A transferência de recursos durante períodos de conflitos e guerras modernas se tornou mais complexa nas finanças tradicionais, principalmente devido ao sistema integrado do SWIFT, que permite às potências ocidentais a possibilidade de impor sanções e bloqueios nas transferências.
Exemplos podem ser vistos nas sanções à Coreia do Norte, bem como à Rússia, após a entrada na guerra contra a Ucrânia. Uma alternativa a esse sistema, é a utilização de criptoativos que, por não possuírem intermediários, não podem ser censurados (pelo menos quando em auto-custódia).
A Chainalysis, empresa focada em dados On-Chain e serviços para blockchains, realizou um estudo na qual rastreou carteiras marcadas como associadas ao terrorismo, e notou que apenas uma pequena parte dos recursos enviados para service providers acabava nas wallets dos terroristas, de quase US$ 83 milhões processados, apenas US$ 450 mil terminaram nas mãos erradas, cerca de 0,5% do total.
Obviamente, qualquer recurso enviado para estes fins é negativo, mas o ponto é que cripto ainda não é uma ferramenta conhecida e utilizada em larga escala por estes atores.
Repare, porém, que, apenas transferir dinheiro por cripto não resolve o problema, a Binance e a Tether, por exemplo, anunciaram o bloqueio de, respectivamente, 100 contas que estariam associadas ao financiamento do Hamas e US$873 mil em USDT associados a terroristas.
É de extrema importância ressaltarmos o papel da custódia nesses casos, o tradicional clichê ‘not your keys, not your coins’ se aplica perfeitamente nesta situação. E não são só nesses eventos de conflitos que isso fica evidente, com a derrocada da FTX e diversos outros custodiantes de cripto, como a Celsius e a BlockFi, os usuários perderam acesso a ‘seus’ fundos, justamente por não serem realmente ‘seus’.
É claro que existe um outro lado nessa história, manter um saldo em exchanges facilita muito a obtenção de liquidez dos ativos e permite maior celeridade em movimentações e alterações nos portfólios, mas isso vem ao custo de perda ou bloqueio total dos ativos e deve ser ponderado pelo investidor ou instituição envolvida.
Existem outras críticas associadas também à infraestrutura, hoje em dia o SWIFT processa cerca de 42 milhões de mensagens financeiras por dia, em média. Apesar de a cada dia visualizarmos avanços em cripto, ainda estamos longe de ter essa capacidade na indústria, principalmente quando se trata de transações em moedas de privacidade, ou por meio de mixers.
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Para se ter uma ideia, o principal mixer da rede da Ethereum, o Tornado Cash, tem apenas 12.250 usuários únicos, que realizaram apenas 165 mil depósitos desde a criação da aplicação em 2019, conforme dados do Dune Analytics.
Apenas criptoativos de privacidade e mixers podem ser utilizados para evasão de sanções e outros crimes cibernéticos, e estes ainda representam pouquíssimo volume perto de outras ferramentas.
Grande parte do ainda pequeno volume de criptoativos trafega em redes transparentes e não pode ser utilizado para esse fim. Outra parte também está em posse de entes centralizados, que podem exercer censura e travar os montantes envolvidos por tempo indeterminado.
Porém, a possibilidade de se realizar esses movimentos, pode atrair interesses de todos os lados envolvidos, sejam eles positivos ou negativos.
Além disso, substituir o sistema SWIFT, pelo menos no nível de infraestrutura atual, está fora de questão, haja vista a necessidade de grande escalabilidade envolvida.
É possível concluir então que censuras continuarão ocorrendo e o sistema deverá evoluir consideravelmente nos próximos anos, caso deseje se tornar o modelo padrão de remessa de dinheiro internacional.
Sobre o autor
Rony Szuster é Engenheiro Químico com pós-graduação em Engenharia de Software, imerso no mercado cripto desde 2019 e contribuidor do Messari Hub desde 2021. Atualmente integra a equipe de analistas de criptoativos do Mercado Bitcoin.
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