Logo da Binance
(Imagem: Shuttestock)

Os investidores brasileiros continuam podendo acessar a plataforma de derivativos da Binance, embora o serviço seja proibido no país. Recentemente, a corretora fez um acordo com a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) no qual pagou R$ 9,6 milhões para encerrar um processo administrativo por sua oferta irregular de derivativos.

Uma análise feita na sexta-feira (26) do livro de ordens da plataforma de Futuros mostra que a Binance fez aproximadamente R$ 198 milhões de receitas em 24 horas. Ou seja, na média um lucro de R$ 8,2 milhões por hora, o que faz com que a corretora arrecade em menos de duas horas o valor pago como multa para a CVM para supostamente resolver a questão da oferta irregular.

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O cálculo é baseado nos dados do CoinMarketCap: a receita da Binance é obtida somando as taxas maker e taker, multiplicadas pelo volume de trading em derivativos da corretora.

O acesso ao setor de derivativos para brasileiros segue exatamente igual. Ao ser questionada diretamente se exigiu alguma mudança na plataforma, a CVM disse que as informações estariam no Termo de Compromisso celebrado com a Binance.

Este documento não menciona em nenhum momento que a Binance deve implementar mudanças em sua plataforma para impedir que brasileiros, mesmo cientes de que se trata de uma oferta não permitida no país, acessem o serviço de derivativos.

As partes tratam apenas do pagamento de multa, que segundo a CVM seria suficiente para desestimular o descumprimento da lei brasileira: “A contrapartida em tela é adequada e suficiente para desestimular práticas semelhantes”, disse o Comitê de Termo de Compromisso.

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Esse cenário contrasta significativamente com o dos EUA, onde a oferta de derivativos também é proibida sem autorização. Lá, investidores sequer conseguem acessar a plataforma global da Binance para realizar negociações, o que levou a corretora a estabelecer uma operação separada no país, que não conta com as serviços de derivativos.

Acesso simples e fácil

Com o objetivo único de verificar se, após receber uma multa da CVM, a Binance dificultou o acesso ao serviço de derivativos para brasileiros, o Portal do Bitcoin criou uma conta na corretora utilizando a Carteira de Habilitação de um repórter. O sistema da empresa autorizou o cadastro, permitindo a criação de uma conta vinculada a um CPF e endereço brasileiros.

Por meio dessa conta, em minutos, foi feito o primeiro trade na plataforma Futuros da Binance, como é chamada a área de derivativos. A única ação necessária foi trocar o idioma da plataforma de “Português (Brasileiro)” para “Português”. 

Feito isso, a Binance apresenta uma mensagem ao cliente afirmando que, ao prosseguir com um idioma trocado, ele está afirmando ser residente de outro país ou estar ciente de que o produto que irá usar pode ser ilegal no Brasil. 

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“A Binance, em atendimento à Lei 6.385/1976 e aos entendimentos dos órgãos reguladores, informa que não pode e não oferece serviços de derivativos a residentes no Brasil. Ao prosseguir para uma das plataformas da Binance de outro país, você está declarando não ser residente no Brasil e/ou ter plena ciência de que os produtos de derivativos eventualmente ofertados em outros países podem não ser considerados legais em sua jurisdição”, afirma a mensagem.

Basta clicar em “Ciente. Permanecer”, que o cliente terá acesso aos produtos que são proibidos pela CVM de serem oferecidos aos clientes brasileiros. A negociação foi feita na segunda-feira (26).

Veja abaixo o registro da transação feita na plataforma de derivativos de um IP brasileiro e conta de cliente brasileiro.

Ao começar a negociar na plataforma de Futuros, a Binance usa um disclaimer em português para alertar os riscos da alta volatilidade deste mercado.

O próximo passo é transferir dinheiro da carteira spot (à vista) para o chamado Saldo de Margem.

Geralmente essas transações são feitas usando alguma stablecoin, como a USDT, como um dos lados do par que será negociado.

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Quando a transferência der certo, o Saldo de Margem já não irá mais aparecer zerado.

O próximo passo é acessar a plataforma de negociação, onde estão os livros de ordens sendo atualizados em tempo real. Nesse ponto, a Binance recomenda que o cliente atualize seus conhecimentos sobre Futuros, mas há a opção de ignorar essa orientação.

Abaixo, a posição executada.

A imagem abaixo mostra o histórico de ordens com a ordem executada. O Portal do Bitcoin perdeu US$ 0,01 na operação.

Conta bloqueada

Um fato chamou a atenção da reportagem: a conta de um dos repórteres do Portal do Bitcoin foi bloqueada da opção de usar a seção de Futuros. Trata-se da mesma conta que em reportagem passada descobriu que a página de derivativos da Binance continuava acessível para brasileiros e que recebeu orientação do próprio suporte da exchange para alterar o idioma a fim de acessá-la. Na ocasião, o caso fez a CVM reabrir o processo administrativo em 2022.

Ao tentar fazer a operação dessa vez, no entanto, foi encontrada a mensagem: “Suspendemos temporariamente as transações de Futuros. Por favor, tente novamente mais tarde”.

Mensagem que apareceu apenas pra a conta do repórter do Portal do Bitcoin

Bloqueios nos Estados Unidos

A brecha que a Binance deixa no Brasil de permitir ao cliente trocar o idioma da plataforma e dizer não ser residente do país para operar fora da regulamentação local, não se repete em outros lugares do mundo. Nos Estados Unidos, por exemplo, se um cliente tentar entrar na exchange global, não irá conseguir sequer logar na plataforma.

A Binance não tem autorização para operar nos Estados Unidos e, por isso, veta toda e qualquer operação que poderia ser feita a partir do país. Lá, os clientes devem usar a Binance U.S, uma empresa do grupo que foi feita especificamente para atender as regulamentações do mercado local e que não conta com serviços de derivativos.

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Este é um exemplo do rigor crescente que a Binance enfrenta no país. Em abril, o fundador da corretora, Changpeng “CZ” Zhao, foi condenado a quatro meses de prisão nos EUA após admitir ser culpado de não implementar medidas de prevenção à lavagem de dinheiro obrigatórias. 

Binance e CVM

Binance e a CVM firmaram um acordo no dia 14 de agosto para encerrar o processo administrativo aberto pela Comissão contra a empresa devido à oferta irregular de derivativos a clientes brasileiros. A corretora concordou em pagar R$ 9,6 milhões como parte de um Termo de Compromisso com a entidade reguladora.

Anteriormente, a Binance havia feito uma proposta de pagamento de R$ 2 milhões, mas a CVM recusou firmar o acordo nesses valores. Na época, ao recusar o acordo, a CVM disse que o caso deveria ser julgado para que fossem ouvidas defesa e acusação. 

 O Comitê de Termo de Compromisso recomendou ao Colegiado da CVM que aceitasse o acordo em R$ 9,6 milhões, afirmando que se trata de uma medida “adequada e suficiente para desestimular práticas semelhantes”.

Posicionamento da Binance

Por meio de nota, a Binance afirma que “não oferece derivativos no Brasil e desde a primeira comunicação do regulador, em 2020, a exchange tomou todas as medidas e ações necessárias para responder à autoridade e cumprir os requisitos locais”.

A empresa afirma que a decisão do conselho da CVM de aceitar o Termo de Compromisso proposto “reafirma que os ajustes, atualizações e restrições feitos pela Binance ao longo do tempo são suficientes”.

Além disso, a corretora diz que “apoia a regulação e, fruto desse compromisso, é a exchange de criptomoedas com o maior número de licenças e registros no mundo. A Binance já detém licenças e autorizações em 19 jurisdições, mais do que qualquer outra exchange, incluindo em países como Itália, França, Japão, Espanha, Emirados Árabes Unidos, Suécia e, mais recentemente, a Índia, alguns deles membros do G7”.

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