Maior exchange de criptomoedas dos Estados Unidos e uma das maiores do mundo, a Coinbase foi escolhida para ser a custodiante de 9 dos 11 ETFs de Bitcoin à vista aprovados no país, incluindo o maior deles, da BlackRock. Esse novo papel, que reforça a importância da empresa, também causou certo temor por alguns especialistas.
No centro do debate está a concentração de ativos, o que pode elevar o risco do mercado como um todo. A empresa por si só já se torna um grande alvo por concentrar os serviços de custódia desses ETFs.
Como destaca David Schwed, diretor de operações da Halborn, uma empresa de segurança de blockchain, em uma coluna no site CoinDesk, a preocupação não é a exchange, que nunca foi atingida por um hack. “No entanto, não existe um alvo inviolável – tudo e qualquer pessoa pode ser comprometida, desde que haja tempo e recursos suficientes, o que é uma lição que aprendi ao longo de uma carreira na intersecção entre segurança cibernética e gestão de ativos”, afirma ele.
“O que me preocupa é a extrema concentração de ativos num único custodiante. E dada a natureza semelhante ao dinheiro dos ativos cripto, isso torna a situação inerentemente preocupante”, destaca Schwed.
Basta uma falha
Diferente de ativos como ações ou títulos, que não tem como serem roubados por serem basicamente representações de acordos legais, o Bitcoin (BTC) se porta como dinheiro tradicional neste sentido. Basta uma falha ou um hack bem-sucedido para que a segurança dos ativos seja comprometida.
Neste cenário, Schwed diz que uma aprovação regulatória não garante que esses ativos estejam realmente protegidos e por isso defende que custodiantes de ativos digitais deveriam estar sujeitos a mais supervisão por parte de reguladores mais bem treinados, sob padrões estaduais e federais mais rigorosos, do que estão atualmente.
Hoje a Coinbase é a maior custodiante de criptomoedas do mundo, e apesar de toda a dificuldade que a Comissão de Valores Mobiliários dos EUA (SEC) colocou para aprovar os ETFs, ela não parece estar preocupada com essa concentração.
“Mesmo que isso não seja um problema para a SEC, para mim parece um risco desnecessário para os investidores e estou surpreso que uma configuração de custódia múltipla não seja exigida dos emissores, apenas para proteção contra problemas imprevistos”, disse Dave Abner, diretor da Dabner Capital Partners, uma consultoria de ETFs, para a Bloomberg.
Alesia Haas, diretora financeira da Coinbase, disse também à Bloomberg que a empresa trabalha “diligentemente para evitar conflitos de interesses” e que a estrutura do mercado de títulos tradicionais pode não ser adequada para criptomoedas.
O outro lado
Apesar de alguns especialistas destacarem os riscos, há quem defenda que tanto a SEC quanto as gestoras fizeram as devidas análises de proteção dos ativos. Alexandre Vasarhelyi, gestor e sócio da gestora BLP Crypto, afirma que é claro que quanto mais bitcoin uma instituição tiver, mais visada ela vai ficar para ataques. “Mas também é verdade que ao analisar a capacidade de gerenciar isso, ela têm se mostrado superior às outras opções”, explica.
A brasileira BLP foi a primeira a lançar um fundo de criptomoedas no país e utiliza tanto a Coinbase quanto a Fidelity para a custódia de seus ativos. “O que eu posso dizer é que quando fomos escolher os custodiantes, fizemos um trabalho bem intenso de due diligence e escolhemos esses dois”, diz o gestor.
Além dos nove ETFs que usam a Coinbase como custodiante, o fundo da Fidelity decidiu fazer a autocustódia de seus bitcoins, enquanto a Hashdex escolheu a BitGo.
Sobre o risco de concentração, Vasarhelyi questiona ainda o fato da maior parte do ouro do mundo estar guardada em Fort Knox, nos EUA: “Isso é seguro ou é inseguro? Eu acho que me parece que o governo americano acha isso [concentrar] mais seguro do que deixar espalhado”.
Localizada no estado do Kentucky, Fort Knox tem hoje cerca de 4.175 toneladas de ouro, o que equivale a mais de US$ 290 bilhões.
O gestor da BLP ainda lembra que usar o serviço de custódia é diferente de falar de uma exchange. Nesse caso, o processo de segurança é muito mais rigoroso do que o feito por uma corretora.
“Naturalmente, todo mundo tem medo das exchanges e é para ter mesmo. A gente também morre de medo das exchanges, por isso que a usamos a custódia. Eu acho que o medo, as dúvidas, elas são válidas e elas são necessárias quando se fala de cripto”, avalia.
Sobre a necessidade de regras e acompanhamento mais rigorosos para esses casos, Vasarhelyi acredita que a SEC e outros reguladores tiveram tempo para concluírem que era seguro o lançamento desses produtos. “Se a SEC levou 10 anos e meio para aprovar [um ETF de Bitcoin] e não fez um bom trabalho, não vai ser mais seis meses que vai fazer, não faltou tempo e esforço. Então não tem como dizer que eles não olharam isso profundamente”.
Coinbase vs. SEC
A Coinbase está envolvida em uma batalha jurídica com a SEC após ser acusada em junho passado de administrar uma bolsa, corretora e câmara de compensação não registradas para tokens que o regulador considera serem valores mobiliários.
A exchange contestou as acusações, alegando que a SEC está ultrapassando seus limites. E após uma primeira audiência na semana passada, especialistas já acreditam que a Coinbase vencerá o processo.
O analista sênior de litígios da Bloomberg, Elliot Z. Stein, tuitou que depois de ouvir os argumentos orais da Coinbase, ele dá à exchange de criptomoedas uma probabilidade de 70% de garantir a vitória em sua moção para rejeitar todas as reivindicações feitas contra ela pela SEC.
Para a Bloomberg, um porta-voz da empresa reforçou que o negócio de custódia da Coinbase “não está em questão no caso com a SEC”.
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