Como um grupo de brasileiros enviou Bitcoin à Lua via rádio amador e código morse

“Elon nós fizemos primeiro”, disse uma das mensagens enviadas
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Antena de rádio usada para enviar o bitcoin apontada para a Lua (Foto: Arquivo pessoal)

Na noite do dia 29 de abril, o desenvolvedor de blockchain Márcio Gandra estava na varanda da sua casa em Macacos, Minas Gerais, cercado de parafernálias de rádio, um grande antena e uma missão na cabeça: enviar bitcoin à Lua antes de Elon Musk.

No céu acontecia o fenômeno da Lua Rosa, um momento do ano em que o satélite natural está mais próximo da Terra, ideal para experimentos malucos como o que Gandra tentava performar com quatro amigos: Paulo Bezerra, Rafael Silveira, Narcélio Filho e André Alvarenga, entusiastas de criptomoedas e de rádio amador assim como ele.

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A ideia era que Narcélio recebesse R$ 50 em bitcoin do P2P André Alvarenga através de uma transação de multi-assinatura (multisig), que precisava ser validada por outros dois participantes que estavam a 800 km de distância um do outro. O detalhe é essa transação seria enviada entre esses signatários com a ajuda da Lua.

Rafael foi o primeiro signatário e estava com o Márcio no momento do experimento. Pelo modo convencional, o el recebeu e assinou a transação. Em seguida, ele deveria enviá-la a Paulo que estava em Marília, São Paulo, e seria o responsável pela segunda assinatura. É a partir daí que o experimento começa, já que essa transação iria refletir em solo lunar antes de ser recebida por Paulo.

Para levar o bitcoin à Lua, eles usaram uma técnica que surgiu com os militares ingleses na década de 40 conhecida como comunicação Terra-Lua-Terra (EME, na sigla em inglês), na qual um transmissor propagada ondas de rádio para a Lua que, em seguida, reflete o som de volta à Terra, podendo ser receptado por qualquer pessoa.

Márcio Gandra foi o idealizador do projeto (Foto: Arquivo pessoal)

Desse modo, foi preciso converter os dados da transação em código morse. Para isso, eles baixaram o arquivo da transação da carteira Electrum em formato PSBT — que significa transação de bitcoin parcialmente assinada — onde os dados criptografados estavam em hexadecimal (letras e números). Em seguida, esses dados foram convertidos para binário (0 e 1) e, por fim, em código morse.

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Naquela noite em Marília, Paulo também mirava sua antena para a Lua e ficava em constante contato com o Márcio pelo WhatsApp para combinar a frequência correta para receber o código morse. À medida que o código era transmitido, ele decodificava a mensagem de volta para hexadecimal com a ajuda de um aplicativo de celular.

Márcio contou ao Portal do Bitcoin que a transmissão foi complicada, porque a Lua estava em constante movimento no céu e todo o processo foi feito de forma analógica.

“A gente foi picando a transmissão em partes porque toda hora que conseguíamos um sinal, passava um tempo, a Lua se deslocava e a gente perdia outra vez. Aí começava tudo de novo. O importante é que o processo foi validado”, disse.

O processo durou cerca de 25 minutos. Quando Paulo estava finalmente com a mensagem completa em mãos, ele reconstruiu o arquivo PSBT da transação e subiu na sua carteira Electrum para fazer a segunda assinatura. 

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Essa transação, a que passou pela Lua, foi o primeiro contato que Paulo teve com o bitcoin. Em Marília ele trabalha no ramo de segurança eletrônica, mas é um entusiasta do radioamadorismo desde que tinha 16 anos de idade.

“Foi uma experiência super bacana e nova, tem uma galera que tenta e não consegue, mas o nosso deu certo. Antes disso eu nunca tinha lidado com bitcoin também, mas já queria entrar faz tempo, só que eu não sabia muito sobre o assunto”, explica.

Por fim, a transação foi validada na blockchain e em Belo Horizonte, Narcélio Filho recebeu os bitcoins na carteira. “Esse experimento reproduziu o que o Satoshi chamou de ‘propriedade especial, mágica, do bitcoin’, a de ser um dinheiro que pode ser transportado em qualquer canal de comunicação”, celebrou o mineiro.

Elon, we did it first

Para realizar esse experimento, o Márcio Gandra levou três meses para preparar os equipamentos e fazer testes que, muitas vezes, falharam até que tudo funcionasse. Para ele, todo o trabalho valeu a pena.

“Ter feito um bitcoin tocar em solo lunar é uma sensação de presença muito forte e significa muito. Você pode contar isso daqui a dez anos para os outros de forma ainda muito relevante para a liberdade”, disse.

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Em uma outra mensagem enviada naquele dia, eles transmitiram para o astro o seguinte recado em inglês: “Eu sou o primeiro bitcoin a chegar à lua. Nós fizemos isso primeiro Elon :)”. 

A ideia surgiu depois que o empresário bilionário disse que queria mandar a Dogecoin para o satélite. “Naquela hora o coração bateu mais forte, a adrenalina cresceu e isso virou uma obsessão pelos últimos 3 meses. Nós provamos que não precisa de nenhum foguete multi-bilionário para mandar criptomoeda pra lá”, brincou o brasileiro. 

Rádio do Satoshi

Ele também pensa que o rádio é um meio resistente à censura. Mesmo que a internet esteja bloqueada em uma região, ou censurada pelo governo, ainda seria possível se comunicar e até mesmo enviar bitcoin por rádio amador.

Com essa ideia em mente, Márcio criou o projeto sem fins lucrativos chamado Satoshi.Radio.Br, que pretende funcionar como uma rede interconectada de “listeners” e “broadcasters” de transações.

“Todo rádio amador, sintonizado em frequência específica, ficaria ali em modo listen. Ao detectar alguma transação chegando, ele poderia replicá-la na rede. Suponha que você esteja sem internet, mas com um rádio, você pode enviar a transação naquela frequência sabendo que terá alguém do outro lado para replicar o seu pedido na rede”. 

Para isso funcionar, seria necessário que toda cidade do Brasil tivesse pelo menos um rádio amador responsável por essa missão. “É desafiador e instigante, mas, principalmente, necessário”, concluiu.