O projeto da World conseguiu um feito quase impossível no Brasil: uniu esquerda e direita em um mesmo propósito. No caso, interromper os serviços da empresa no país.
Quase ao mesmo tempo, o deputado federal Guilherme Boulos (PSOL/SP) pediu que o Ministério Público Federal investigasse a operação, e a vereadora Janaína Paschoal (PRTB) fez um requerimento para uma CPI no município de São Paulo — o pedido de instalação da comissão já foi aprovado.
Em janeiro, a Agência Nacional de Proteção de Dados (ANPD) ouviu os protestos e determinou que a Tools for Humanity, empresa que desenvolve o protocolo da World, parasse de oferecer dinheiro em troca dos serviços que são definidos como “prova de humanidade”. Na prática, a empresa recompensava os usuários com o token WLD em troca do escaneamento da íris por meio da futurística orb.
Esse processo semelhante a uma cena de ficção científica ficou conhecido como “a compra da íris das pessoas por uma empresa”. E é contra essa retórica que a instituição agora tenta espalhar sua palavra, afirmando que as manchetes e palavras de ordem de autoridades estão equivocadas.
A missão está nas mãos de Astrid Vasconcellos, diretora de comunicação para a América Latina da Tools for Humanity, que, em entrevista ao Portal do Bitcoin, explicou como o projeto funciona e por que, na visão da empresa, o processo oferece mais privacidade — e não menos.
“Essa foto do rosto e da íris é processada, o que é diferente de ser capturada: o orb processa essa imagem e a transforma em um número binário. Uma vez que é feito esse processamento, a imagem é deletada da orb. Importante dizer que essa imagem nunca sai da orbe. A imagem é encriptada e enviada para o celular da pessoa e permanentemente deletada da orbe. Junto é enviado o código binário de uns e zeros”, afirma.
Segundo Vasconcellos, o projeto gera três códigos anonimizados derivados do número binário e os dados são divididos em três servidores: Universidade de Berkeley, Universidade de Zurique e Universidade de Erlangen-Nuremberg.
“É importante ressaltar para as pessoas que se eu tiver acesso e um código anonimizado, eu não terei acesso ao código binário. Eu preciso dos três códigos para chegar na chave privada da pessoa”, diz a executiva.

Vasconcellos afirma que esse processo de captura da imagem, geração do código binário e eliminação da imagem dentro da orbe já passou por auditoria de três empresas: Nevermind, List Authority e Trails of Bits.
Empresa aponta para outras coletas de dados normalizadas
A decisão da ANPD de proibir a concessão de dinheiro em troca do serviço tem como alegação principal que a população pobre pode ficar sem poder de escolha: diante das necessidades econômicas, têm seu poder de decisão sobre os dados enfraquecido quando há um valor considerável em vista. Os valores pagos para a “verificação de humanidade” chegaram a R$ 700, variando conforme a cotação do token WLD subia ou descia.
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Porém, Vasconcellos aponta que outros serviços dão incentivo financeiro em troca de acesso à dados e não sofreram a intervenção. “A gente respeitosamente discorda da decisão da ANPD, até porque hoje existem diversos outros serviços que oferecem um incentivo para que as pessoas façam a adesão. Por exemplo: se eu faço uma compra online e assino uma newsletter, ganho 10% de desconto. O que está acontecendo é que este pequeno comércio esta coletando os meus dados e me dando um incentivo para armazenar os meus dados”.
Segundo a diretora da Tools for Humanity, a empresa se diferencia por apenas “processar os dados e devolver para as pessoas”, e não armazená-los.
Ela não deu detalhes de como será a estratégia jurídica da empresa dentro da ANPD para reverter a situação, apenas informou que o time de advogados está estudando a melhor defesa. Sobre a CPI, disse que será uma oportunidade para explicar o que faz o projeto, já que existe “muito desconhecimento”.
Aplicação imediata e futura
A verificação de humanidade é um conceito já antigo na internet: os famosos mosaicos de fotos, chamados de CAPTCHA, são conhecidos de todos. Com o avanço da Inteligência Artificial, a Tools for Humanity vê um futuro de curto prazo no quais serão comuns falsos positivos nestes testes. Substituir esse sistema pela identidade gerada com orbe é o caso de uso mais premente visto pela empresa.
Outro objetivo já de curto prazo é utilizar a tecnologia para evitar automações como as de robôs comprando ingressos de shows para revenda mais cara para seres humanos.
Em uma visão de mais longo prazo, a Tools for Humanity defende que seu sistema gera mais privacidade do que menos:
“Como garantir segurança e confiança nas transações online de uma forma privada? De uma forma que a pessoa não tenha que revelar tanto dados seus. Hoje para provar que a transação é confiável, temos que dar mais dados nossos. E contraditório é que quanto mais dados eu dou, mais vulnerável eu fico para ser personificada ou ser fraudada. Porque meus dados ficam mais acessíveis em um vazamento de dados. E a World vem com uma solução para que as pessoas não tenham que dar os seus dados de uma forma tão livre para coisas que não são necessárias.”
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