O argumento de que o bitcoin (BTC) não tem valor porque não é lastreado em nada físico continua sendo um dos maiores equívocos.
É uma opinião perpetuada por nomes como o magnata bilionário Warren Buffet e o ex-presidente americano Donald Trump — ambos que já foram citados afirmando que o bitcoin não possui valor.
Mas agora que o bitcoin está junto das maiores moedas mundiais em termos de capitalização de mercado, fica a pergunta: Qual é o lastro do bitcoin?
Qual é a diferença entre o bitcoin e moedas nacionais?
Até bem recentemente (no último século), grande parte dos papéis-moedas e cunhagem podiam ser diretamente trocados por ouro. Isso porque muitos dos países mais ricos seguiam o padrão-ouro, um sistema monetário em que governos ligavam uma taxa fixa de câmbio para moedas nacionais ao ouro.
Como parte desse sistema, países mantinham reservas suficientes de dinheiro em seus cofres para lastrear 100% seu fornecimento em circulação, garantindo que câmbios entre moedas por ouro sempre fossem possíveis.
Porém, isso também limitou a economia em meio à Grande Depressão, pois governos não foram capazes de simplesmente fornecer mais ouro para expandir seu fornecimento e estimular gastos.
O sistema foi abandonado pela Austrália e Nova Zelândia entre os anos de 1929 e 1930; por Canadá, Alemanha e Reino Unido em 1931; e os Estados Unidos parcialmente se livraram do padrão em 1933.
Porém, foi apenas em 1971 que os Estados Unidos realmente se livraram do padrão-ouro após o presidente Richard Nixon finalizar a interconversibilidade do dólar americano em ouro, anulando, assim, o sistema Bretton Woods e encerrando a era do padrão-ouro.
Em vez disso, países migraram para um modelo fiduciário, em que uma moeda nacional não seria lastreada em uma commodity, como o ouro, permitindo que bancos centrais imprimissem mais dinheiro quando fosse necessário. Apesar de não ter valor intrínseco, o valor do dinheiro fiduciário é definido por mudanças na oferta e demanda, bem como pela força do governo responsável por ele.
Já que governos só aceitam pagamento de taxas em moedas fiduciárias e a evasão fiscal é ilegal, seu valor também é parcialmente mantido por conta da exigência do pagamento de taxas.
Embora moedas fiduciárias não sejam formalmente lastreadas em nada, tendemos a comprar nossas moedas fiduciárias com a confiança de que serão aceitas em outro lugar em troca de bens e serviços. Basicamente, nossa confiança em moedas fiduciárias gera poder de compra — e, dessa forma, valor — para moedas fiduciárias.
Mas nossa confiança em moedas fiduciárias sofre um problema de indução. Em outras palavras, pressupomos que uma sequência de acontecimentos irá ocorrer, como sempre ocorreu, com base em nossa experiência prévia.
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Não podemos dizer, com certeza, o que virá a seguir para o valor de nossas moedas fiduciárias. Sem que uma moeda esteja formalmente ligada a uma commodity, como o ouro, o valor se torna uma incerteza em vez de uma garantia.
O bitcoin é lastreado pela matemática?
Assim como o dólar americano, o bitcoin não é lastreado por uma commodity física, mas deriva seu valor de outras formas.
Já que o bitcoin não possui uma entidade centralizada que impõe seu valor e não é lastreada por uma commodity, muitas pessoas erroneamente acreditam que o bitcoin não tem valor algum.
Porém, atualmente, o bitcoin possui uma unidade de valor individual de cerca de US$ 21 mil e uma capitalização total de mercado — definida como a unidade de valor multiplicada pelo número de moedas em circulação — de US$ 400 bilhões, claramente demonstrando que é considerado como valioso por um número enorme de pessoas.
Mas o bitcoin não é lastreado em nada físico — apenas por complicadas equações matemáticas que servem de base para sua tecnologia blockchain e sua oferta controlada. Garantem que o fornecimento do bitcoin continue limitado e seja resistente à censura — que permeia parte de seu valor.
Conforme explicado por Anthony Pompliano, um grande defensor do bitcoin: “Se você não acredita no bitcoin, você está basicamente dizendo que não acredita em criptografia”. Para Pompliano, a tecnologia blockchain proporciona um valor inerente ao bitcoin, quase como um padrão-ouro para cripto.
O restante do valor do bitcoin pode ser atribuído ao fato de que foi o primeiro sistema monetário a ser operado com êxito sem a necessidade de uma entidade centralizada, ou seja, seu fornecimento não pode ser inflacionado à força, confiscado facilmente (como o ouro foi na década de 1930) e oferece um nível de liberdade financeira que poucas moedas nacionais (se houver alguma) podem oferecer.
O bitcoin sempre demonstrou ter valor de utilidade; milhares de comerciantes o aceitam como pagamento para bens e serviços. Em dois países — El Salvador e República Centro-Africana —, o bitcoin foi adotado como moeda corrente, ou seja, comerciantes têm de aceitá-lo (apesar de, em El Salvador, a adesão ter sido desigual).
O nível de confiança existente em uma moeda pode ser indicado ou preservado por seu nível de utilização ao redor do mundo. Se estiver tendo um bom desempenho em relação a outras moedas fiduciárias, o dólar americano é — e será, no futuro próximo — uma moeda que poderá ser gasta em quase todos os lugares. Como consequência, pessoas têm confiança no dólar.
O poder de compra e a praticidade são commodities valiosas.
Por outro lado, o bitcoin ainda está, de certa forma, longe da ampla adesão. A comunidade cripto evoluiu bastante desde que a primeira transação com bitcoin foi gasta para comprar uma pizza, mas até que a adesão em massa aconteça, a confiança no bitcoin não será tão grande ou ampla quanto a confiança em moedas nacionais.
Apesar das diferenças óbvias, o bitcoin acaba sendo similar a uma moeda fiduciária por conta da ampla confiança de quem a utiliza. À medida que a confiança no setor cripto aumenta, a confiança no bitcoin também irá aumentar.
*Traduzido por Daniela Pereira do Nascimento com autorização do Decrypt.co.