O Brasil tem emergido como um dos principais mercados de criptoativos no mundo, destacando-se tanto pela evolução regulatória quanto pelo crescente volume de negociações e número de usuários.
Essa tendência de crescimento é fortemente influenciada pela expansão da tokenização de ativos digitais e de ativos do mundo real, segmentos que oferecem grande potencial e enfrentam desafios significativos.
As políticas inovadoras e o ambiente exploratório promovidos pelas autoridades financeiras brasileiras não apenas permitem, mas também incentivam e regulam o avanço desse mercado em ascensão. Ao longo deste relatório, focaremos em três pilares da criptoeconomia destacando seus principais indicadores e números.
Neste primeiro artigo, será abordado o uso de criptoativos no Brasil. Atualmente, 24% da população possui criptoativos ou tokens digitais, crescimento de 46% em relação ao ano anterior (2023).
A maioria dos investidores é do sexo masculino e possui menos de 34 anos de idade. O País ocupa a décima posição em adoção de criptoativos frente a 151 países avaliados pelo Global Crypto Adoption Index. Os investimentos dos brasileiros em criptoativos ultrapassaram a marca de U$10 bilhões em 2024.
Estimativas do time de Research do MB (Mercado Bitcoin) indicam que até 2030, o número de usuários e investidores pode atingir até mesmo metade da população brasileira, que representaria quase 120 milhões de brasileiros, impulsionados principalmente pelo Drex.
A indústria cripto
A indústria de criptoativos, em sua curta história, tem demonstrado um notório processo de adoção por parte do público e expansão, além de viabilizar um ambiente propício para inovação. Para entender esse contexto, é importante estabelecer uma linha do tempo sobre o setor, que se inicia com o nascimento do Bitcoin, passa pela formulação dos contratos inteligentes em blockchain e chega no atual cenário de pluralidade das aplicações de finanças descentralizadas (DeFi).
No entanto, apesar das constantes inovações do setor, é preciso se atentar aos big numbers alcançados pela indústria como um todo, para não cair em um erro de avaliação da dimensão e da escala deste mercado.
Nesse sentido, é preciso destacar que o volume total histórico negociado em criptoativos já chega a US$ 350 trilhões. Além disso, o volume de negociações diárias globais de cripto já chegaram no patamar em que ocasionalmente superam o do próprio mercado acionário americano.
Outro fator relevante para entender o tamanho do mercado de criptoativos é a análise relativa da capitalização de mercado da maior criptomoeda (BTC) frente aos demais ativos disponíveis no mercado financeiro tradicional. Considerando os dados atuais, notamos que o BTC encontra-se na décima posição entre os ativos com maior capitalização de mercado, uma posição à frente da Berkshire Hathaway, e muito próximo de alcançar a empresa Meta.
Adoção dos criptoativos no Brasil e no mundo
Uma vez entendida a dimensão que cripto tem alcançado, podemos direcionar nosso foco para como o Brasil tem participado desse processo de crescimento.
Para fins de comparação, é interessante buscar o número de investidores de criptoativos no mundo, assim como o perfil deste público, para então analisar a fundo o contexto brasileiro.
Desse modo, as estatísticas mais recentes apontam para um número de 560 milhões de detentores de criptoativos no mundo, aproximadamente 6,8% da população global. Esse valor torna-se ainda mais expressivo se considerarmos os dados de 2023, cujo estimativas convergiram para um valor de 420 milhões de proprietários, algo próximo a 4,2% da população mundial no período.
Em relação ao perfil dos detentores, as informações disponíveis revelam um público majoritariamente jovem, dado que 72% dos investidores em 2023 possuía menos de 34 anos.
Além disso, é perceptível uma participação em grande parte masculina, representando 63% do todo nesse mesmo ano em questão.
Trazendo a análise para o Brasil, trata-se de um país com grande população, cujo número total, segundo o banco mundial, é de cerca de 215,3 milhões de pessoas. Dentro desse recorte, a pesquisa realizada pela empresa de relações públicas Sherlock Communications aponta que, em 2024, cerca de 24% dos brasileiros possuem alguma espécie de criptoativo. Em 2023, o valor chegou a 14%.
Baseado na curva crescente de usuários e no potencial de maior adoção devido ao desenvolvimento do DREX – que fará o onboarding de milhões de brasileiros no ecossistema de blockchains – a equipe de Research do MB estima que, em 2030, o número de usuários e investidores de cripto pode atingir a incrível marca de 50% da população brasileira que, pelas estimativas do IBGE, equivalerá a cerca de 120 milhões de brasileiros.
Em resumo, os dados apresentados tornam evidente o ritmo acelerado de adoção de criptoativos no Brasil se comparado ao agregado global, sendo essa análise válida tanto no curto, quanto no longo prazo.
Outro indicador que reforça o posicionamento brasileiro de adoção dos criptoativos é o Global Crypto Adoption Index, realizado pela Chainalysis. Esse índice é respeitado por avaliar diversas métricas em sua composição, atentando-se às diferentes realidades socioeconômicas dos países, permitindo a extração de um resultado mais proporcional aos dilemas particulares das nações avaliadas.
Nesse contexto, o Brasil atualmente se encontra na décima posição entre os 151 países avaliados, ocupando a liderança na região da América Latina.
Volumes de negociação
No ano de 2024, uma alteração de regras realizada pelo Banco Central do Brasil (BCB) mostrou o peso que os criptoativos já possuem no cenário macroeconômico brasileiro.
As novas regras alteraram o processo de contabilização das transações de criptoativos no balanço de pagamentos do país. A partir dessa mudança, o registro as transações de criptoativos passaram a ser registradas como “ativo financeiro não produzido”, assim como patentes, removendo as mesmas da balança comercial e as direcionando para conta capital.
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A contabilização das transações de criptoativos na balança comercial estava prejudicando cada vez mais o resultado final da balança, uma vez que os fluxos de importação seguiram em forte tendência de crescimento.
Essa relação se torna ainda mais nítida ao avaliarmos o nível histórico de importação de cripto no acumulado de 12 meses, demonstrando o peso que cripto adicionava negativamente no saldo final da balança comercial.
Essa interpretação é reforçada pelo caráter retroativo da medida tomada pelo BCB em junho de 2024, o que contribuiu para reduzir os déficits em transações correntes registrados pelo Brasil entre 2023 e 2024.
Dessa forma, é plausível concluir que o fator decisivo para essa decisão do BCB foi a compreensão do grande peso que cripto alcançou, assim como o entendimento que essa tendência de maior relevância no balanço iria se estender ainda mais significativamente no futuro.
Os próprios dados do banco central revelam que os investimentos dos brasileiros em criptoativos já ultrapassaram a marca de US$ 10 bilhões em 2024, resultando em um saldo líquido negativo de US$ 9,9 bilhões, no modelo anterior de contabilização. Isso ocorreu ao contabilizarmos apenas o período de janeiro a julho do corrente ano, com US$ 10,7 bilhões em compras e US$ 792 milhões em vendas.
Esses números representam um substancial acréscimo do valor das compras de criptoativos por brasileiros se comparado ao ano passado, cerca de 50%. Entre janeiro e julho de 2023 os investimentos totalizaram US$ 6,1 bilhões, contribuindo para um saldo líquido negativo de US$ 5,9 bilhões no período em questão.
Perspectivas futuras
Com todos os dados citados até aqui, é perceptível o crescimento do mercado de criptoativos no Brasil, seja pela ótica de adoção em termos de quantidade da população, seja pela perspectiva dos volumes de compras. Porém, mais importante do que identificar a tendência de alta é avaliar a saúde da mesma.
É importante incluir na análise os possíveis catalisadores para a grande aderência do público brasileiro aos criptoativos, para então projetar o comportamento desses drivers ao decorrer dos próximos anos, sendo assim possível estimar de maneira mais apropriada o potencial de adoção e fluxo do Brasil no setor.
Primeiramente é preciso retomar os dados que traçam o perfil majoritário dos detentores de criptoativos. Começando pela faixa etária, 48% dos proprietários são pessoas de até 34 anos de idade.
Ao analisarmos mais profundamente esse intervalo temporal é possível estabelecer um paralelo que certamente influi para o resultado dessa estatística.
O nascimento da World Wide Web em 1991 completa 33 anos de idade em 2024. Isso vai de perfeito encontro com a faixa etária mais propícia de se deter criptoativos. Dessa maneira, a explicação da interseção dessas duas variáveis é relativamente simples, afinal, a própria natureza digital dos criptoativos faz com que o público mais impactado pela era da digitalização se sinta mais propício a adquirir ativos com essas propriedades.
Nesse contexto, ao transferir essa lógica para a realidade brasileira, é possível entender a questão demográfica como um importante driver para a adoção dos criptoativos no país.
A pirâmide etária brasileira em 2022, segundo o IBGE, apresentou uma mediana de 35 anos de idade. Ou seja, metade da população brasileira possui 35 anos ou menos. Esse dado, combinado ao fato de que cerca de 27,8% da população brasileira possui menos de 20 anos, revela que existem cerca de 49 milhões de brasileiros entre 20 e 35 anos de idade, onde ocorre uma maior propensão a investir em criptoativos e, paralelamente, uma maior probabilidade de haver uma renda disponível para tal.
Essa conjuntura torna evidente o potencial de volume muito acima da média mundial desse mercado no Brasil, dada a escassez de outro pares com tamanha população jovem e com renda per capita anual acima dos US$ 10 mil.
Outro fator para o Brasil se situar na vanguarda da indústria como um todo é seu alto nível de digitalização. Dados de 2023 do IBGE apontam que 92,5% dos domicílios brasileiros tinham acesso à internet, acima da média de 90% da OCDE.
Para efeitos comparativos, o México, um país com larga população e também de renda média, apresentava apenas 70% das residências com acesso à internet, segundo a diretora geral do Ministério da Fazenda do México em 2022.
É importante ressaltar que esse grupo de 49 milhões se expanda ainda mais nos próximos anos, considerando que mais brasileiros pertencentes à era digital vão ter acesso a renda por conta das primeiras oportunidades de trabalho.
Outro ponto importante é a tendência dessa atual população jovem ir ganhando mais influência na decisão de alocação dos recursos familiares, potencialmente inserindo a renda de participantes não “naturais”, como de pais e avós, cujas idades são mais avançadas.
Portanto, o mercado atual de criptoativos no Brasil é, analogamente, uma espécie de retrato em meio a um filme que está apenas começando.
Em síntese, o processo de adoção por parte dos brasileiros possui drivers claros, com saúde para se expandir significativamente ao longo dos próximos anos. Dito isso, esse posicionamento privilegiado do país no setor certamente propiciará diversas oportunidades, sendo mais que razoável assumir um interesse institucional pelo segmento ainda maior no futuro próximo, tanto no quesito de alocações de recursos no mercado, quanto na própria incorporação da tecnologia para novas aplicações.
Esta é a primeira de três partes do estudo State of Digital Assets in Brazil, produzido pela equipe de Research do MB. Volte no próximo final de semana ao Portal do Bitcoin para ler o segundo capítulo, que trará um estudo atual do mercado de tokenização.
Sobre os autores
André Franco é Engenheiro Mecatrônico e Analista de criptoativos desde 2017. Com vasta experiência no mercado, André é atualmente o diretor de Research do MB.
Rony Szuster é Engenheiro Químico com pós-graduação em Engenharia de Software. Imerso no mercado cripto desde 2019, foi contribuidor do Messari Hub de 2021 a 2022. Atualmente integra a equipe de analistas de criptoativos do MB.
Pedro Fontes é graduando em economia na UFRJ e finalista do CFA Challenge Brasil. Começou sua jornada no mercado cripto em 2021, trabalhando na área de tokenização de carteiras de investimento. Atualmente integra a equipe de analistas de criptoativos do MB.