No último dia 7 de agosto, o Banco Central anunciou o nome oficial do real digital, DREX – pronuncia-se “dréx”, sem as letras separadas, sendo “D” referente a “digital”, “R”, a “real”, “E”, a “eletrônico” e “X” a “transação”, como explicou o economista Fábio Araujo, coordenador do projeto. A expectativa é que a fase de testes termine no final de 2024, quando o real digital passará a ser usado na prática.
O anúncio é o passo mais recente de um projeto que vem sendo desenvolvido desde que o BC criou, em 2020, um grupo de trabalho para avaliar o tema e que, no início deste ano, evoluiu para a criação de uma plataforma-piloto de testes da nova moeda. A rigor, o real digital é classificado como uma CBDC (“Central Bank Digital Currency” ou Moeda Digital de Banco Central), tema que vem ganhando força no mundo inteiro.
O anúncio do nome da CBDC brasileira é mais um movimento da aceitação e, mais que isso, da regulamentação do mercado cripto. Antes vistas com certa desconfiança pelos grandes players do mercado financeiro, as criptomoedas e, sobretudo, seu ecossistema (que envolve, além das próprias criptos, mecanismos de registro em blockchain, por exemplo, além da tokenização de ativos) vêm ganhando cada vez mais importância.
Tema relegado até há alguns anos a segundo plano por boa parte dos “bancões”, o uso de blockchain passou a ser visto como uma ferramenta de ganho de eficiência com segurança, justamente em um segmento em que os velhos sistemas legados muitas vezes ainda predominam. Não por acaso, a pesquisa anual de Tecnologia Bancária da FEBRABAN mostra que 67% dos gestores consideravam o tema blockchain uma prioridade.
Mas, afinal, por que tokenizar a economia implica ganhos de eficiência? Em primeiro lugar, vale voltar a um conceito básico, o de que a tokenização é a representação digital de instrumentos financeiros ou ativos já conhecidos. Nesse sentido, tende a diminuir o número de intermediários financeiros em um processo, garantindo – voltamos a destacar! – toda segurança nesse processo.
A tokenização e o uso de blockchain são uma evolução natural de um mercado que começou justamente com as criptomoedas. “Early adopter” por definição (vide a velocidade com a que as novas mídias sociais ganham espaço por aqui), o brasileiro comprou a ideia dos criptoativos, a ponto de o país já contabilizar 6,3 milhões de investidores em ativos digitais segundo pesquisa da ANBIMA.
Em cerca de uma década, as criptomoedas alcançaram o tamanho do centenário mercado de Bolsa, que contabiliza, hoje, cerca de 6 milhões de contas de PFs abertas em corretoras.
Diante dessa evolução, é natural a entrada do BC, via DREX ou regulação – e muito bem-vinda -, seja pela simples presença do órgão regulador no tema, seja pelo fato de estar “construindo” o real digital “a muitas mãos”, com a participação do mercado.
O real digital, assim como os ativos tokenizados, possui uma importante característica de programabilidade, são os chamados smart contracts, os contratos inteligentes. Para dar um exemplo bem simples, uma família poderá “programar” o pagamento em DREX a um filho menor de idade para que os recursos sejam gastos apenas em atividades ligadas à educação, como a compra de livros. Contrariando um antigo ditado popular, o dinheiro poderá, sim, “ter cara”. As possibilidades são inúmeras, podendo ser estendidas, por exemplo, a contratos de compra e venda de imóveis ou veículos.
Um ponto importantíssimo que, felizmente, não vem sendo deixado de lado nesse processo diz respeito à regulamentação desse ecossistema. Nesse sentido, um outro passo da maior importância foi dado pelo governo brasileiro com a regulamentação da chamada “Lei das Cripto” (14.478/22), que “dispõe sobre diretrizes a serem observadas na prestação de serviços de ativos virtuais e na regulamentação das prestadoras de serviços de ativos virtuais” e que, na prática, coloca ele, o BC, como órgão responsável por regulamentar e supervisionar essa nova indústria, cabendo, adicionalmente, à Comissão de Valores Mobiliários (CVM) supervisionar os criptoativos enquadrados como valores mobiliários.
Regulações no segmento, vale lembrar, não são exatamente uma novidade. No exterior, órgãos como o NYDFS (New York Department of Financial Services – Departamento de Serviços Financeiros do Estado de Nova York) e a MAS Singapore (Autoridade Monetária de Singapura) já vêm tratando, em alguma medida, do tema. E é importante que qualquer empresa do setor que se pretenda posicionar de forma global observe as normas dessas entidades reguladoras.
Voltando ao Brasil e à recente regulamentação, para o mercado como um todo, embora haja alguns desafios do ponto de vista da inovação, a nova norma é muito bem-vinda e tende a trazer segurança, tanto do ponto de vista dos investidores/usuários quanto dos próprios players, que passam a trabalhar com maior previsibilidade do ponto de vista de limites e responsabilidades.
A tokenização da economia está apenas começando. E o horizonte revela um sem-fim de possibilidades. Sobretudo quando se consideram questões como desenvolvimento e modernização dos mercados, além da inclusão financeira.
Sobre a autora
Juliana Schlesinger Felippe é Enterprise Partneship Manager da Paxos no Brasil.
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