“Fui em uma conferência anticripto e ninguém tentou me vender nada” | Humor

Colunista do site Decrypt, Ben Munster conta de forma bem humorada como foi sua participação na conferência “Crypto Policy Symposium”, que ocorreu em Londres nesta semana
Homem com bigode falso fazendo joinha

Shutterstock

Nesta semana, Stephen Diehl estava fazendo um brinde efervescente na primeira conferência do mundo para céticos de criptomoedas coorganizada por ele. “Queremos agradecer aos patrocinadores e, claro, aos Illuminati”, disse ele, para uma histeria quase frenética na galeria. “Não poderíamos ter feito isso sem eles!” 

Era a última noite dos dois dias de conferência ‘Crypto Policy Symposium’ em Londres e um grupo de céticos em cripto se reuniu em um clube em Marylebone para beber Prosecco grátis e visivelmente não vender tokens uns aos outros.

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Eu* estava cercado por pessoas que eram exatamente o contrário daquelas que frequentam conferências do setor: eles usavam calças de veludo, trabalhavam em TI e se pareciam com seu pai. Todos eles se chamavam Martin e vinham armados com pesquisas baseadas em evidências, propostas políticas sóbrias e perspectivas empíricas e inteiramente incontroversas sobre a estrutura do mercado.

“Estamos ficando mais organizados e mais poderosos, e essa conferência é uma prova disso”, disse Diehl, um crítico ferrenho das criptomoedas e um dos principais organizadores da conferência. Coincidentemente, ele também estava distribuindo um livro gratuito de sua coautoria, “Popping the Crypto Bubble” (Estourando a Bolha Cripto).

Junto com seus colegas, Diehl respondeu animadamente a perguntas de todos os participantes, incluindo um pró-cripto, que queria saber a opinião dos painelistas sobre a blockchain baseada em Internet das Coisas (IoT) da Helium (Alerta de spoiler: eles acham que o projeto é uma mentira).

Os críticos foram ovacionados com suas provocações irônicas – “os criptomanos gostam de falar sobre código; os verdadeiros céticos hardcore podem realmente programar” – e suas visões cínicas de uma indústria que há muito tempo está em hype.

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Eles até toleraram uma pergunta de um ofegante enviado de uma ultrajada publicação cripto sobre o relacionamento dos céticos com os formuladores de políticas. “Da imprensa cripto!”, Diehl comentou com desdém, antes de me oferecer uma resposta brusca:

“Certamente os céticos de criptomoedas se envolveram mais em expressar seus sentimentos aos formuladores de políticas. Temos pessoas dos mais altos escalões do poder dizendo coisas que nosso povo tem dito”.

O Crypto Policy Symposium, que ocorreu em grande parte online mas incluiu uma noite de networking, foi a primeira conferência do mundo desse tipo e apresentou homens e mulheres em posições de considerável influência.

Especialistas céticos do Twitter deram as mãos aos formuladores de políticas. Programadores desiludidos misturaram-se a jornalistas do Financial Times. Havia ex-reguladores e até mesmo um congressista americano em exercício, o deputado Brad Sherman, o democrata anticripto do sul da Califórnia.

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A conferência foi a primeira de outras que os organizadores esperam fazer no longo prazo, além de uma nova organização, o Center For Emerging Tech (Centro de Tecnologia Emergente) — ou algo assim —, criada durante a iniciativa.

Os anticriptos existem há quase tanto tempo quanto as criptomoedas, mas a ascensão parabólica deste mercado no ano passado — e o subsequente crash deste ano – trouxe players mais determinados.

O cético não é mais um lobo solitário semi-trágico: os novos participantes do setor são extremamente influentes online, e muitos, como Molly White, se tornaram celebridades por seu próprio esforço — se já não fossem celebridades, como Ben McKenzie, o ator de “The OC” e futuro autor que se tornou um cético ferrenho das criptomoedas.

Até agora, o esforço do no-coiner tem sido um contrapeso bastante escasso contra os US$ 10 milhões em dinheiro de lobby lançados no congresso pelo mundo pró-cripto durante os últimos cinco anos. Por enquanto, pelo menos, o no-coiner não é uma grande ameaça.

O evento em si, por exemplo, foi um assunto espartano. O uso do ambiente privado do clube foi doado gratuitamente a um dos organizadores. O marketing era mínimo e a maioria dos painéis era virtual. 

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Os nomes dos participantes não foram amplamente divulgados, presumivelmente para impedir ataques terroristas de bitcoiners. Os painéis foram comedidos: “A Política do Bitcoin”; “Contágio Cripto”; “Reguladores e Regulamentos são adequados para atender ao desafio Cripto?”

“Geralmente os eventos de criptomoedas tentam vender alguma coisa”, disse o organizador Jan Akalin, um dos coautores de Diehl. “Queríamos que este evento fosse gratuito, em vez de subornar as pessoas para estar aqui.”

Alguns dos oradores foram impressionantes — e até mesmo um pouco dramáticos. 

Sherman, indiscutivelmente o principal anticripto do Congresso, falou grandiosamente sobre as ameaças representadas pelas criptomoedas à reputação americana. 

Ali estava um homem cuja energia irradiava autoridade imperial. Um estandarte estrelado estava pendurado atrás dele. Ele falou com aquela deliberação de estadista atemporal e ligeiramente inquietante à la George Bush. Cada pronunciamento dele fazia você se sentir como se estivesse prestes a ser atingido por um drone predador. Seus olhos brilharam enigmaticamente. 

Ele falou extensivamente sobre hamsters. “O bitcoin sempre valerá mais do que o hamstercoin?”, bravejou. “O peso uruguaio sempre terá algum valor porque sempre haverá um Uruguai. A hamstercoin sempre terá o mesmo valor? E a cobracoin? E embora um mangusto possa derrotar uma cobra ou um hamster, acredito que o mangustosecoin – uma moeda que foi criada como resultado de uma piada que contei em uma audiência – agora não tem valor!”

Alex Sobel, por outro lado, um amigável parlamentar trabalhista de Leeds North, irradiava não tanto autoridade imperial quanto a impressão de que acabara de sair de uma cama de solteiro compartilhada com um cachorro. Ele estava pendurado atrás do bar gratuito. Ex-engenheiro de software, ele parecia pronto para um bate-papo, então fui até ele, perguntando sobre as criptomoedas em Westminster. 

“Há uma consciência, no Parlamento, de que a criptomoeda é apoiada por nada”, disse-me. “O que não está acontecendo é que os parlamentares não estão dizendo ‘perdi todo o meu dinheiro’, então não está realmente permeando”.

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O que me despertou especialmente foi quando Sobel disse como adquiriu muito de sua perspectiva anticripto: um livro “excelente” chamado “Attack of the Fifty-Foot Blockchain”(em um trocadilho com o mitológico pé-grande), de David Gerard.

O David Gerard! Olhei em volta e, de fato, lá estava ele, aparecendo com dois metros de altura bem atrás de mim, minha única fonte criptocética dos bons e velhos tempos do Decrypt, o homem que eu chamaria para uma citação fácil sobre qualquer coisa blockchain, não mais sozinho, mas em seu elemento, cercado pela semente de seu trabalho mental, o fervilhante pater familias de uma vibrante dinastia imperial chinesa do século III, divertindo-se com a indústria de sua questão real. Eu nunca o tinha visto tão feliz. 

“Um cara só é um cara estranho”, ele estava dizendo a algum ouvinte extasiado. “Dois caras já é um movimento!”

Me aproximei e perguntei se ele estava, de fato, em seu elemento – se isso parecia um momento decisivo. “É legal”, disse Gerard timidamente. “Quero dizer, obviamente, vem acontecendo há anos, mas é bom estar perto de pessoas que pensam da mesma forma.”

Você não tem a sensação de que este é de repente um movimento muito sério? Eu perguntei.

“Quero dizer, existem 8 bilhões de anticriptos no mundo”, ele deu de ombros. Ele provavelmente quis dizer milhões, já que existem menos de 8 bilhões de pessoas no mundo. Mas quem era eu para corrigir o maestro?

Gerard opinou que o movimento criptocético estava começando a afetar corações e mentes. O raciocínio no discurso de Alex Sobel durante a conferência virtual (que Gerard disse com orgulho “foi basicamente metade da minha ideia”) foi “basicamente 2 + 2 = 4. O que é um fato.”

Já Wessel Pannebakker, que se identificou como “um estudante da Holanda que gosta muito de cripto e suas aplicações”, estava entre os poucos participantes pró-cripto. (Foi Pannebakker quem perguntou se os anfitriões achavam que a rede Helium era viável). Nós nos encontramos perto das amêndoas salgadas, que eu estava devorando, sozinho e desprezado.

Pannebakker estava perplexo com o que estava acontecendo. “É justo dizer que qualquer ‘simpósio’ deve ter os dois lados”, resmungou. “Não esperava que fosse encontrar apenas um lado! Embora existam muitos golpes e fraudes, é importante ter uma visão equilibrada de ambos os lados”.

Eu disse a ele que talvez seja razoável, frente a um cenário que envolve bilhões de dólares em conferências pró-cripto, criar uma pequena conferência anticripto. 

Ele hesitou, dizendo que os céticos deveriam pelo menos tentar interagir com, digamos, a rede Helium. “Não seria tão ruim para eles gastarem US$ 50 para interagir com aplicativos, para brincar”, afirmou. (Estranhamente, ele me disse que nunca tinha usado esses aplicativos também.)

Se “não critique algo antes de conhecer” é um substituto adequado para os métodos clássicos de busca empírica da verdade, é uma questão para os filósofos. Mesmo assim, apresentei-o a Martin Walker, um membro amável do Center for Evidence-Based Management , com quem esbarrei no final da noite. 

Com cabelos grisalhos e vestes de um entusiasta de trens, Walker foi um dos organizadores do evento. Perguntei se uma visão cética e racional era sempre adequada: se um pouco de fé cega e crédula poderia ser um trunfo. “Fez já fez muita gente burra enriquecer”, arrisquei. 

Walker parecia estar hesitando. “Se não tivéssemos uma maneira de ver o mundo baseada em fatos”, disse, “ainda estaríamos vivendo em cavernas”. 

Infelizmente, essa era a escassez imaginativa em exibição nesta conferência. Se fosse um evento pró-criptomoedas, empreendedores febris certamente estariam falando sobre cavernas como a nova reserva de valor e tentando me vender algum produto derivativo de um NFT atrelado à quantidade de ignorância dos homens das cavernas, colaterizado por representações neolíticas de antílopes.

Mas eu não estava tentando vender nada a Walker, nem ele a mim. Então, ao invés disso, concordamos de nos separarmos amigavelmente. E eu fiquei um pouco atrás, para acabar com o que restava das amêndoas grátis.

*Coluna de humor escrita pelo correspondente Ben Munster. Traduzida por Wagner Riggs com autorização do Decrypt.co.

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