O Brasil está em vias de aprovar um marco regulatório das criptomoedas. Resta saber qual texto final chegará na mesa do presidente Jair Bolsonaro. A corrida tem dois competidores: o PL 3.825/2019 de relatoria do senador Irajá (PSD-RJ) e o PL 2.303/2015 de autoria do deputado federal Áureo Ribeiro (Solidariedade-RJ).
Em dezembro do ano passado, a Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado previu que iria conseguir aprovar o projeto de forma terminativa naquele mês. Na prática, isso significaria que o texto poderia ir para a Câmara dos Deputados sem ter que passar pelo Plenário do Senado, em um ato chamado em Brasília de “economia processual”.
Mas a comissão não conseguiu votar naquele mês e a Câmara foi mais rápida, tendo aprovada no seu Plenário o PL de Áureo Ribeiro. O projeto de lei está agora na Mesa Diretora do Senado.
Na terça-feira (22), a CAE aprovou o projeto do senador Irajá. E um certo impasse se apresenta: o PL poderia ir para a Câmara direto, como era previsto; mas com o texto do deputado Áureo já aprovado, o Senado deve decidir se junta os dois (apensar, no jargão do Congresso), vota e envia para o presidente ou se manda a proposta para a Câmara.
A primeira opção seria a mais rápida, mas só funciona caso o senador Irajá aceite que as diferenças de seu texto sejam eliminadas e que prevaleça o texto integral do deputado Áureo. Se isso ocorrer, basta o Senado votar no Plenário o apensado (que seria na verdade o texto do deputado) e entregar para o Poder Executivo.
Mas, se o senador Irajá quiser que algum ponto diferente de seu texto permaneça, o apensado então será votado pelo Plenário do Senado e depois volta para a Câmara dos Deputados para ser avaliado pela totalidade dos 513 deputados federais.
A avaliação geral é de que o senador Irajá está bastante engajado com o tema e dificilmente aceitaria que nenhuma marca sua permanecesse no texto final.
“Os dois textos são muito parecidos, mas existem algumas inovações no texto do senador Irajá que eu acredito que ele vá fazer força para incluir nessa mescla. Isso obrigaria o retorno à Câmara”, afirma Julien Machado Dutra, chefe de relação governamentais do Grupo 2TM.
Mas independentemente de um possível impasse, Dutra acredita que “a tendência muito forte é de o projeto ser aprovado e sancionado nesse primeiro semestre”.
Rodrigo Monteiro, diretor executivo da ABCripto, fez uma análise do texto aprovado na CAE. “Ficamos felizes com o avanço no Senado (CAE) do processo de discussão e votação do Marco Regulatório da Criptoeconomia, que é tão importante para a higidez do mercado quanto para a proteção do cidadão e das instiuições”
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Presença de Bolsonaro
A presença e voto favorável do senador Flávio Bolsonaro na CAE é um indicativo muito forte que o presidente deve sancionar sem maiores questões.
Por isso há uma expectativa de que a votação ande e o projeto avance antes de uma possível mudança no Poder Executivo com as eleições de 2022.
As diferenças nos textos
Apesar de ser muito parecido em sua grande parte com o PL da Câmara, o texto do senador Irajá tem particularidades significativas:
- Torna um princípio a segregação patrimonial dos investidores (caso a empresa entre em falência ou recuperação judicial, o dinheiro dos clientes seria separado do da empresa e não seria usado para quitar dívidas fiscais, trabalhistas e com fornecedores).
- Promove a isenção de impostos para mineração de criptomoedas feita com energia limpa.
- Cria o cadastro de pessoas politicamente expostas.
BC como órgão regulador
Os PLs estabelecem que caberá ao Poder Executivo o órgão regulador do setor de criptomoedas. Todos dão como certo que o escolhido será o Banco Central, que já está muito ativo no tema.
Reportagem da Folha no domingo (20) afirmou que o Banco Central está considerando propor novas diretrizes para estabelecer uma fiscalização das transações com criptomoedas no Brasil, segundo conversa com banqueiros com o presidente da instituição Roberto Campos Neto.
De acordo com o jornal, o tema da conversa de Neto com presidentes de vários bancos importantes que atuam no país foi sobre conter a explosão de golpes e fraudes no Brasil envolvendo criptomoedas como o bitcoin. A ideia, relataram os banqueiros sob anonimato, é enquadrar os criptoativos como um veículo de investimento.
Monteiro, executivo da ABCripto, afirma que o ideal seria os projetos de lei já definirem o BC como responsável: “O texto aprovado excluiu algumas competências temáticas pré-estabelecidas – como a atuação da CVM –, mas não evoluiu para a definição de um agente regulador específico, deixando a decisão a critério do Poder Executivo. Preservando-se as competências específicas (CVM, Susep, ANPD, CADE, etc), entendemos que atribuição legislativa prévia, com a definição do Banco Central como regulador primaz, seria mais efetiva e adequada. Continuamos trabalhando por esse objetivo e imaginamos contemplá-lo no decorrer da tramitação”.