o ajuste no aplicativo seja efetuado. Dessa forma, a suspensão da compensação financeira associada à coleta de íris deverá ser realizada imediatamente após a intimação.  

A diretora Miriam Wimmer, relatora do caso, destacou que a compensação financeira oferecida pela empresa configura uma interferência indevida na livre manifestação de vontade dos titulares de dados, e agrava o caso o fato da tecnologia envolvida ser nova e desconhecida. 

“A existência de contrapartida financeira constitui uma intervenção do controlador, que, na prática, implica uma interferência indevida sobre a manifestação de vontade autônoma do titular, razão pela qual o consentimento obtido não pode ser qualificado como livre. O risco decorrente do vício do consentimento no caso em análise é ainda maior considerando-se que o serviço ofertado pela recorrente se baseia em uma tecnologia emergente e inovadora”, disse Wimmer em seu voto.

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Wordlcoin proibida no Brasil

No final de janeiro, a Tools for Humanity (TfH), empresa responsável pela coleta de íris feita no projeto da Worldcoin, foi proibida de oferecer criptomoedas ou outros tipos de remuneração em troca dos dados de brasileiros. A medida foi aplicada pela Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD).

A Worldcoin, posteriormente rebatizada de World, é um projeto criado por Sam Altman, criador da OpenAI, para coletar íris das pessoas ao redor do mundo e fazer um registro em blockhain desse traço que é único em cada pessoa da Terra.

O objetivo, segundo a empresa, é permitir que as pessoas tenham a habilidade de comprovar a própria identidade em um mundo altamente digital. A empresa paga uma recompensa pela coleta em tokens WLD, que no momento é um montante que equivale a cerca de R$ 700.

Boulos pede investigação do MPF

Em janeiro, o deputado federal Guilherme Boulos (PSOL-SP) entrou com um pedido para que o Ministério Público Federal investigue a extração de dados feita pelos idealizadores da Worldcoin (WLD). O parlamentar ressalta que, além da palavra da empresa, nada garante que no futuro os dados pessoais não sejam repassados para fins não autorizados. 

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Segundo o deputado, um exemplo de como isso poderia se voltar contra a pessoa é que os planos de saúde poderiam negar determinados tratamentos médicos. Outra grande preocupação do deputado é o uso dos dados para fraudes financeiras, em um cenário no qual criminosos poderiam acessar o material e abrir conta em nome de terceiros desavisados.

Recompensa em dinheiro pode prejudicar consentimento

Em novembro de 2024, a ANPD, por meio da Coordenação-Geral de Fiscalização (CGF), instaurou processo de fiscalização para analisar o tratamento de dados biométricos para fins de criação da chamada World ID. Segundo a empresa, a World ID permitiria a comprovação de que o titular é um ser humano único vivo e promoveria maior segurança digital em contexto de ampliação das ferramentas de inteligência artificial. 

Em análise preventiva, a Coordenação-Geral de Fiscalização entendeu que a concessão de contrapartida pecuniária pela empresa, por meio da oferta de criptomoedas, pode prejudicar a obtenção do consentimento do titular de dados pessoais. 

Nos termos da LGPD, o consentimento para o tratamento de dados pessoais sensíveis, como é o caso de dados biométricos, precisa ser livre, informado, inequívoco e fornecido de maneira específica e destacada, para finalidades específicas.  

Em sua análise, a CGF entendeu que a contraprestação pecuniária oferecida pela empresa pode interferir na livre manifestação de vontade dos indivíduos, por influenciar na decisão quanto à disposição de seus dados biométricos, especialmente em casos nos quais potencial vulnerabilidade e hipossuficiência tornem ainda maior o peso do pagamento oferecido.  

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Worldcoin pelo mundo

Lançado em julho de 2023 pela Tools for Humanity, o World Orbs, ferramenta que faz a coleta das íris, foi recebida com fascínio e desprezo, já que os defensores da privacidade a chamaram de ferramenta de vigilância. Logo após seu lançamento, a França e a Alemanha abriram investigações sobre o projeto e seus Orbs.

Altman buscou resolver problemas futuros implementando recursos projetados para amenizar as preocupações dos reguladores e formuladores de políticas.

“Ele tem um cartão SD totalmente removível que contém todas as instruções de operação para que qualquer um possa comparar essas instruções no cartão SD com nosso código-fonte publicado”, disse o executivo.

Vale destacar, porém, que o projeto já foi suspenso em diferentes países, com reguladores questionando a privacidade dos usuários e as conformidades da empresa com as leis de cada região.