O Canadá se tornou o primeiro país do G7 a recorrer à computação quântica para simular cenários em que criptomoedas e moedas fiat possam coexistir em grande escala dentro da economia.
Esta semana, a startup que lidera a pesquisa para o Banco do Canadá atingiu um marco: Seu modelo chegou a avaliar mais de um octilhão de possíveis cenários em apenas 30 minutos. Um octilhão é o número dez seguido por 30 zeros.
Isso significa que a companhia, chamada Multiverse Computing, finalizou sua prova de conceito, que combina dados blockchain da stablecoin tether (USDT), cujos tokens estão lastreados no dólar americano, e dados públicos de até dez grandes instituições financeiras.
Também se consultaram com especialistas de dois grandes bancos canadenses que apresentaram parâmetros realistas.
A Multiverse escolheu a tether para seu modelo porque a stablecoin, fundada em 2014, superou uma variedade de cenários de mercado em seus oito anos de dados registrados em blockchain.
Grande parte dos cenários no modelo mostraram que a adesão das criptomoedas por instituições não financeiras deve ser lenta, já que existem custos associados à conversão de moedas fiat para um ativo digital. Também foi possível simular como bancos podem reagir: reduzindo taxas em transferências eletrônicas para competir com os baixíssimos custos das transações cripto.
A própria pesquisa só chegou à etapa de prova de conceito, então ainda não existem consequências práticas do estudo sobre as regulamentações cripto canadenses.
No entanto, a capacidade de usar modelos de computação quântica para simular como moedas fiduciárias e digitais podem competir por uso e adesão é um grande passo à frente, afirma um funcionário do banco central canadense.
“Queríamos testar o poder da computação quântica em um caso de pesquisa que é difícil de solucionar usando técnicas da computação clássica”, afirmou Maryann Haghighi, diretora de ciência de dados do banco central.
“A colaboração nos ajudou a aprender mais sobre como a computação quântica pode fornecer novas percepções sobre problemas econômicos ao realizar simulações complexas em hardwares quânticos.”
Bola de cristal digital
Inicialmente, o Banco do Canadá havia recorrido à Multiverse Computing em 2019 por conta de seu trabalho na previsão de colapsos financeiros.
O kit de desenvolvimento de software (ou SDK) Singularity, o principal produto da startup, junta ferramentas quântico-financeiras, como a linguagem de programação Python ou o Microsoft Excel, com o poder da computação em nuvem em nível quântico.
De acordo com o doutor Sam Mugel, diretor de tecnologia da Multiverse, a decisão do banco central em fazer a equipe simular a adesão de criptomoedas foi uma espécie de flexibilidade macroeconômica.
“A economia canadense, ao seu ver — espero que seja verdade — é estável demais para que haja uma alta probabilidade de colapsos financeiros. Basicamente, disseram que qualquer colapso financeiro que nós prevíssemos estaria provavelmente errado”, disse o físico computacional em entrevista ao Decrypt.
“Disseram: ‘Vamos analisar algo mais volátil. Vamos analisar trades com criptomoedas e prever colapsos com cripto’.”
A partir de então, o foco da pesquisa evoluiu para analisar os efeitos de regulamentações para cripto.
Simulações prévias foram capazes de incluir apenas alguns grandes bancos, comparadas com o annealer dos Sistemas D-Wave da Multiverse — uma espécie de computador quântico — para possibilitar a inclusão de até dez bancos.
Computadores quânticos são poderosos a uma escala que é difícil de explicar se alguém só interagiu com PCs comuns. Talvez uma analogia ao Universo Cinematográfico da Marvel (ou MCU) possa ajudar.
Quando o Doutor Estranho, um herói com a capacidade de manipular o tempo e o espaço, analisa o futuro durante um momento crucial em “Vingadores: Guerra Infinita”, é capaz de considerar mais de 14 milhões de possíveis desfechos em poucos segundos e encontrar um contexto em que os heróis vencem.
Neste exemplo, o Doutor Estranho é como um computador quântico, pois ele pode processar, de forma simultânea, milhões de situações. Um não super-herói — neste caso, um computador — poderia tentar fazer isso, mas teria de considerar cada possibilidade, uma por vez. Poderia demorar décadas, em comparação a apenas 30 minutos.
Mugel afirma que os próximos passos incluem tornar o modelo ainda mais eficiente e capaz de simular mais variáveis em uma economia.
“Outro setor abordado em nosso estudo foi a análise de instituições financeiras que lidam com criptomoedas mas, se começássemos a acrescentar coisas, como câmaras de compensação para cripto…”, explicou ele.
“Talvez pudéssemos analisar um modelo trilateral de adesão cripto, a câmara de compensação e, em seguida, as pessoas que realmente estão aderindo a esses ativos.”
*Traduzido por Daniela Pereira do Nascimento com autorização do Decrypt.co.